Publicado originalmente em Coletivo Intervozes. Para acessar, clique aqui.
Chegamos ao fim de 2020. Um ano difícil, marcado pela perda irreparável de milhares de vidas, muitas incertezas, exaustão e ansiedade. Os retrocessos na garantia de direitos humanos afetaram de maneira desproporcional as vidas de grupos historicamente vulnerabilizados. Os povos de comunidades tradicionais, mulheres, negres, moradores de periferias e favelas, LGBTQIs, entre outros, sofreram, e muito, com o projeto genocida e anti-democrático daqueles que nos governam.
Em anos assim, as conquistas se tornam ainda mais emblemáticas. Servem como lembretes de que a caminhada é longa, mas a vitória não tarda a chegar. E é só a luta que muda a vida.
Confira as principais ações e conquistas do Intervozes em 2020:
Começamos o ano com o nosso curso anual de formação “Ideias para adiar o fim do mundo: tecnopolíticas, resistência e contra-ataque em tempos de autoritarismo”, realizado em Salvador nos dias 24 e 25 de janeiro. Reunimos cerca de 45 associadxs do coletivo, comunicadorxs, pesquisadorxs e ativistas do campo de direitos humanos. Além de oficinas e aulas, tivemos uma palestra aberta com Ailton Krenak, que pode ser assistida aqui.
Em fevereiro, protocolamos uma ação judicial, ao lado de outras cinco instituições, para cobrar informações do Metrô de São Paulo sobre a implementação de um sistema de câmeras com reconhecimento facial. Também apresentamos à Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão um requerimento solicitando providências legais para a responsabilização da RecordTV por desrespeito e inadequação da emissora às normas vigentes para a radiodifusão brasileira e aos direitos humanos durante a transmissão do programa policialesco Cidade Alerta.
Lançamos o especial “Concentração da Mídia e Liberdade de Expressão”, em parceria com o Le Monde Diplomatique Brasil. Na série de textos, publicamos 11 artigos do Relatório Direito à Comunicação 2019 tratando da violência contra comunicadorxs, desinformação, vigilância, comunicação pública, policialescos, entre outros temas.
No comecinho de março, antes da pandemia chegar com força ao Brasil, participamos da 175ª audiência temática da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH/OEA), realizada no Haiti, para denunciar as violações sistemáticas à liberdade de expressão, ataques à imprensa, censura às liberdades artística e cultural, sufocamento dos espaços de participação social e acesso à informação pública. No mesmo mês, uma vitória importante: o Intervozes passou a ocupar uma das vagas de suplência no Conselho de Comunicação Social do Congresso Nacional. Pela primeira vez, uma entidade do movimento pela democratização da comunicação é escolhida para o CCS.
Parte dos nossos esforços foram voltados para lidar com os impactos da pandemia no direito à comunicação, especialmente em relação ao acesso à internet. Protocolamos um requerimento na Agência Nacional de Telecomunicações solicitando que o órgão publicasse uma liminar proibindo a suspensão de serviços de conexão à Internet móvel ou fixa por 90 dias, incluindo o bloqueio da navegação em caso de atingido o limite da franquia. Quase 100 dias depois do pedido, a Anatel indeferiu nosso requerimento.
Entramos com uma representação na Procuradoria da República do Distrito Federal solicitando o cancelamento da contratação da empresa IComunicação Integrada pela Secom e a devolução de 4,8 milhões de reais para o erário. A empresa havia sido contratada para a desenvolver a campanha “O Brasil não pode parar”, suspensa pela Justiça por atentar contra as medidas sanitárias para conter a pandemia.
Fizemos uma breve pesquisa em parceria com a Coordenação Nacional da Articulação de Quilombos (CONAQ) para compreender como os quilombolas estão atravessando a pandemia. No campo da educação o acesso à internet foi outro direito crucial neste ano, e recorrentemente violado, como mostra o artigo “Como o ensino a distância pode agravar desigualdades agora”.
