Violência e Abusos de poder nunca mais! A resistência religiosa nos 60 anos do golpe militar no Brasil

Publicado originalmente em Coletivo Memória & Utopia. Para acessar, clique aqui.

O golpe que implementou a ditadura militar em 1964 completou 60 anos em 1º de Abril de 2024! Precisamos manter viva esta memória!

O Brasil viveu 21 anos sob Estado de exceção a partir de 1964: autoritarismo, abuso de poder, violência contra críticos e opositores — prisões arbitrárias, sequestro, tortura, desaparecimentos, execuções, censura, entre outras violações. Uma memória que não pode ser apagada para que não se esqueça, para que não mais aconteça!

Afinal, a ditadura acabou mas, no processo de reconstrução da democracia, o país ainda enfrenta entulhos não removidos daqueles anos de chumbo. Eles estão presentes nos ataques frequentes à democracia, aos direitos fundamentais, nas práticas de intolerância, na violência comumente imposta por agentes do Estado, em especial nas periferias do país.

Tanto no passado como no presente, é preciso ressaltar o lugar das religiões e das pessoas de fé na resistência à violência e aos abusos de poder. Precisamos lembrar daqueles e daquelas que, em nome de sua fé, deram suas vidas contra a ditadura militar e inspiram quem, hoje, segue firme na defesa da democracia nos espaços religiosos e na sociedade.

Somos onze organizações na promoção destas ações de memória da resistência religiosa. Com esta ação, buscamos lembrar o passado, inspirar o presente e projetar um futuro democrático transformado, com paz e justiça, reafirmando sempre: violência e abusos do poder, nunca mais! Veja o que foi realizado, com materiais disponíveis para acesso.

  • Casa Galileia
  • Coletivo Esperançar
  • Coletivo Memória e Utopia
  • Coletivo Sementes da Democracia
  • Frente de Evangélicos pela Estado de Direito
  • Instituto de Estudos da Religião – ISER
  • Iser Assessoria
  • Koinonia – Presença Ecumênica e Serviço
  • Movimento Juventudes e Espiritualidades Libertadoras
  • Movimento Negro Evangélico
  • Novas Narrativas Evangélicas

Aconteceu: Ato Público “A Resistência Religiosa nos 60 anos do Golpe Militar no Brasil”

O evento aconteceu na sexta-feira, 5 de abril de 2024, e teve dois momentos: a concentração, com expressão simbólica, nas escadarias da Câmara de Vereadores, seguida do ato público na Sala de Sessões do Centro Cultural da Justiça Federal (CCJF, antigo Supremo Tribunal Federal, quando o Rio de Janeiro era a capital da República).


Nas escadarias da Câmara, enquanto eram reproduzidas canções que lembravam os efeitos da repressão da ditadura militar na vida das pessoas, como Cálice (de Chico Buarque e Gilberto Gil), Roda Viva (Chico Buarque), participantes empunhavam cartazes com os retratos e nomes de 12 mortos e desaparecidos do regime militar, vinculados às igrejas Católica e evangélicas, citados no Relatório Final da Comissão Nacional da Verdade (2014). Velas foram acesas para recordar a presença e a inspiração do testemunho destas cristãs e cristãos que pagaram com a vida o seu compromisso de fé com a Justiça e o Direito. Foram realizados momentos de silêncio para recordar essas pessoas bem como as centenas de católicos e evangélicos que foram presos, torturados e exilados no perído de exceção imposto pelo governo militar.

Na Sala de Sessões do CCJF, 110 participantes vivenciaram momentos intensos de reflexão entremeados por manifestações de arte – música, com o Súbito Samba e poesia, com Chal Enigma e Neek, do Slam Rio de Janeiro.

Magali Cunha

A moderadora do ato Magali Cunha conduziu a noite com reflexões em torno da resistência religiosa de católicos e evangélicos, conforme o relatório da CNV, e indicou que, apesar de não haver dados oficiais sobre a perseguição a pessoas de outros grupos religiosos, elas seriam lembradas.

