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*Patricia Blanco é presidente do Instituto Palavra Aberta
O debate em torno do relatório apresentado na última semana pelo senador Eduardo Gomes (PL-TO), relator do projeto de lei que cria o marco regulatório da inteligência artificial, trouxe um alerta importante: precisamos falar sobre o desenvolvimento de habilidades e competências para o uso seguro, responsável e fortalecedor de toda e qualquer ferramenta desse tipo, tanto as que já conhecemos como as que virão em um futuro próximo.
Se pensarmos que a inteligência artificial já está presente em diversas atividades do nosso dia a dia, em funcionalidades que muitas vezes nem percebemos, o esforço para preparar a sociedade precisa envolver os mais diversos atores. Na base de tudo está a educação, em especial a educação midiática e informacional.
Nesse sentido, o debate em torno desse tema em sala de aula se torna cada vez mais relevante, para que os educadores apoiem crianças e adolescentes a desenvolverem senso crítico e resiliência diante dos efeitos adversos da IA e da ação algorítmica. Ou seja, a educação precisa capacitar os usuários e promover sua autonomia em relação à qualquer nova tecnologia.
É importante ressaltar que, embora o letramento digital seja essencial, é necessário ir além da capacitação para o uso das ferramentas tecnológicas em si, abarcando o desenvolvimento contínuo do pensamento crítico, da criatividade, de questões éticas e da capacidade de reflexão sobre a responsabilidade de cada um no uso dessas novas tecnologias, incluindo a população adulta e idosa que já deixou o sistema de ensino.
O Guia para Uso da IA na Educação, lançado pela Unesco em 2023, trouxe balizas importantes com o propósito de auxiliar os países-membros na introdução desta nova tecnologia no ambiente escolar. Segundo Tawfik Jelassi, Diretor-Geral Adjunto para Comunicação e Informação da Unesco, “as políticas e normas sobre IA devem dar prioridade à capacitação dos usuários e, nesta perspectiva, o letramento midiático e informacional oferece um conjunto chave de competências para a navegação segura e consciente em um ecossistema digital em desordem”.
No Brasil, a Estratégia Brasileira de Educação Midiática, lançada no fim de 2023, reforça este entendimento ao afirmar que “os conhecimentos e habilidades devem ser explorados de forma crítica, para entendermos os impactos da tecnologia sobre a justiça social e a democracia — e não como mais uma ferramenta de trabalho em uma sociedade digital”.
Durante o seminário “IA em Educação e Cultura”, realizado pela Fundação Itaú no fim de maio, o professor e cientista Silvio Meira alertou que, dentro de oito anos, os estudantes que saírem do ensino fundamental terão diante de si um mundo muito diferente devido à inteligência artificial. Por isso, é imperativo considerar a preparação social e educacional para esse futuro, o que inclui a oferta de programas de educação midiática para o desenvolvimento de pensamento crítico e, consequentemente, a capacitação da sociedade para tomar decisões informadas.
Nesta mesma perspectiva, o Papa Francisco reconheceu a ambivalência em torno da IA, afirmando que ela pode inspirar entusiasmo e ampliar o acesso ao conhecimento globalmente. “No entanto, ao mesmo tempo, pode trazer consigo uma maior injustiça entre nações avançadas e em desenvolvimento ou entre classes sociais dominantes e oprimidas”, observou durante a última reunião do G7.
De entidades internacionais a educadores e pesquisadores, passando pelo próprio Papa, há um consenso sobre a relevância de lidarmos com a IA de forma cautelosa, responsável e sem deixar de lado iniciativas de educação midiática. Se regular é necessário, educar para o uso dela é urgente.