Publicado originalmente em Instituto Palavra Aberta por Daniela Machado. Para acessar, clique aqui.
Imagem: Mckaela Taylor | Unsplash
Pelo menos duas iniciativas prometem colocar os holofotes sobre o tema da educação digital no Brasil, fazendo com que este seja um excelente momento para discutir quais habilidades, afinal, queremos que crianças e jovens desenvolvam neste mundo cada vez mais conectado.
Parece não haver dúvidas de que os estudantes devem ter a possibilidade de usar ferramentas e dispositivos digitais, aprender noções de programação e robótica e desbravar a internet — não apenas como preparação para o mercado de trabalho mas também para que possam usufruir, agora, de todos os caminhos abertos pela tecnologia.
Perderemos o bonde da história se não for incluída nesta conversa a urgência de promover habilidades para fazer uso realmente qualificado e crítico de tais instrumentos. Ou seja, além da parte ferramental, precisamos que todos desenvolvam uma série de competências sem as quais é impossível tirar o melhor proveito do que a tecnologia tem a oferecer.
Assim, por exemplo, deve estar no radar da educação digital o uso de mecanismos de busca na internet (como escolher palavras-chave, fazer pesquisa por imagem etc.) e, ao mesmo tempo, reflexões sobre os links encontrados, a influência dos algoritmos e de nosso histórico online, instruções de como ‘ler’ as páginas de resultados e estratégias para avaliar a confiabilidade das informações e filtrá-las.
A computação e o uso das tecnologias não devem ser um fim em si, mas o meio pelo qual é possível compreender e melhorar o mundo, participando de forma reflexiva dos ambientes digitais.
A hora é agora. No Congresso Nacional, um projeto de lei de autoria da deputada federal Angela Amin (PP-SC) propõe a criação de uma Política Nacional de Educação Digital, ao mesmo tempo em que o Conselho Nacional de Educação (CNE) ouve e organiza propostas da sociedade civil para complementar a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) com normas de Computação na Educação Básica.
Nos dois casos, há um amplo esforço para que se olhe além do domínio da lógica, da ciência de dados, da programação e da robótica, entendendo a Computação como um conceito guarda-chuva que também prepara os estudantes para uma relação ética, responsável e fortalecedora com as tecnologias digitais.
No caso do projeto de lei (número 4.513/20), a Câmara dos Deputados já aprovou o regime de urgência para que o tema seja votado o quanto antes em plenário. A Política Nacional de Educação Digital, de acordo com a proposta, está estruturada em cinco grandes eixos, incluindo o desenvolvimento de competências e habilidades ligadas ao uso das tecnologias no ambiente escolar, formação de professores, capacitação da população adulta de olho no mercado de trabalho e apoio à pesquisa. A educação como um todo tem muito a ganhar se o escopo do projeto original for ampliado, incluindo elementos de educação midiática.
Enquanto isso, diversos atores da sociedade civil trabalham para propor ao CNE um conjunto de normas que complementam a BNCC com uma visão abrangente da Computação, em sintonia com a necessidade de preparar os estudantes para consumir e produzir informações e dados com responsabilidade.
Além de garantir o acesso de crianças e jovens à internet e suas linguagens, é urgente garantir também uma educação que os capacite para entender como as novas tecnologias vêm alterando a forma como nos comunicamos, interpretamos o mundo e dele participamos.
Sem isso, corremos o risco de criar uma nova leva de excluídos digitais que, mesmo com dispositivos ou internet disponíveis, serão incapazes de transformar informação em conhecimento, presença em fluência digital ou uso passivo das tecnologias em possibilidade real de exercício da cidadania.
*Daniela Machado é coordenadora do EducaMídia, programa de educação midiática do Instituto Palavra Aberta