Você sabe a diferença entre desinformação, informação errada e discurso de ódio?

Publicado originalmente em *Desinformante por Liz Nóbrega. Para acessar, clique aqui.

A Organização das Nações Unidas lançou um relatório destacando as diferenças entre desinformação (disinformation), informação errada (misinformation) e discurso de ódio (hate speech). O material foi produzido pela pesquisadora Claire Wardle, especialista no tema, que já havia se debruçado em uma conceituação sobre o ecossistema da desinformação e suas diferentes nuances.

O trabalho tem o propósito de identificar as sobreposições dos termos e suas diferenças, considerando de forma especial as áreas caracterizadas como de alto risco e afetadas por conflitos. De um modo geral, a autora propõe a definição dos termos da seguinte forma:

  • Discurso de ódio – qualquer tipo de comunicação em fala, escrita ou comportamento, que ataca ou utiliza linguagem pejorativa ou discriminatória em referência a uma pessoa ou a um grupo com base em quem eles são, ou seja, com base em sua religião, etnia, nacionalidade, raça, cor, ascendência, gênero ou outro fator de identidade;
  • A informação errada – disseminação não intencional de informações imprecisas compartilhadas de boa fé por aqueles que não sabem que estão repassando falsidades.
  • A desinformação – disseminação intencional de informações imprecisas, destinadas a enganar e compartilhadas com o intuito de causar sérios danos.

“O discurso de ódio, a desinformação e a informação errada representam categorias distintas de discurso prejudicial, mas não existem definições universalmente aceitas para esses termos. Identificar a ‘intenção’ do orador ou criador, um elemento-chave na distinção dessas formas, adiciona complexidade à sua operacionalização e resposta”, ressalva o relatório. 

“Além disso, a interseção do discurso de ódio, desinformação e informação errada pode amplificar seus impactos negativos tanto em ambientes online quanto offline. Isso complica ainda mais os esforços para operacionalizar respostas, conduzir pesquisas e fazer comparações significativas entre diferentes contextos”, complementa o texto.

A autora afirmou que uma das semelhanças entre três conceitos é a dificuldade em identificá-los. “Enquanto as definições usadas pela ONU proporcionam clareza conceitual e são críticas para o desenho de respostas adequadas baseadas em direitos humanos, na prática, distinguir entre discurso de ódio e informação errada e desinformação pode, em alguns contextos, ser desafiador”, coloca.

Outras semelhanças abordam a possibilidade de esses discursos gerarem impactos cumulativos e o fato de que eles compartilham algumas táticas de criação, disseminação e amplificação na internet. Por outro lado, as três categorias apresentam diferenças, como o fato de o direito internacional tratar de alguns tipos de discurso de ódio, o uso de características de identidade para a prática do discurso odioso, os danos envolvidos em determinados discursos e as diferentes respostas para eles.

Políticas das plataformas para tratar esses problemas são recentes

Uma outra diferença apontada por Wardle é em relação à política das plataformas, que se diferenciam para as três categorias. “As políticas das plataformas sobre discurso de ódio surgiram nos últimos 15 anos, com a ajuda de especialistas em direitos humanos e acadêmicos, bem como aprendizados a partir de erros graves e equívocos em torno de certos eventos (Mianmar, em particular). As políticas relacionadas à informação errada e desinformação foram implementadas desde 2016, inicialmente em relação à desinformação baseada em eleições, e mais recentemente relacionadas à saúde durante a pandemia de Covid-19”, sintetiza.

Por concentrar os esforços de conceituação especialmente para locais e contextos de alto risco ou em conflito armado, a autora entrevistou 15 especialistas que atuam na ONU ou em organizações humanitárias. Com isso, identificou duas tensões sobre a temática, a primeira delas relacionada à liberdade de expressão. O estudo pontua que as respostas dadas a esses discursos devem ser “cuidadosamente elaboradas” para evitar consequências indesejadas, como a censura, mas coloca também que não se pode ignorar os danos desse discurso.

Outra tensão revelada é sobre a própria necessidade ou não dessa diferença conceitual. “Alguns entrevistados defenderam um termo abrangente para englobar todos os tipos de discurso potencialmente prejudicial”, coloca Wardle. Esse grupo argumenta que a diferenciação leva a esforços isolados e impede o reconhecimento do dano geral que essas formas de discurso causam nas comunidades. 

Já outros atores envolvidos acreditam e reforçam a necessidade de se criar definições precisas para abordar de forma adequada e eficaz cada tipo de discurso, dado seus contextos históricos e legais distintos. “Eles expressaram preocupação de que a fusão dessas definições em um único termo abrangente poderia simplificar excessivamente e abordar inadequadamente os danos específicos associados a cada tipo de discurso”, revela o relatório.

“O desafio para os profissionais que trabalham em áreas afetadas é desenvolver respostas operacionais que aproveitem a expertise de especialistas em cada área. Eles devem criar fluxos de trabalho e processos que reconheçam as distinções, incluindo os quadros específicos de políticas e de direitos humanos, enquanto também reconhecem que o discurso prejudicial é frequentemente projetado para escapar de limites de definição claros”, conclui o estudo.

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