Publicado originalmente em Ciência UFPR por Camille Bropp. Para acessar, clique aqui.
Pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em Design da UFPR desenvolveu sistema que adapta a antropometria digital para posições sentadas. É dessa tecnologia que saem medições que servem de base à fabricação de diversos produtos, de roupas a próteses
Quem não tem muita certeza se veste tamanho M ou G tem noção do desafio industrial que é padronizar uma roupa. Em geral, os modelos das roupas — e dos móveis, das próteses e de diversos outros produtos — vêm de padrões criados por meio de medições de base populacional. Uma tecnologia em ascensão nesta área é a antropometria digital, que usa digitalizadores (escâneres) para obter as medidas de partes de todo o corpo humano. Desta forma é possível obter as dimensões de centenas de pessoas, a fim de criar padrões mais precisos para determinada população.
A questão é que essa tecnologia exclui pessoas com deficiência motora, que não conseguem ficar em pé enquanto esperam o escâner funcionar — o que pode levar tempo. São pessoas com deficiência motora, usuários de cadeiras de rodas, muletas e pessoas que têm dificuldade em permanecer de pé por muitas horas. A inclusão desse público é o alvo da tese defendida pela professora e pesquisadora Isabella Sierra no Programa de Pós-Graduação em Design (PPGDesign) da Universidade Federal do Paraná (UFPR), vencedora do Prêmio Capes de Tese 2023 na área de Arquitetura, Urbanismo e Design.
Com base em revisão teórica e muita experimentação, Isabella propõe um sistema, batizado de ADap (sigla para antropometria digital adaptada), que guia a antropometria digital em todas as suas fases para possibilitar a inclusão de pessoas com deficiência motora: planejamento, registro e avaliação de medidas.
GALERIA | Experimentação até chegar ao protótipo ideal
Registro do estudo de posições ideias para a antropometria digital de pessoas com deficiência motoraAnimação mostra comparação de pose sentada na cadeira de rodas e no dispositivo ortoposicionador do ADapPosturas que a cadeira do sistema ADAp permiteRegistros do escaneamento para antropometria com o uso do sistemaRegistro do estudo de posições ideias para a antropometria digital de pessoas com deficiência motora
Dessa forma, a pesquisa subsidia o mercado para pensar em produtos específicos ou até personalizados para esse grupo social, produzidos em escala maior e com adaptação mais precisa.
“A indústria para esse público existe no Brasil, ainda que pequena, e produz produtos adequados usando principalmente outros métodos mais antigos, como moldes de gesso e recortes manuais em espuma, por exemplo. No entanto, são métodos demorados e caros e não conseguem abranger toda a demanda, que é muito grande”, disse Isabella à Ciência UFPR.
Outro ganho prestado pela pesquisa aos setores que produzem para pessoas com deficiência motora é oferecer um guia de uso das tecnologias mais recentes. Isso ocorre por meio da plataforma digital que faz parte do ADap, responsável por orientar o planejamento do produto, que dá também noções sobre os protocolos da antropometria digital.
Quem não tem muita certeza se veste tamanho M ou G tem noção do desafio industrial que é padronizar uma roupa. Em geral, os modelos das roupas — e dos móveis, das próteses e de diversos outros produtos — vêm de padrões criados por meio de medições de base populacional. Uma tecnologia em ascensão nesta área é a antropometria digital, que usa digitalizadores (escâneres) para obter as medidas de partes de todo o corpo humano. Desta forma é possível obter as dimensões de centenas de pessoas, a fim de criar padrões mais precisos para determinada população.
A questão é que essa tecnologia exclui pessoas com deficiência motora, que não conseguem ficar em pé enquanto esperam o escâner funcionar — o que pode levar tempo. São pessoas com deficiência motora, usuários de cadeiras de rodas, muletas e pessoas que têm dificuldade em permanecer de pé por muitas horas. A inclusão desse público é o alvo da tese defendida pela professora e pesquisadora Isabella Sierra no Programa de Pós-Graduação em Design (PPGDesign) da Universidade Federal do Paraná (UFPR), vencedora do Prêmio Capes de Tese 2023 na área de Arquitetura, Urbanismo e Design.
Com base em revisão teórica e muita experimentação, Isabella propõe um sistema, batizado de ADap (sigla para antropometria digital adaptada), que guia a antropometria digital em todas as suas fases para possibilitar a inclusão de pessoas com deficiência motora: planejamento, registro e avaliação de medidas.
GALERIA | Experimentação até chegar ao protótipo ideal
Registro do estudo de posições ideias para a antropometria digital de pessoas com deficiência motoraAnimação mostra comparação de pose sentada na cadeira de rodas e no dispositivo ortoposicionador do ADapPosturas que a cadeira do sistema ADAp permiteRegistros do escaneamento para antropometria com o uso do sistemaRegistro do estudo de posições ideias para a antropometria digital de pessoas com deficiência motora
Dessa forma, a pesquisa subsidia o mercado para pensar em produtos específicos ou até personalizados para esse grupo social, produzidos em escala maior e com adaptação mais precisa.
“A indústria para esse público existe no Brasil, ainda que pequena, e produz produtos adequados usando principalmente outros métodos mais antigos, como moldes de gesso e recortes manuais em espuma, por exemplo. No entanto, são métodos demorados e caros e não conseguem abranger toda a demanda, que é muito grande”, disse Isabella à Ciência UFPR.
