Trajetória profissional anterior ao cargo influencia tomada de decisão dos ministros do STF, aponta estudo

Publicado originalmente em Agência Bori. Para acessar, clique aqui.

Highlights

  • Análise de perfil de 35 ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) aponta que trajetória pregressa à indicação ao cargo é determinante para suas decisões
  • Foram observados os ministros do STF desde 1988, usando-se o caso do Mensalão como objeto de estudo
  • Metade dos indicados pelos governos petistas votou mais pela absolvição do que a média da corte e a outra metade votou mais pela condenação dos envolvidos do que a média dos ministros

A trajetória profissional dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), antes de serem indicados pelo poder executivo, importa, e muito, na tomada de decisão depois de empossados no tribunal. Um estudo publicado na segunda (28) na revista “Brazilian Political Science Review” (BPSR) desenvolveu uma tipologia e um banco de dados sobre as trajetórias de 35 ministros que passaram pelo STF desde 1988 e, operacionalizando as características profissionais como variáveis independentes, examinou o comportamento judicial dos ministros nas mais de cem votações realizadas no caso do Mensalão. O levantamento foi feito por cientistas políticos da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).

O trabalho começou a ser feito em 2018, mas também abrange a análise de trajetória dos ministros indicados por Jair Bolsonaro. A escolha de um ministro para o STF deve seguir apenas três requisitos: o presidente deve indicar alguém com mais de 35 anos e menos de 70 anos, que tenha reputação ilibada e notável saber jurídico. “Com base nisso, existe uma latitude de escolha muito grande”, afirma Rogério Arantes. Depois de indicado, o nome deve ser aprovado pelo Senado – que nunca vetou nenhuma indicação até hoje, exceto por alguns poucos e folclóricos casos do início da República.

Os pesquisadores construíram cinco tipos de trajetórias entre os membros do Supremo: há aqueles que foram juízes de carreira, aqueles que tiveram outras carreiras jurídicas, cujo ingresso se dá por meio de concurso público, aqueles que foram advogados em escritórios particulares e professores em universidades, os que foram políticos indicados por algum poder executivo e, em minoria, os que foram políticos eleitos.

Ao longo de suas trajetórias profissionais, ministros podem mesclar esses diferentes tipos e uma das inovações da metodologia dos pesquisadores Rogério Arantes e Rodrigo Martins foi contemplar essa complexidade e verificar, em que medida, as diferentes características se combinam e influenciam na decisão do voto quando estão no tribunal. “Não é a indicação presidencial que explica a orientação dos votos dos ministros no julgamento do Mensalão. São mais determinantes os fatores acumulados ao longo da carreira dos juízes”, aponta Arantes.

Os ministros indicados pelos governos petistas, por exemplo, se dividiram durante o processo do Mensalão: metade votou pela absolvição mais do que a média do tribunal e a outra metade pela condenação dos envolvidos, mais do que a média dos pares. No entanto, quando as trajetórias profissionais desses ministros são levadas em consideração, o padrão de voto se vê explicado muito mais pela experiência pregressa que tiveram do que pelo suposto vínculo com o presidente que os indicou.

A análise das trajetórias dos ministros não ajuda a entender apenas o padrão de votação dos ministros, mas lança luz sobre as indicações presidenciais. Os pesquisadores afirmam que no debate público existe a caricatura de que os presidentes indicam políticos de sua confiança e que deveriam ser nomeados apenas juízes, porém o estudo mostra que perfis extremos – políticos profissionais e juízes puros – raramente são os escolhidos. De acordo com Arantes, embora a regra constitucional lhes dê ampla latitude, presidentes são constrangidos pela necessidade de ter sua indicação aprovada pelo Senado, cuja maioria política observa a agenda do tribunal e tem interesse em influenciar suas decisões. “O STF não é um órgão de justiça. Ele é uma instituição política e, numa democracia, importa muito a forma como ela é composta”, reforça.

Em seu próximo mandato, o presidente Luís Inácio Lula da Silva terá que indicar dois nomes. O estudo de Arantes e Martins não avaliou o processo de indicação do executivo, mas Martins aponta que a tendência é que os presidentes diversifiquem suas escolhas de ministros. “Talvez os ministros indicados no próximo mandato não tenham o mesmo perfil dos indicados nos anteriores”, observa.

Juntamente com a publicação do artigo, os cientistas divulgarão o banco de dados no qual se baseia o trabalho, além da tipologia determinada, para que novos testes sejam feitos em outras pesquisas sobre os ministros do STF, como análise de outros casos que passaram pelo tribunal ou outros aspectos relativos à nomeação dos juízes constitucionais.

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