Pós-eleições: ataques contra jornalistas no Nordeste aumentaram nos últimos meses

Publicado originalmente em Coar Notícias. Para acessar, clique aqui.

Por Pedro Mateus Ferreira, Millena Brito e Marta Alencar

Empurrões, xingamentos e ameaças. Nos últimos meses, jornalistas nordestinos vêm sofrendo atos de violência ao exercerem seu trabalho: de cobrir fatos, narrar histórias e apurar informações. Manifestantes da extrema-direita, revoltados com os resultados das urnas que deram vitória ao candidato petista Luiz Inácio Lula da Silva (PT), perseguem, criticam e humilham repórteres, quando cobrem suas manifestações. A situação é séria. Tais ataques são constantes, simbólicos e direcionados a jornalistas, antes mesmo de Jair Bolsonaro ser eleito em 2018. Os apoiadores do presidente atual defendem que estão praticando atos a favor da democracia, enquanto jornalistas nordestinos lutam para levar a notícia para quem quer que seja, não importando se é de direita, esquerda ou centro.

Na eleição mais recente ao cargo de presidente da República, Lula derrotou Jair Bolsonaro (PL), candidato à reeleição. Lula obteve 50,20% dos votos válidos, contra 49,10% do candidato à reeleição. Tradicional reduto petista, o Nordeste foi decisivo para a vitória de Lula. Ele recebeu 69,34% dos votos válidos da região – única em que ele superou Bolsonaro. A  larga vantagem de petista na região foi capaz de conduzi-lo à Presidência, ainda que atual presidente tenha sido mais votado em outras localidades. Com essa vantagem dada a Lula na região, os ataques xenofóbicos aumentaram não só contra jornalistas, mas contra toda a população nordestina.

Vítimas de ataques antidemocráticos

Repórter do O Pedreirense, Joaquim Cantanhêde, informa que a equipe do veículo maranhense, é alvo constante de ataques de manifestantes extremistas desde às eleições de 2022. Embora em anos anteriores, já sofreram diversos ataques. “O jornalismo acaba canalizando essa ofensiva. Nessa cobertura da eleição, ouvimos violência verbal, como comentários na página do O Pedreirense, como insinuações que o veículo era vendido, principalmente quando publicavámos pesquisas de intenções de votos. Quando exibíamos pesquisas, que mostravam Jair Bolsonaro desfavorável, essas manifestações e ofensas se tornavam recorrentes. Mas no segundo turno se intensificaram. Chegaram a ir ao meu perfil pessoal, onde me manifesto politicamente, para me monitorarem e depois me acusarem de algo em  comentários na própria página do veículo, como se eu fosse o dono do O Pedreirense. O Pedreirense não tem dono. Mas até hoje, infelizmente, esses ataques são nítidos”.

Humilhada. É esse o sentimento de Mikaela Ramos, jornalista do portal GP1, que foi vítima de ataques, enquanto exercia a sua profissão na cobertura dos atos antidemocráticos de apoiadores de Bolsonaro  na capital piauiense, no dia 3 de novembro. A jornalista relatou a COAR, que foi chamada hostilizada e xingada de “vagabunda” por alguns manifestantes.

“Quando fui parar para assimilar o que tinha acontecido ficou muito claro que não foi só eu que sofri essa tentativa de intimidação. Ocorreu com outros, jornalistas que foram cobrir esse ato antidemocrático. Então, a gente percebe que não foi um ataque somente a um jornalista ou a uma empresa de comunicação foi um ataque sistemático à imprensa como um todo”, relata.

Assim como Mikaela, Ilanna Serena, repórter do G1 Piauí,  narra que foi impedida de realizar a cobertura no dia, pois um manifestante tomou seu celular. “Quando chegamos, os manifestantes já ficaram atentos, alguns se aproximaram questionando qual o veículo de comunicação. Não respondemos, então aderiram a um tom mais agressivo, mais intimidador. Nesse momento, uma moça rapidamente tomou o celular que estava na minha mão, na tentativa de me impedir de filmar. Só tive a reação de tomar de volta, e seguir com as gravações”.

Apesar do medo, a repórter do G1 conta que prosseguiu fazendo o seu trabalho, mesmo com todas as agressões físicas e verbais sofridas.“Os manifestantes estavam sempre tentando cobrir as câmeras, com bandeiras do Brasil, para impedir as filmagens. A mesma moça que tomou o meu celular chegou a arrancar a máscara que eu estava usando no rosto e jogá-la no chão. Quebrou, inclusive. Não sei se foi uma tentativa de ver meu rosto ou de me agredir. Minha única reação foi dizer que eu continuaria filmando a situação, principalmente se ela não parasse de atrapalhar meu trabalho”.

Agressões no Nordeste

Entre os dias 30 outubro e 14 de novembro, a Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ) registrou 55 episódios de violência contra jornalistas no país, envolvendo a cobertura de atos antidemocráticos realizados pelos  apoiadores do candidato derrotado, Jair Bolsonaro. Deste total, sete episódios aconteceram no Nordeste, nos estados de Pernambuco, Piauí e Paraíba. O número pode ser maior de casos, no entanto existem muitos jornalistas com medo de represálias, e que por isso não denunciam. Para a presidente da FENAJ, há subnotificação de casos, por isso, realmente o número pode ser maior.

Samira Castro, presidente da FENAJ, desabafa com preocupação a escala de agressões contra jornalistas, sobretudo no contexto da cobertura de manifestações sabidamente antidemocráticas. “É preciso que a sociedade compreenda que a tentativa de cerceamento ao livre exercício profissional da imprensa atenta contra o próprio direito da população de ser informada”, destaca Samira.

Além disso, a FENAJ, por meio dos 31 Sindicatos de Jornalistas filiados, cobra das empresas que garantam condições seguras de trabalho para os jornalistas, a fim de mitigar os riscos das pautas que envolvem esse tipo de manifestação de desapreço à democracia.

“Ao mesmo tempo em que orientamos os jornalistas a denunciarem a violência sofrida, a FENAJ cobra das forças policiais e dos poderes constituídos do Estado brasileiro, como Ministério Público, Defensoria Pública, governos municipais, estaduais e federal, a rigorosa apuração das agressões a jornalistas, com a devida punição dos responsáveis na forma da lei”, acrescenta a presidente.

A FENAJ registrou ao menos 41 episódios de violência contra a categoria na cobertura de atos antidemocráticos. As agressões envolveram 44 equipes e 70 trabalhadores da mídia (entre repórteres, repórteres fotográficos, repórteres cinematográficos, operadores de áudio e motoristas). 

Convém acrescentar que a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e outras organizações que atuam na defesa das liberdades de imprensa e de expressão também registraram 37 ataques à imprensa após o segundo turno.

Constantes ataques 

A Abraji identificou, ao longo de 2022, 487 episódios de violência contra jornalistas; 28% são casos de ameaças, intimidações, agressões físicas e/ou destruição de equipamentos. O número representa um aumento de 7,5% em relação a todo o ano passado, quando foram registrados 453 ataques. Os dados mostram que a violência contra profissionais da imprensa não só ficou mais frequente, como se tornou mais grave, já que os casos de ameaças e agressões físicas cresceram 73,4% entre 1º.jan.2022 e 4.nov.2022, em comparação com o mesmo período de 2021.

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