Publicado originalmente em Nujoc Checagem por Márcio Granez. Para acessar, clique aqui.
Canal do Youtube propaga teorias conspiratórias contra a vacina sem qualquer base nos fatos
Izah B. Pavão começa sua mensagem afirmando que o propósito da “picada de escorpião” – como ele chama a vacina contra a Covid-19 –, faz parte de um plano para transformar a raça humana em zumbis. A mensagem chegou ao NUJOC Checagem por meio do aplicativo Eu Fiscalizo, da Fundação Oswaldo Cruz.
Trata-se de uma sequência de falas sem qualquer comprovação científica, que beiram o ridículo e o delírio, mas que até o dia 9 de janeiro já haviam sido visualizadas por cerca de 1,5 mil internautas. Confira o vídeo na íntegra neste link.
Izah Pavão chama a vacina de “picada de escorpião” e diz que ela vai transformar as pessoas em zumbis. Ela faz referência e imita o andar dos zumbis da série Walking Dead, para enfatizar o estado em que as pessoas vão ficar se tomarem o imunizante. A vacina alteraria o DNA e faria a pessoa perder o brilho no olhar, virando um zumbi.
As vacinas contra a Covid-19 não vão transformar as pessoas em zumbis: elas vão prevenir as pessoas contra a infecção do novo coronavírus. Zumbis não existem na realidade, apenas na ficção. As vacinas são seguras e eficazes, conforme atestou a Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa, na análise que aprovou o uso emergencial das vacinas no Brasil, no último domingo, 17.
“Governo oculto” – A narradora também afirma que o “governo oculto”, que estaria por trás da campanha de imunização, quer reduzir e controlar a raça humana, reduzindo-a em 70%. Para quê? Para que outras civilizações possam utilizar os recursos do planeta Terra. Para o também chamado “governo do caos”, nós seríamos meros “ratos de laboratório”, e estaríamos numa guerra “entre dimensões” cujo objetivo é “acabar com a raça adâmica”.
Segundo o conhecimento acumulado pela ciência, não há governo oculto nem outras civilizações interessadas no nosso planeta. A ciência não conseguiu provar até hoje a existência de outras formas de vida semelhantes à nossa fora do planeta Terra. Por mais que atice a imaginação das pessoas, a ideia de um governo oculto é outra ficção sem fundamento, constantemente desmentida pelos fatos institucionalizados e pela marcha da História – eleições, desastres naturais, reviravoltas históricas envolvendo grupos no poder etc. Não, há, portanto, qualquer lógica na afirmação da narradora, a não ser talvez a lógica da ficção científica.
Ficção científica e teorias da conspiração – O vídeo de Izah Pavão é mais um exemplo de mensagem que vem sendo disseminada desde o início da pandemia do novo coronavírus: mistura de teorias da conspiração com ficção científica e discurso religioso de caráter apocalíptico. A explicação da narradora remete quase que de forma imediata ao universo de filmes hollywoodianos de entretenimento como o sucesso Homens de Preto (Berry Sonnenfeld, 1997), série de filmes estrelada por Will Smith em que a terra é um mero joguete entre outras civilizações.
Os estudiosos afirmam que se trata de um sintoma dos tempos: a ansiedade em relação às mudanças sociais, o medo da tragédia ecológica, a perda das referências tradicionais, como família e comunidade, contribuem para a proliferação de teorias estapafúrdias. Elas seriam uma narrativa que nasce da necessidade de dar sentido à vida, tomando emprestado um pouco da linguagem científica, da ficção e da religião.
Consequências trágicas – Tais teorias conspiratórias sempre existiram, mas com a internet e as redes sociais encontraram um meio ágil de propagação, que embaralha a distinção entre o que é real e o que é ficção, podendo ter consequências deletérias e trágicas. A crença injustificada no efeito de medicamentos contra o novo coronavírus foi um desses episódios: negada pela Anvisa também no domingo, 17, a efetividade do tratamento precoce à base de hidroxicloroquina pode ter sido a responsável pela morte de milhares de brasileiros que acreditaram na cura fácil. O NUJUOC fez várias checagens sobre o assunto, como você pode conferir aqui.
A chegada com atraso da vacina no país tem sido celebrada como uma lufada de racionalidade em meio aos desatinos e negacionismos de toda ordem. A insistência do governo no tratamento precoce sem comprovação de eficácia e as desconfianças que o presidente Jair Bolsonaro segue lançando sobre a Coronavac mostram, contudo, a força do negacionismo e do pensamento anticientífico no Brasil.