Outro ganho prestado pela pesquisa aos setores que produzem para pessoas com deficiência motora é oferecer um guia de uso das tecnologias mais recentes. Isso ocorre por meio da plataforma digital que faz parte do ADap, responsável por orientar o planejamento do produto, que dá também noções sobre os protocolos da antropometria digital.
“Essa indústria segue os embasamentos científicos, só que a maioria dos profissionais não tem formação em tecnologia, na área de escaneamento e modelagem 3D, o que dificulta que apliquem essas tecnologias. O sistema tenta ajudar nisso, capacitando os profissionais e auxiliando no desenvolvimento de produtos por meio de uma equipe multidisciplinar que pode usar técnicas inovadoras e muito mais ágeis”.
Cadeira posiciona pessoas com deficiência para a antropometria digital
Além dos protocolos e das ferramentas de auxílio à adaptação da antropometria digital, o sistema propõe um dispositivo ortoposicionador, ou seja, que consegue posicionar, de acordo com a necessidade, os membros da pessoa que terá o corpo escaneado. É uma cadeira feita de acrílico e metal que viabiliza a digitalização do corpo em posições sentadas, que também foram sistematizadas na pesquisa.
Já a antropometria digital convencional exige que a pessoa fique em pé, com braços e pernas abertos, como na famosa posição do homem vitruviano de Leonardo da Vinci.
Segundo a professora Maria Lúcia Okimoto, do Departamento de Engenharia Mecânica da UFPR e orientadora da pesquisa, o dispositivo vai ao encontro da reformulação das melhores posturas para medição corporal que a literatura científica tem apresentado.
“Alguns estudos de antropometria já haviam identificado que a melhor maneira de medir as pessoas não era necessariamente em pé. Para medir altura com mais acurácia, por exemplo, o uso do estadiômetro inclinado [espécie de régua], com a pessoa na posição inclinada durante a medição antropométrica, ajuda porque reduz o efeito da compressão dos discos intervertebrais. Aplicar esse conceito a pessoas com deficiência traz grande vantagem, porque evita que elas fiquem em pé”, afirma Maria Lúcia, que coordena o Laboratório de Ergonomia e Usabilidade (Laberg) da UFPR.
A pesquisa usou uma técnica chamada design iterativo, segundo a qual se parte de um protótipo mínimo que é aprimorado a cada experimentação.
Foi assim que testes com o grupo específico da pesquisa mostraram que a cadeira resolve o principal desafio da antropometria digital adaptada, que é permitir o escaneamento dos dois lados do corpo, frente e costas. Os apoios de acrílico têm o objetivo de posicionar membros sem interferir na captação da imagem. Também ajudam que o participante da medição possa ficar sem se mexer durante a digitalização.
Apesar de a cadeira ser uma parte do sistema ADap, pode-se dizer que tudo começou com uma cadeira. Ou melhor, o interesse no desenho delas.
“Desde que entrei para a graduação em design industrial tive vontade de estudar cadeiras. É um assunto de interesse nos cursos de design por se tratar de um produto bastante comum, que possui uma certa complexidade e que é bastante antigo, podendo ser analisado em diversos períodos da história do design”, conta Isabella.
No mestrado na Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc), Isabella reuniu cadeiras à tecnologia assistiva e pesquisou cadeiras de rodas. “Após o mestrado o interesse só cresceu”, diz, para explicar como chegou à pesquisa de doutorado. Atualmente professora no Departamento de Expressão Gráfica da UFPR, Isabella continua as pesquisas na área de tecnologia assistiva.
Tecnologia assistiva tem linha de pesquisa antiga na UFPR
Pelos resultados que superam a antropometria manual, que é a técnica mais usada para medições de pessoas com deficiência, o ADap foi patenteado e está disponível para licitações e parcerias por meio da Superintendência de Parcerias e Inovação (SPIn) da UFPR.
“A busca de patentes, em projetos de pesquisas, está cada vez mais atraente. O dispositivo desta pesquisa foi patenteado e, espera-se que em trabalhos futuros sejam geradas outras patentes”, explica Márcio Catapan, professor no PPGDesign da UFPR e coorientador da tese.
A tecnologia assistiva é um assunto fixo do Laberg desde 2015, com a criação da Rede de Pesquisa e Desenvolvimento em Tecnologia Assistiva (RPDTA), que reúne pesquisadores da instituição e das universidades federais Tecnológica do Paraná (UTFPR) e de Santa Catarina (UFSC), e as estaduais Paulista (Unesp) e de Santa Catarina (Udesc).
Mais recentemente, somou-se ainda o trabalho com os Novos Arranjos de Pesquisa e Inovação em Tecnologia Assistiva (Napi-TA), da Fundação Araucária, uma parceria entre universidades paranaenses, Hospital do Trabalhador e Secretaria do Desenvolvimento Social e Família (Sedef).
Na avaliação de Maria Lúcia, há muita ciência pela frente para a antropometria digital. Escâneres ainda apresentam limitações para captar imagens de partes complexas do corpo, como mãos e pés.
“Acredito que este seja um desafio a ser superado em breve, com novas tecnologias. Associar a antropometria digital à inteligência artificial é algo também desafiador e parece caminho sem volta”.