Influenciadores precisam ser transparentes sobre suas fontes

Publicado originalmente em Instituto Palavra Aberta por Mariana Mandelli. Para acessar, clique aqui.

Dois influenciadores digitais, em suas respectivas áreas de atuação, têm sido alvo de críticas nas redes sociais por motivos parecidos: a falta de clareza sobre as fontes das informações que disseminam. O youtuber Felipe Castanhari foi questionado pela fragilidade das referências bibliográficas de seu novo documentário, que trata da guerra na Ucrânia, mais especificamente no trecho sobre Holodomor, a crise de fome que matou milhões de pessoas naquele país durante o regime soviético. Não é a primeira vez que o apresentador é questionado sobre seu conteúdo.

Já João Marques, estudante de Psicologia que fala sobre masculinidades para mais de 200 mil seguidores no Instagram, foi acusado por Valeska Zanello, pesquisadora da área de Saúde Mental e Gênero e professora da Universidade de Brasília (UnB), de copiar trechos de seus estudos e, com isso, projetar-se como especialista no tema, ganhando bastante visibilidade. Segundo a nota da docente, publicada em sua página na mesma rede social, João vinha bloqueando as pessoas que apontavam o plágio.

Como o próprio nome diz, influenciadores digitais pautam comportamentos, decisões, opiniões e gostos. Portanto, são peças fundamentais no ecossistema digital para vender ideias, discursos e, claro, produtos para milhões de pessoas. No cenário veloz de excesso de informações do qual fazemos parte, é fácil sermos seduzidos pelo carisma e eloquência deles, ainda mais quando tratam de temas complexos e indigestos.

Mas é preciso chamar atenção para um ponto essencial: poucas vezes nos perguntamos quem são esses influenciadores, e isso vai muito além de conhecer nome, idade e supostos detalhes pessoais compartilhados em seus canais. O que eu realmente sei sobre aquela pessoa que está me explicando um conflito geopolítico num vídeo de cinco minutos? O que ela estudou, no que é formada? Tem autoridade para discorrer sobre o tema? Quem ela ouviu, que livros leu para estar falando aquilo? Essas referências estão claras nas imagens ou nos créditos? Se sim, quem são esses autores e autoras? Se não há referências, por que o influenciador não as citou?

É claro que um vídeo não é uma tese de doutorado e uma página no Instagram também não resume anos de pesquisa em um determinado tema. Mas então apenas historiadores deveriam falar sobre História? Sabemos que não é assim. Vivemos num país onde a liberdade de expressão é uma garantia constitucional. Além disso, o próprio jornalismo é uma profissão que refuta essa ideia: setoristas de economia não são, necessariamente, economistas, por exemplo. No entanto, apuram informações e entrevistam especialistas com frequência. Ou seja, buscam fontes qualificadas.

É necessário também ressaltar que cobrar fontes é muito diferente de atacar, agredir ou ofender, como infelizmente acontece. Em alguns casos, o “cancelamento” acaba provocando discursos de ódio, o que em hipótese alguma pode ser aceitável. Criticar e “cancelar” não são sinônimos. 

Sendo assim, é preciso transparência e responsabilidade por parte dos criadores de conteúdos. Mas também é indispensável que as audiências sejam mais críticas e aprendam a consumir essas mensagens de forma menos passiva. Nunca a leitura crítica foi um exercício tão necessário como nos tempos atuais: é uma questão de educação midiática.

As mídias sociais podem (e devem) ser usadas a favor dos saberes e das ciências, mas sempre referenciando as fontes e as bases desse conhecimento. Deve-se questionar sempre o que está sendo dito, como está sendo dito e por quem, prestando atenção no propósito, execução, formato, linguagem e estilo das mensagens. Essas são indagações que deveríamos manter sempre em mente pois valem para todo tipo de informação que chega até nós, produzidas por influenciadores ou não. 

¹Artigo originalmente publicado no jornal Folha de S. Paulo.

*Mariana Mandelli é coordenadora de comunicação do Instituto Palavra Aberta

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