Big tech investem pouco em políticas eleitorais para o Sul Global 

Publicado originalmente em *Desinformante por Liz Nóbrega. Para acessar, clique aqui.

As plataformas não dedicam os mesmos esforços na produção de políticas eleitorais em todos os países. Esse é um dos achados do estudo Platforms, Promises and Politics produzido pelo pesquisador Odanga Madung com apoio da Mozilla Foundation. A pesquisa revelou que o foco das plataformas é o norte global, ou seja, Estados Unidos e Europa. A conclusão se deu a partir da análise dos anúncios de políticas eleitorais das plataformas Meta, Google, Twitter e TikTok em 27 países de 2016 a 2023.

Dos 200 anúncios de políticas eleitorais analisados, apenas 37,6%, 74 deles, se referiam a outros países que não os da União Europeia e os EUA. Desses, 12 anúncios eram direcionados para o Brasil especificamente. “A nossa análise sugere que as empresas tecnológicas não consideraram adequadamente a singularidade dos ecossistemas de informação nos países de Maioria Global e os seus riscos”, declara o estudo.

O termo ‘Maioria Global’ ou Sul Global  se refere ao grupo de pessoas no mundo que não se consideram ou não são consideradas brancas, ou seja, negros, indígenas, asiáticos que, são muitas vezes consideradas “minorias étnicas”, mas que representam mais de 80% da população mundial. 

“Estes anúncios revelam-nos onde é provável que as empresas tecnológicas prestem atenção e dediquem recursos durante a época eleitoral, traçando um quadro nítido de como as plataformas dão prioridade às eleições”, destaca o relatório. 

Dentro da pesquisa, identificou-se que as plataformas dedicaram menos atenção aos países africanos, que tiveram o menor número de anúncios de intervenção (a base de dados pode ser vista aqui). No total, foram 12 anúncios feitos para países do continente aficano, o mesmo número de anúncios só para o Brasil, enquanto mais de 130 foram feitos apenas para os Estados Unidos.

Outro ponto revelador é que esses anúncios feitos para os países africanos não foram pensados para a realidade deles. Isso porque, identificou o estudo, eles foram copiados e colados, no caso da Meta, em uma abordagem para a governança da plataforma que o pesquisador chamou de “controle remoto”.

O relatório destaca que não é a primeira vez que se descobre uma técnica Ctrl C + Ctrl V para as políticas eleitorais. Pesquisadores brasileiros descobriram em 2023 que o TikTok havia apenas traduzido partes de sua política de integridade eleitoral nos EUA do inglês para o português, que mencionava, por exemplo, votação por correspondência, algo que não existe no Brasil. 

As particularidades regionais também são desconsideradas de outras formas, pontua o relatório. O estudo revela que a Meta não atualizou as políticas eleitorais do WhatsApp para que ela refletisse a realidade da evolução do aplicativo para uma espécie de rede social pública com recursos de transmissão, com os canais, em vez de apenas uma plataforma de mensagens privadas. Isso, de acordo com a análise, pode deixar vulneráveis países em que seu uso é mais intenso, como Brasil, Nigéria e Índia.

“A democracia em muitos países não é preto e branco e não funciona dentro das definições claras das potências neocoloniais”, coloca o relatório ao criticar a falta de adaptação das regras.

Os investimentos também são questionados na pesquisa. As plataformas frequentemente publicam anúncios que investem milhões de dólares em moderação de conteúdo e segurança, mas não há transparência sobre o destino desses recursos, ou seja, não se sabe quantos por cento estão indo para países da maioria global. 

Todo esse contexto, pontua o relatório, faz com que os críticos avaliem estes anúncios eleitorais “como esforços de relações públicas para evitar regulamentações mais rigorosas, na sua tentativa de continuar o ambiente auto-regulador de que desfrutam em muitos países fora da América do Norte e da UE”.

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