Além destas reflexões, os participantes ouviram o prof. Ivo Lesbaupin, com uma didática apresentação sobre a posição da Igreja Católica frente ao golpe militar e à ditadura. Ivo foi um dos sete freis dominicanos presos, em 1969, pelo torturador Sérgio Paranhos Fleury, delegado do Departamento de Ordem Política e Social (o DOPS). Houve oportunidade de se assistir a um trecho de depoimento do ex-preso metodista Anivaldo Padilha, que, em breve será parte de conjunto de entrevistas que será lançado em uma parceria entre o Instituto de Estudos de Religião (ISER) e a Universidade Brunel (Londres), sob a organização de Marcus Vinícius Mattos.

Ivo Lesbaupin

Ao final, foram pronunciadas três palavras de mulheres, representando a causa indígena, a professora Marize Vieira de Oliveira-Pará Rete, presidente da Associação indígena Aldeia Maracana; a causa negra, a professora Rakell Matoso, liderança do Movimento Negro Evangélico; e causa das religiões da matriz africana, a diretora executiva de KOINONIA Ana Gualberto Egbom de Oxum, do Ilê Axé Ofá Omi Layo. Elas desafiaram quem estava presente a pensar como as práticas de autoritarismo e de violência impostas pela ditadura permanecem vivas. A memória para compreensão dos reflexos do passado no presente e para orientação do futuro foi bastante demarcada. Os participantes receberam saudações dos líderes cristãos presentes, na pessoa do bispo anglicano Eduardo Grillo, e da deputada federal Benedita da Silva (PT), representada pela pastora Mônica Francisco.

Marize Vieira de Oliveira-Pará Rete
Bispo Eduardo Grillo

Acesse a seguir o roteiro completo

Roteiro-Ato-CCJFBaixar


 Assista ao vídeo com os dois momentos do evento do dia 5 de abril, produzido pela TV Causas da Vida.

Fotos: Roberto Pimenta

 Mostra de cinema: 60 anos do Golpe Militar

Em parceria com o Grupo [de Cinema] Estação, no Rio, a mostra aconteceu de 11 a 17 de abril, em uma das salas do Estação NET Botafogo, com um filme com o tema da ditadura militar em cada uma das noites. Algumas exibições foram seguidas de debate ou de diálogos, e contaram com a presença de diretores e de pessoas que foram representadas nos filmes e de suas famílias.

Mônica Souza, uma das coordenadoras da mostra pelo M&U

Programação da Mostra
11 de abril (quinta-feira) – 19h: TORRE DAS DONZELAS – 2020 – DOCUMENTÁRIO

Direção: Susanna Lira
Quarenta anos após serem presas durante a ditadura militar na “Torre das Donzelas”, como era chamada a ala feminina do Presídio Tirandentes, na cidade de São Paulo, um grupo de mulheres revisita a sua história, entre elas, ex-presidente da República Dilma Rousseff.

Felipe Pinheiro, Maria da Fé Viana e Vera Lunardi
no apoio à iniciativa

12 de abril (sexta-feira) – 19h: ZUZU ANGEL – 2006 – FICÇÃO
Direção: Sergio Rezende. Elenco: Patrícia Pillar, Daniel de Oliveira, Camilo Bevilacqua, Luana Piovani, Leandra Leal, entre outros
Nos anos de chumbo da ditadura militar, Zuzu Angel era uma estilista de sucesso que conquistava o mundo com o seu talento, até que seu filho Stuart desapareceu nas mãos dos militares, foi torturado e morto. A trajetória de Zuzu Angel de busca por justiça é a base desta memória. O Diretor Sérgio Resende e a produtora Marisa Leão (foto abaixo) dialogaram sobre o filme com as pessoas presentes.

13 de abril (sábado) – 19h: O PASTOR E O GUERRILHEIRO – 2022 – FICÇÃO
Direção: Jose Eduardo Belmonte. Elenco: Julia Dalavia, Johnny Massaro, Ana Hartmann, César Mello, entre outros.
Na virada do milênio, Juliana, filha ilegítima de um coronel que comete suicídio, descobre que seu pai foi torturador durante a ditadura militar no Brasil. A busca pela verdade leva a jovem à memória de um dos integrantes da Guerrilha do Araguaia, que na prisão tem um encontro marcante com um jovem evangélico.

14 de abril (domingo) – 19h: CODINOME CLEMENTE – 2018 – DOCUMENTÁRIO
Direção: Isa Albuquerque
Carlos Eugênio Paz relembra sua participação na luta armada contra a ditadura militar entre as décadas de 1960 e 1980. Utilizando o codinome “CLEMENTE”, ele participou da Ação Libertadora Nacional e diversas ações Urbanas. A diretora Isa Albuquerque (de preto, à esquerda da foto abaixo) participou de diálogo com as pessoas presentes.