Em maio, nos juntamos ao mandato do vereador de Recife Ivan Moraes na denúncia apresentada ao Ministério Público contra a Rádio Novas de Paz. Em transmissões, o grupo fez uso de concessão pública para disseminar desinformação e desestimular as medidas de distanciamento social recomendadas pelos órgãos de saúde.
Ao lado da CONAQ, articulamos uma proposta de emenda sugerindo o uso do Satélite Geoestacionário de Defesa e Comunicações (SGDC) ou outra tecnologia para garantir a conexão de comunidades indígenas, quilombolas e distritos não sede de municípios. E outra vitória: passamos a ocupar, por meio da Coalizão Direitos na Rede, uma das vagas destinadas ao Terceiro Setor no Comitê Gestor da Internet (CGI.br).
Um projeto de lei no Congresso Nacional quase conseguiu criminalizar os usuários de internet no país. Por meio da Coalizão Direitos na Rede, o Intervozes trabalhou para construir alternativas ao PL 2630/2020, o PL das Fake News. Em nosso blog na Carta Capital, temos artigos explicando o PL e seus principais problemas, como este, que mostra como a pressão da sociedade civil foi importante para retirar pontos críticos do projeto.
Ainda em junho, lançamos duas publicações. A primeira foi o livro Desinformação: crise política e saídas democráticas para as fake news, em parceria com a Editora Veneta, e que contou também com uma série de lives nas redes sociais. No Dia do Meio Ambiente, lançamos o estudo “Vozes Silenciadas: a cobertura do vazamento de petróleo no litoral”, que analisa a abordagem dos principais veículos de comunicação no Brasil sobre o maior desastre por derramamento de petróleo cru do Oceano Atlântico Sul.
Em parceria com a ANDI – Comunicação e Direitos, realizamos o curso “Liberdade de Expressão, Regulação Democrática da Mídia e Garantia dos Direitos de Crianças e Adolescentes”, voltado para capacitação de operadores do Sistema de Justiça. No mesmo mês, realizamos a série de lives Desafios da Democracia em Tempos de Pandemia, com o objetivo de discutir os impactos da pandemia no direito à comunicação a partir da perspectiva étnico-racial.
Em julho, seguimos na luta contra o PL 2630/2020. O projeto foi aprovado no Senado e trouxe graves prejuízos ao exercício da liberdade de expressão, como destaca esta nota da Coalizão Direitos na Rede. A escalada da violência contra jornalistas e comunicadores levou entidades de defesa do direito à comunicação a entrarem com uma ação contra a omissão do Governo Federal em promover medidas de segurança para garantir a atuação de jornalistas que cobrem as entrevistas do presidente Jair Bolsonaro na área próxima ao Palácio da Alvorada.
No Dia de Luta da Mulher Negra, Latino-Americana e Caribenha, lançamos o projeto Ondas da Resistência, que reúne esforços coletivos para contar histórias e dar voz a pescadoras, pescadores, marisqueiras e outros povos e comunidades tradicionais que vêm enfrentando os impactos do vazamento de petróleo agravados pela crise sanitária. A live de lançamento do projeto pode ser assistida aqui. Ao longo de três meses, também lançamos 6 episódios de podcast abordando a situação de territórios.
Em agosto, lançamos o documento “Padrões para uma regulação democrática das grandes plataformas que garanta a liberdade de expressão online e uma internet livre e aberta”, elaborado conjuntamente pelo Intervozes, Idec, OBSERVACOM e Desarrollo Digital. Embora não tenha como foco o combate à desinformação, o texto apresenta princípios para a regulação das atividades das grandes plataformas que podem contribuir para o enfrentamento do problema.
O Intervozes enviou, no dia 17 de agosto, um pedido de informações ao Twitter sobre a moderação do perfil de Sara Fernanda Giromini, conhecida como Sara Winter. Ela havia divulgado o prenome e o local onde uma criança de 10 anos vitima de estupro teria seu direito à interrupção da gestação assegurado. Até então, a plataforma tinha sido a única a não suspender o perfil de Geromini.
