Publicado originalmente em Coletivo Bereia por Marcos André Lessa e Ana Paula Vitória. Para acessar, clique aqui.
Nas últimas semanas vem repercutindo nas mídias digitais, sobretudo evangélicas, sobre a campanha do presidente da República Jair Messias Bolsonaro (sem partido) pela realização das eleições de 2022 com voto impresso. Diversos pastores e líderes religiosos se pronunciaram acerca do assunto em seus perfis e canais ou em entrevistas.
Bolsonaro se pronunciou contra a urna eletrônica outras vezes e disse que as eleições na qual saiu vencedor, em 2018, foram fraudadas sem nunca apresentar provas.
Apesar de colocar em dúvida o processo eleitoral via urna eletrônica, Bolsonaro foi eleito nesse sistema para o cargo de presidente em 2018 e para deputado federal em cinco mandatos, de 1998 a 2018. E também seus filhos: Flávio Bolsonaro (Patriotas-RJ) venceu duas eleições para deputado estadual e uma para senador; Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) também venceu duas eleições, sendo o deputado federal mais votado da história do país; e Carlos Bolsonaro (PSC-RJ) conquistou seis mandatos como vereador no Rio de Janeiro – todos via urna eletrônica. Na última eleição com voto exclusivamente impresso, em 1994, Jair Bolsonaro foi um dos candidatos beneficiados por cédulas fraudadas.
Ministros do governo com identidade religiosa evangélica, como Fabio Faria, das Comunicações; e Onyx Lorenzoni, da Casa Civil, também já haviam se manifestado em ocasiões anteriores a favor do voto impresso ou repercutido as falas do presidente.
Diferentemente do que pensa hoje, em 1993 Jair Bolsonaro afirmou, no Clube Militar do Rio de Janeiro que, se as eleições não fossem informatizadas, haveria fraude.
Junto do questionamento da credibilidade da urna eletrônica e o pedido por voto impresso, as declarações do presidente procuram questionar a autoridade do Supremo Tribunal Federal (STF) na regulação sobre o tema.
O alinhamento religioso
Diversos sites e líderes religiosos mostraram alinhamento com o presidente sobre o tema do voto impresso. O site Pleno News publicou matéria sobre o número de dislikes de um vídeo promocional do STF sobre as urnas eletrônicas. O site Gospel Mais publicou reportagem sobre uma suposta articulação de ministros da corte contra o “voto auditável”.
O pastor da Assembleia de Deus Vitória em Cristo Silas Malafaia manifestou apoio ao voto impresso. Em vídeo publicado recentemente, Malafaia questiona se o Brasil tem mais tecnologia que países como Alemanha, Japão e Estados Unidos que utilizam o voto impresso. Nas últimas eleições presidenciais, em 2018, Malafaia mostrou ser eleitor declarado do atual presidente Bolsonaro, eleito com mais de 55% dos votos por urnas eletrônicas. O líder da Assembleia de Deus comemorou, nas eleições de 2014, quando seis dos oito deputados indicados por ele foram eleitos.
Em artigo, o deputado federal e pastor Marco Feliciano (Pode-MG) também se manifestou a favor da PEC do voto impresso em artigo. Feliciano está no seu terceiro mandato na Câmara, todos em eleições com urna eletrônica. No texto, Feliciano incorre em desinformação: diz que o modelo atual configura-se “sem a mínima condição de ser auditado” .
As urnas eletrônicas já são auditáveis
O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) conduz, a cada eleição, uma série de fases para a auditoria das urnas. Segundo o site do TSE, as fases são conforme segue:
– Um mês antes do pleito, os Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) nomeiam em sessão pública uma Comissão de Auditoria de Funcionamento das Urnas Eletrônicas, composta por: um juiz de direito, que será o presidente; e, no mínimo, seis servidores da Justiça Eleitoral, sendo pelo menos um da Corregedoria Regional Eleitoral, um da Secretaria Judiciária e um da Secretaria de Tecnologia da Informação.
O procurador regional eleitoral deve indicar, então, um representante do Ministério Público para acompanhar os trabalhos da comissão. Os partidos políticos e coligações também podem indicar representantes para acompanhar os trabalhos do grupo, dentre outros setores da sociedade. O TSE detalha as fases seguintes:
– Vinte dias antes os TREs devem informar, em edital e com divulgação nos respectivos sites, o local onde será realizada a auditoria. Na véspera das eleições, a Justiça Eleitoral deve sortear, em cerimônia pública, algumas seções eleitorais de todo o país. O número de urnas a ser auditado varia de três a cinco, dependendo do número de seções eleitorais que a unidade da federação (UF) possuir. As urnas eletrônicas escolhidas devem ser retiradas das seções de origem e instaladas imediatamente nos TREs, em salas com câmeras de filmagem. As urnas retiradas das seções são, então, substituídas por novos equipamentos.
– A comissão deve providenciar o número de cédulas de votação, por seção eleitoral sorteada, que corresponda a, aleatoriamente, entre 75% e 82% do número de eleitores registrados na respectiva seção eleitoral. As cédulas deverão ser preenchidas por representantes dos partidos políticos e das coligações e guardadas em urnas de lona lacradas.
– Na ausência dos representantes dos partidos políticos e das coligações, a comissão providencia o preenchimento das cédulas por terceiros, excluídos os servidores da Justiça Eleitoral. As cédulas deverão ser preenchidas com os números correspondentes a candidatos registrados no pleito, a votos nulos, a votos de legenda, e deverão existir cédulas com votos em branco.