15 de abril (segunda-feira) – 19h: PRA FRENTE BRASIL – 1982 – FICÇÃO
Direção: Roberto Farias. Elenco:  Reginaldo Faria, Antônio Fagundes, Natália do Valle, Elizabeth Savalla, Carlos Zara, Cláudio Marzo, Neuza Amaral, Paulo Porto, entre outros.
Após ser confundido com um ativista político, um pacato cidadão da classe média é preso e torturado por agentes federais enquanto o regime propagava a euforia do milagre econômico brasileiro e ocorria a Copa do Mundo de 1970. O final da exibição aconteceu um debate com a presença dos filhos do diretor, falecido em 2018, Mariana e Mauro Farias (à esquerda e à direita na foto abaixo).

16 de abril (terça-feira) – 19h: JANGO – 1984 – DOCUMENTÁRIO
Direção: Sílvio Tendler
A trajetória política de João Goulart, o 24° presidente brasileiro, deposto pelo golpe militar de 1º de abril de 1964. A reconstituição é feita por meio de imagens de arquivo e de entrevistas com importantes personalidades políticas como Afonso Arinos, Leonel Brizola, Celso Furtado, Frei Betto e Magalhães Pinto, entre outros.
A neta de Jango, a socióloga Barbara Goulart, participou de diálogo com as pessoas presentes, mediado pelo diretor do Grupo Estação Cavi Borges, seguido do lançamento do livro de autoria dela, “O Passado em Disputa – Memórias Políticas sobre João Goulart” (foto à direita).

17 de abril (quarta-feira) – 19h: BATISMO DE SANGUE – 2007 – FICÇÃO
Direção: Helvécio Ratton. Elenco: Caio Blat, Daniel de Oliveira, Angelo Antônio, Leo Quintão, Odilon Esteves, Marcela Cartaxo, Cássio Gabus Mendes, entre outros.
O convento dos frades dominicanos, em São Paulo, na segunda metade dos 1960, torna-se uma trincheira de resistência à ditadura militar que governa o Brasil. Movidos por ideais cristãos, os freis Tito, Betto, Oswaldo, Fernando e Ivo passam a apoiar a Ação Libertadora Nacional, comandada por Carlos Marighella. Eles logo passam a ser vigiados pela polícia e posteriormente são presos, passando pela crueldade da tortura.
Ao final ocorreu um debate com o Prof. Ivo Lesbaupin, um dos dominicanos encarcerados representados no filme e a jornalista Luciana Petersen, mediado pela Profa. Regina Novaes.

Da esquerda para a direita: Luciana Petersen, Regina Novaes, Ivo Lesbaupin e Mônica Souza
Parcela de integrantes da equipe organizadora da iniciativa
Violência e Abuso de Poder, nunca mais! A resistência religiosa nos 60 anos do Golpe Militar

Fotos: Bob Pimenta, Cavi Borges, doações de arquivos pessoais de participantes

Folheto digital para as igrejas

As organizações que compõe esta iniciativa prepararam este material educativo e sensibilizador, em quatro páginas, que pode ser livremente baixado e enviado a pessoas de igrejas, em grupos de WhatsApp e publicado em mídias sociais. Quem desejar também pode imprimir – o acesso é livre.

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Folheto digital para sensibilização de pessoas em geral

As organizações que compõe esta iniciativa prepararam este material educativo e sensibilizador, em quatro páginas, que pode ser livremente baixado e enviado a quaisquer pessoas, em grupos de WhatsApp e publicado em mídias sociais. Quem desejar também pode imprimir – o acesso é livre.

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Mesa Teológica dos 60 anos do Golpe Militar: atividade na Igreja Batista do Caminho

O momento de culto na Igreja Batista do Caminho (Centro do Rio de Janeiro), na manhã do domingo 24 de março de 2024, foi oportunidade para a realização da “Mesa Teológica dos 60 anos do Golpe Militar”, promovida pela igreja como parte da iniciativa “A Resistência Religiosa nos 60 anos do Golpe Militar no Brasil”.