O tema dos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres ganhou bastante repercussão neste ano e foi tema de um dos episódios do Podcast Levante Sua Voz, que lançamos em setembro. O programa quinzenal ajudou a ampliar a difusão de temas relacionados ao direito à comunicação. Somando 8 episódios, o podcast é veiculado em 10 plataformas de streaming e também na Rádio UFRJ.
No 10º Fórum da Internet no Brasil, estivemos em oito debates, sendo dois propostos pelo coletivo. Desinformação, vigilância e acesso à internet foram alguns dos temas abordados. Atentos ao debate do uso de dados na saúde, acelerado pela pandemia, enviamos uma contribuição à consulta pública de minuta para a atualização da Política Nacional de Informação e Informática em Saúde (PNIIS). A medida faz parte de um conjunto de iniciativas da pasta relacionadas à gestão de dados na área, como a criação da Rede Nacional de Dados em Saúde.
Na preparação para as eleições municipais, desenvolvemos uma série de perguntas para candidates ao Executivo e Legislativo a respeito de propostas concretas para o campo da comunicação e cultura, em parceria com a organização feminista Me Representa. Também lançamos o especial Eleições nas Redes, em parceria com o Congresso em Foco e a Coalizão Direitos na Rede, onde publicamos nove artigos com análises dos desafios democráticos de uma eleição centrada na internet. Ainda sobre as eleições, fizemos uma série de quatro debates sobre direito à comunicação, proteção de dados, tecnologias de vigilância e acesso à internet. E ajudamos a pressionar as emissoras de televisão para a realização de debates eleitorais no primeiro e segundo turno, em uma ação conjunta com coletivos de advogados e juristas.
Sete meses depois de apresentar as denúncias de violações à liberdade de expressão e de imprensa, organizações da sociedade civil brasileira voltaram a se reunir com a CIDH para denunciar o agravamento da situação no país. As organizações apresentaram as violações ao direito à informação e os impactos destas na vida da parcela da sociedade mais vulnerabilizada.
Em outubro, também lançamos a pesquisa Fake News: como as plataformas enfrentam a desinformação, que analisa medidas de combate à desinformação adotadas por plataformas digitais. A live com a apresentação dos principais resultados pode ser assistida aqui.
O minicurso “Direito à Comunicação e Justiça Socioambiental”, outro desdobramento do projeto Ondas da Resistência, foi realizado nos dias 14 e 16 de outubro. Ministrado pelas jornalistas e pesquisadoras Camila Nobrega e Maryellen Crisóstomo, o curso teve parceria da Universidade Federal de Sergipe (UFS) e buscou contribuir para a ampliação do conhecimento sobre o direito à comunicação e a luta por justiça socioambiental no Brasil.
No principal evento global sobre internet, o Internet Governance Forum, o Intervozes participou de três painéis. Discutimos o impacto das tecnologias no meio ambiente, a infraestrutura da internet em períodos de emergência global, dados e vigilância.
Em parceria com a Comissão Guarani Yvyrupá e o Centro de Trabalho Indigenista, lançamos a primeira experiência do Laboratório Tático do Comum, nas Terras Indígenas Tenondé-Porã e Jaraguá. Você pode encontrar mais informações e aderir à campanha no site da Plataforma Cinturão Verde Guarani.
Em novembro, fizemos o monitoramento de candidatos detentores de concessões de radiodifusão e que construíram suas carreiras nos programas policialescos. Foram publicados artigos abordando como a propriedade de concessões é um negócio de família e as propostas vigilantistas e de criminalização de grupos vulneráveis defendidas por esses candidatos.
No apagar das luzes de 2020, conseguimos uma vitória importante: derrotamos a Google na Justiça! A empresa foi condenada por “autêntica censura prévia” e deverá pagar uma indenização de R$ 50 mil por remover indevidamente quatro vídeos do nosso canal no YouTube. A Justiça reconheceu ainda a ilegalidade do mecanismo de Content ID.
