Quase metade dos lares chefiados por mulheres negras em Salvador sofrem com insegurança alimentar

Publicado originalmente em Agência Bori. Para acessar, clique aqui.

Highlights

  • A insegurança alimentar é maior nos domicílios chefiados por mulheres negras: insegurança alimentar leve (25,6%) e insegurança alimentar moderada ou grave (21,2%)
  • 50,1% de 14 mil domicílios soteropolitanos são chefiados por mulheres negras (50,1%), seguido por homens negros (35,4%) e mulheres (8,3%) e homens (6,2%) brancos
  • Mulheres negras têm menores índices de escolaridade (41,5% têm Ensino Fundamental) e os menores rendimentos (51,1% têm renda de apenas meio salário mínimo per capita)

O retrato da insegurança alimentar em Salvador, capital baiana, pode ser encontrado com mais facilidade em um endereço: nos lares chefiados por mulheres negras. A fome na capital baiana pode ser identificada pela cor, sexo e gênero, assim como revela a pesquisa feita por professores e estudantes de pós-graduação da Universidade Federal da Bahia (UFBA), que mapearam a (in)segurança alimentar nos domicílios, tendo como base o contexto social e histórico local. O resultado da pesquisa foi publicado na sexta (5) na “Revista Cadernos de Saúde Pública”, da Fundação Oswaldo Cruz.

O Mapa da Fome em Salvador revela que a prevalência de insegurança alimentar foi mais elevada nos domicílios chefiados por mulheres negras (insegurança alimentar leve: 25,6% e insegurança alimentar moderada ou grave: 21,2%). Os autores destacam que a insegurança alimentar está presente nos lares de mulheres negras independentemente das condições socioeconômicas, como escolaridade e renda. Por sua vez, a maior segurança alimentar foi observada nos lares chefiados por homens brancos (74,5%). A pesquisa analisa a situação da fome em 14.713 domicílios, entre os anos 2018 e 2020, em 160 bairros de Salvador, através da aplicação da Escala Brasileira de Insegurança Alimentar.

Silvana Oliveira, coautora da pesquisa, explica que os dados foram classificados em diferentes níveis: residências com segurança alimentar (àquelas com acesso à alimentação em quantidade e qualidade), insegurança alimentar leve (ou seja, lares onde as pessoas não sabem se vão ter acesso a comida num futuro próximo), insegurança alimentar moderada (lares com restrição na quantidade de alimentos entre os adultos) e insegurança alimentar grave (restrição na quantidade de alimentos entre as crianças ou a fome propriamente dita entre crianças e adultos), além de dados de raça/cor e sexo para conhecer a situação de insegurança alimentar nos lares chefiados por homem branco, mulher branca, homem negro e mulher negra.

“Existe a necessidade de se incorporar a interseccionalidade – que considera as relações de poder, como o racismo e sexismo – para entender um problema na elaboração de políticas públicas de combate à fome. Viver em situação de insegurança alimentar sinaliza não somente privações materiais, mas também mecanismos ideológicos que interditam oportunidades de melhorias de vida da população negra. Não é possível discutir a insegurança alimentar sem considerar a hierarquização social, racial e de gênero, suas articulações e a persistência de práticas discriminatórias reproduzidas tanto em Salvador, quanto em todo o Brasil”, ressalta Silvana.

80% em Salvador são pretos ou pardos

Com aproximadamente 3 milhões de habitantes e 80% da população autodeclarada preta e/ou parda, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Salvador é um território marcado pelas históricas desigualdades sociais e segregações raciais, situação que afeta, de forma direta, sobretudo a população negra. Tendo como base esse quadro, que já foi identificado em estudos anteriores, o objeto de pesquisa das estudantes de pós-graduação da UFBA foi montar um mapa da segurança e os níveis da insegurança alimentar na cidade.

DOI: https://www.scielo.br/j/csp/a/MQHNQz5GH9NmxjZpFm3zC3r/?lang=pt

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