Momento de reflexão e desafio, a mesa foi coordenada pela teóloga Priscilla Reis Ribeiro e contou com conteúdos oferecidos pela profa. Magali Cunha e pelo prof. Ivo Lesbaupin. Foi recuperada a memória das posturas de apoio e resistência das igrejas e de fiéis evangélicos e católicos durante a ditadura militar. De forma didática, foram apresentados vídeos, dados e depoimentos, como o do próprio Ivo Lesbaupin, um dos freis dominicanos presos em São Paulo, conforme registro no livro de Frei Betto, transformado no filme “Batismo de Sangue”. Foram enfatizadas as terríveis consequências da perseguição a estes cristãos e cristãs. As pessoas presentes recordaram o que aconteceu como demissões, prisões arbitrárias, tortura, execuções e desaparecimentos por parte do regime militar, com a colaboração de delatores de fora e de dentro das próprias igrejas.

A necessidade de recuperar esta memória para entender e se confrontar os autoritarismos e as arbitrariedades praticados, ainda hoje, foi ressaltada. Ela vem sendo efetuada por agentes públicos nas periferias do país, contra pobres, negros e negras, especialmente, e nas igrejas, contra a diversidade de opiniões, práticas e visões de mundo. Ao final, um emocionante momento de recordar a memória de 12 cristãos, seis católicos e seis evangélicos, maioria jovens, que perderam suas vidas por se posicionarem contra a ditadura, nos porões da repressão, foi experimentado com a menção dos nomes, suas histórias e fotografias.

Clique aqui para assistir à gravação da mesa teológica
Clique aqui para assistir ao culto completo

Fotos: Igreja Batista do Caminho

Apoio às ações do Fórum Grita Baixada

Por William Cruz, coordenador da Rede de Educação Popular da Baixada Fluminense

A Ditadura Militar na Baixada Fluminense representa o marco para as atuais configurações de poder em seus territórios. A instabilidade política e descontinuidade das gestões até a retomada de grupos paramilitares tem consequências até hoje, sendo impossível falar sobre a região sem resgatar este período. São abundantes os relatos de moradores sobre as mudanças na vida familiar por conta do regime autoritário, deslocamentos entre municípios, destruição de documentos e silenciamentos sobre o assunto são exemplos de estratégias adotadas no interior das famílias a fim de evitar o pior – a tortura e desaparecimento. Traumas que muitos carregam até hoje.

Mobilizados pelo chamamento do Coletivo Memória e Utopia e do Fórum Grita Baixada, o conjunto de pré-vestibulares populares, bibliotecas comunitárias e museus de território articulados por meio da Rede de Educação Popular da Baixada Fluminense, com seus parceiros e apoiadores, elaboraram uma programação em descomemoração do Golpe de 64 que teve início no dia 23 de março de 2024 e segue a princípio até o dia 30 de maio de 2024.

Rodas de conversa, oficina de rap, contação de história e aulas, entre outros formatos, compõe essa programação que busca deslocar a abordagem sobre período do meio universitário, do centro e da classe – média branca para outros recortes de gênero, sexualidade, geográfico e étnicos raciais. Ao mesmo tempo reapresentar os fatos e acontecimentos históricos que marcam este período para as novas gerações, alcançando crianças, adolescentes, jovens e adultos.

Em busca desses objetivos, a Rede, em parceria com o Fórum Grita Baixada, o Sindicato Estadual dos Profissionais da Educação núcleo Nova Iguaçu e o Centro Cultural Casa de Jota Rodrigues, contando o apoio do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras da Fiocruz (ASFOC – SN), Sindicato dos Trabalhadores em Educação da UFRRJ (SINTUR – RJ) e Associação dos Docentes da UFRRJ (ADUR – RJ), também desenvolveu uma exposição fotográfica itinerante a partir do acervo do Centro de Documentação e Imagem da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (foto abaixo, à esquerda). Para a Rede essa é a primeira experiência com a linguagem expositiva, mas que tem possibilitado levantar o debate sobre o resgate e preservação da memória nos territórios.

Fotos compartilhadas por Sueli Catarina.

 Carta-Manifesto (aberta a assinaturas)

Leia e assine em apoio a Carta-Manifesto das organizações que promovem o Ato e a Mostra, junto com igrejas e outros coletivos.

Acesse outros materiais sobre o tema

Veja aqui a publicação no site da revista CartaCapital sobre o Ato de 5 de Abril.

Saiba mais sobre ações do Coletivo Memória & Utopia sobre igrejas e ditadura militar.

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