– No dia da eleição, a “votação paralela” começa no mesmo horário da votação oficial, às 8h. Este ano, em razão da pandemia de Covid-19, o horário foi antecipado para as 7h.
– A partir da impressão da zerésima pela urna (prova de que não há nenhum voto dentro do equipamento), todos os votos das cédulas preenchidas no dia anterior são digitados, um por um, na urna eletrônica e também num sistema paralelo, em um computador. As câmeras filmam os números digitados no teclado da urna.
– Ao final da votação, a urna imprime um Boletim de Urna (BU), e o sistema auxiliar também emite um boletim. Os dados dos dois são comparados pela comissão de auditoria, e é verificado se a urna funcionou normalmente, bem como se foram registrados exatamente os votos das cédulas digitados na urna.
A auditoria pode ser acompanhada por qualquer interessado, e alguns TREs transmitem todo o processo via YouTube.
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Bereia conclui que a abordagem do presidente e de seus apoiadores a respeito do tema do voto impresso é enganosa. Apesar de colocarem em dúvida a lisura do sistema eleitoral, todos foram eleitos ou apoiaram candidatos eleitos pelas urnas eletrônicas, sem terem questionado anteriormente a confiabilidade do processo e sem apresentarem provas de supostas fraudes. Além disso, ignoram as possibilidades atuais de auditoria das urnas, inclusive com possibilidade de acompanhamento dos próprios partidos. O alinhamento no discurso sugere que o levantamento do tema pode ser uma estratégia para aglutinar a base de apoio em um momento de queda de popularidade e baixa de intenções de voto do presidente Jair Bolsonaro nas eleições de 2022.
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Referências de checagem:
Youtube, https://www.youtube.com/watch?v=hcAM52T4pio Acesso em: 22 jul 2021.
Youtube, https://www.youtube.com/watch?v=DR1xuWf_S_A Acesso em: 22 jul 2021
Youtube, https://www.youtube.com/watch?v=CegH2eUPC5M Acesso em: 12 jul 2021
Youtube, https://www.youtube.com/watch?v=mlScDBd9fx0 Acesso em: 22 jul 2021
Folha de S.Paulo, https://www1.folha.uol.com.br/poder/2021/01/veja-o-que-bolsonaro-ja-disse-sobre-urnas-eletronicas-e-fraude-em-eleicao-sem-apresentar-provas.shtml Acesso em: 22 jul 2021
Câmara dos Deputados, https://www.camara.leg.br/deputados/74847/biografia Acesso em: 19 jul 2021
Câmara dos Deputados, https://www.camara.leg.br/deputados/92346 Acesso em: 20 jul 2021
Câmara dos Deputados, https://www.camara.leg.br/noticias/545848-eduardo-bolsonaro-e-o-deputado-federal-mais-votado-do-brasil-com-184-milhao-de-votos/ Acesso em: 20 jul 2021
Câmara dos Deputados, https://www.camara.leg.br/deputados/160601/biografia Acesso em: 21 jul 2021
Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, http://www.alerj.rj.gov.br/Deputados/PerfilDeputado/275?AspxAutoDetectCookieSupport=1 Acesso em: 20 jul 2021
Senado Federal, https://www25.senado.leg.br/web/senadores/senador/-/perfil/5894 Acesso em: 22 jul 2021
Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro, http://www.camara.rio/vereadores/carlos-bolsonaro Acesso em: 20 jul 2021
Tribunal Superior Eleitoral, https://www.tse.jus.br/imprensa/noticias-tse/2014/Junho/conheca-a-historia-da-urna-eletronica-brasileira-que-completa-18-anos Acesso em: 20 jul 2021
Tribunal Superior Eleitoral, https://www.tse.jus.br/imprensa/noticias-tse/2018/Outubro/eleicoes-2018-justica-eleitoral-conclui-totalizacao-dos-votos-do-segundo-turno Acesso em: 22 jul 2021
Tribunal Superior Eleitoral, https://www.tse.jus.br/imprensa/noticias-tse/2020/Dezembro/veja-como-funciona-a-auditoria-de-funcionamento-das-urnas-eletronicas Acesso em: 22 jul 2021
Bereia, https://coletivobereia.com.br/nota-de-jornal-sobre-votos-de-cedulas-falsas-beneficiando-bolsonaro-em-1994-e-verdadeira/ Acesso em: 19 jul 2021
Twitter Fabio Faria, https://twitter.com/fabiofaria/status/1334949290146488320 Acesso em: 19 jul 2021
Facebook Jovem Pan, https://www.facebook.com/watch/?v=2514119785561080 Acesso em: 19 jul 2021
Biblioteca Nacional, http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=030015_11&Pesq=bolsonaro&pagfis=96402 Acesso em: 23 jul 2021
Pleno News, https://pleno.news/brasil/politica-nacional/video-sobre-urna-eletronica-tem-mais-de-100-mil-dislikes.html Acesso em: 22 jul 2021
Pleno News, https://pleno.news/opiniao/marco-feliciano/a-importancia-da-pec-do-voto-impresso-auditavel.html Acesso em: 21 jul 2021
Gospel Mais, https://www.gospelprime.com.br/ministros-do-stf-dividem-tarefas-em-articulacao-contra-o-voto-auditavel/ Acesso em: 22 jul 2021
Gospel Mais, https://noticias.gospelmais.com.br/candidatos-apoiados-malafaia-valdemiro-eleitos-71717.html Acesso em: 22 jul 2021
Instagram Silas Malafaia, https://www.instagram.com/tv/CQ_acF2tJ4y/ Acesso em: 22 jul 2021