Publicado originalmente em Instituto Palavra Aberta por Mariana Mandelli. Para acessar, clique aqui.
Em ano de uma eleição cercada de expectativas, o prazo para emitir e regularizar o título de eleitor tem provocado debate pela falta de engajamento dos jovens. Com campanhas de mobilização do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) voltadas para esse público, a data final, 4 de maio, vem sendo reforçada nas redes sociais com a participação de celebridades como as cantoras Anitta e Luísa Sonza e até o ator hollywoodiano Mark Ruffalo.
Até fevereiro, o órgão tinha registrado o menor volume de títulos emitidos em nome de adolescentes de 16 e 17 anos de toda a sua história: cerca de 830 mil, sendo que na eleição presidencial anterior esse número foi de 1,4 milhão. A tendência de queda é preocupante porque denotaria um crescente desinteresse dos jovens pela política do País.
Mas é preciso perguntar: de que política estamos falando? Se estamos nos referindo às questões partidárias daquilo que se chama de política tradicional, pode ser que haja mesmo uma descrença progressiva, que precisaria ser aferida com estudos abrangentes e profundos.
Também é preciso questionar outro ponto: quem é esse jovem que está ignorando o iminente período eleitoral? A resposta não é simples, mesmo porque não existe “o jovem brasileiro”, mas sim uma diversidade de juventudes que reflete as desigualdades socioeconômicas, culturais e territoriais do Brasil – desigualdades estas que têm, como consequência, diferenças abissais de trajetórias, oportunidades e expectativas.
Ao mesmo tempo, sabemos que os jovens nunca estiveram tão conectados, o que lhes dá cada vez mais acesso à informação e a pautas sociais. Dados da pesquisa TIC Kids Online Brasil, promovida pelo Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br), revelou que a taxa de usuários e usuárias da internet entre 9 e 17 anos passou de 79% para 89% no período 2015-2019.
Por mais que existam dificuldades de conexão e de compra de equipamentos, como escancarou o ensino remoto durante a pandemia, é evidente que os adolescentes fazem um uso massivo das plataformas digitais, produzindo, consumindo e compartilhando conteúdo. Surgem, portanto, mais questões: como eles vêm fazendo isso? De forma responsável? Crítica? Cidadã? Se não, então como desenvolver neles essas habilidades, despertando enfim uma consciência política e democrática?
Um levantamento recente do Datafolha mostrou que 60% dos brasileiros e brasileiras acreditam que a desinformação pode impactar o resultado do pleito eleitoral. Entre a população mais jovem, esse percentual é ainda mais elevado: 88% das pessoas de 16 a 24 anos creem no potencial maléfico do que chamamos de “fake news”, sendo que 98% possuem, no mínimo, um perfil em rede social.
Outra pesquisa, intitulada Juventudes e Democracia na América Latina e publicada pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), revelou que o processo de politização das juventudes de Brasil, Colômbia, Argentina e México tem ocorrido por meio das redes sociais, com papel fundamental de influenciadores digitais.
Dados como esses servem para reforçar a premissa de que iniciativas de educação política para esse público precisam ser contínuas e midiáticas. Elas devem focar no processo de participação e no exercício da cidadania como um processo do qual a eleição faz parte, deixando claro que também é no dia a dia que se constroem pautas e se percebem demandas para o bem-estar individual e coletivo. E tudo isso depende de informação de qualidade.
Nesse sentido, projetos como o #FakeToFora, lançado recentemente pelo Instituto Palavra Aberta por meio do EducaMídia com o apoio de diversas organizações, são muito bem-vindos. Com uma série de conteúdos multimídia a serem trabalhados em sala de aula, a proposta impulsiona o protagonismo jovem no combate à desinformação no período eleitoral sem ignorar como essa geração se relaciona com as mídias online e offline.
Envolver os jovens no debate político vai, ou pelo menos deveria ir, muito além da emissão do título eleitoral e da própria presença nas urnas. Os esforços de comunicação do TSE são admiráveis e teriam resultados ainda melhores se construíssemos políticas públicas que dialogassem com as juventudes nos espaços em que elas se encontram, como é o caso da escola, e por meio dos canais por onde elas consomem conteúdo. Ainda há tempo de agir para, quem sabe, registrarmos um aumento da participação delas na próxima eleição.