Confira mais destaques:
Janeiro
Intervozes protocola ação na Justiça contra a Telefônica/Vivo por exposição de dados pessoais
A sanha vigilantista e punitivista que orienta políticas no Brasil
Fabio Wajngarten e a necessidade do debate sobre publicidade oficial
Fevereiro
Secom passa longe da Constituição e vira máquina de ataques a desafeto
Cidade Alerta: Quando a barbaridade toma conta da televisão brasileira
Março
Coronavírus: falta de acesso amplia fosso de desigualdades
Mulheres em isolamento: quando a própria casa é o espaço inseguro
Comunicação pública perto do fim
Abril
Governo Bolsonaro é denunciado na CIDH por violações dos direitos humanos na pandemia
Como anda a relação da grande mídia com Jair Bolsonaro?
Programas religiosos defendem templos abertos e fé contra coronavírus
Globo e Moro retomam dobradinha em vazamento e construção como herói
Maio
Nova publicação do Intervozes aponta caminhos para enfrentar a desinformação
Intervozes apoia pedido de impeachment popular e cassação da chapa Bolsonaro-Mourão
PL Fake News tem rito acelerado e traz riscos à liberdade de expressão
Por que discutir a proteção de dados pessoais na pandemia?
Sob risco de privatização, EBC luta para se manter viva
Junho
Indígenas, negros e pobres: odiados pelo Estado e excluídos da internet
TSE, cumpra seu papel e julgue a chapa Bolsonaro-Mourão
Sobre Globo e racismo: o buraco é mais embaixo
Quem quer dinheiro? Minicom volta a ser comandado por radiodifusor
O que falta para que as políticas de promoção de tecnologias na educação funcionem?
Julho
Jornalismo local poderia amenizar os impactos da pandemia nos quilombos
PL das fake news: desafio da Câmara é manter avanços e resolver riscos
Mídias Negras e Indígenas: comunicação em defesa da vida
Moderação de conteúdos e liberdade de expressão online: quais os limites?
Agosto
Nota conjunta sobre crise no Sistema Interamericano de Direitos Humanos
Mar de Luta: movimentos pesqueiros e organizações lançam campanha contra petróleo no Nordeste
Sem LGPD, a própria democracia está ameaçada
Reviravolta no Senado garante LGPD, mas luta está só começando
Eleições municipais: partidos se preparam para lidar com desinformação
Em defesa do debate público sobre o uso de tecnologias de vigilância
Censura e governismo levam EBC mais longe da comunicação pública a cada dia
Direitos de transmissão e o “negócio” do futebol no Brasil
O pacto narcísico da branquitude e o dilema social
Outubro
Direitos de transmissão e a corrompida relação entre CBF, Bolsonaro e mídia
Proposta que visa estimular o jornalismo no PL fake news é perigosa
Risco na proteção de dados em saúde
Sociedade civil repudia novo episódio de autopromoção de Bolsonaro na TV pública
Pedido de audiência com Senador para discutir regulação de programas policialescos
Novembro
Amapá: entidades questionam Anatel sobre protocolo de emergência
Eleições: investigar ataques coordenados é crucial para a democracia
Ofensiva contra Sleeping Giants Brasil pode abrir precedente perigoso
A violência política e o crescimento do discurso de ódio nas eleições
Pessoa física pode impulsionar post citando candidato?
Dezembro
Justiça Eleitoral fez pouco contra desinformação, violência política e uso de dados
Intervozes defende reserva de espectro para uso não licenciado
Sementes de Marielle enfrentam e resistem à violência política racial e de gênero
A escola no mundo digital: dados e direitos dos estudantes
O sequestro do espaço público por táticas de vigilância e securitização
Você pode encontrar mais artigos e análises em nossas colunas na Carta Capital e no Congresso em Foco.
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