Quando desinformação, construção da ignorância, violência simbólica, discurso de ódio e machismo andam juntos o resultado é fatal: morte, luto e dor!

Artigo de Ana Regina Rêgo.

Também disponível em Jornal O Dia e Portal Acesse Piauí.

De forma recorrente, falo neste espaço de jornalismo de opinião, onde também trazemos informação, que nossa luta nos últimos quatro anos tem sido o de combater o fenômeno da desinformação que, como eu e Marialva Barbosa já frisamos, nasce em um mercado que visa uma construção intencional da ignorância, ou manutenção desta, como requer Peter Burke. Nesse sentido, atuamos dentro da Rede Nacional de Combate à Desinformação ( https://rncd.org/ ) e em outras tantas redes e iniciativas de ação e intervenção no tecido social com vistas a tentar minimizar os avanços e as consequências da desinformação em nossa sociedade. 

Com bem destaquei em minha coluna da semana passada, a desinformação não se separa de questões estruturais da nossa cultura colonial. Machismo, racismo e misoginia compõem as narrativas que com frequência são estrategicamente pensadas para despertar o ódio para com pessoas que possuem atuação no ambiente político ou jornalístico, por exemplo, sobretudo, quando os alvos da desinformação são mulheres, que sofrem diariamente com agressões de todo o tipo, inclusive físicas.  

O dividir para conquistar e dominar faz parte das estratégias de guerra desde Sun Tzu. Na atualidade o dividir, o polarizar politicamente tem se intensificado a partir das particularidades de nosso momento de vida na contemporaneidade. Como dito, em alguns artigos anteriores, a vida digital e a presença ubíqua das plataformas na vida da sociedade, e a influência deste lócus da nova biós (vida) e não o bios (Basic Input/Output System), tem sido decisiva para o comportamento humano em comunidades compartilhadas. 

Tomando de empréstimo o conceito de Bourdieu de violência simbólica, também aqui recorrentemente abordado em diversos momentos, vemos que o exemplo do representante máximo da nação brasileira nos últimos quatro anos, Presidente Jair Bolsonaro, denominado de mito por parte significativa da população brasileira, é sim um importante aspecto a ser analisado quando o ódio invade as pessoas e as leva a cometer violências, assédios e assassinatos. 

Não senhor Bolsonaro, não se trata de sentido figurado fuzilar a petralada”, trata-se do despertar de um sentimento de ódio frente à diversidade de pensamento, trata-se do incentivar o uso de armas de fogo contra tudo e todos, trata-se de reduzir os impostos da indústria armamentista e fomentar a criação de clubes de tiro em todo o país, curiosamente, e de forma ignorante, em contraponto ao incentivo à cultura da leitura e construção de bibliotecas que sim, tem o papel de despertar para o pensar. 

A ideia da humanidade trabalho (no atual governo) de preferência escravo, tendo em vista a retirada contínua dos direitos dos trabalhadores, comungada com as estratégias de esvaziamento do sistema educacional superior, com o corte progressivo de verbas, pretende criar uma nação de não pensantes, de ignorantes, onde alguns privilegiados terão acesso ao dinheiro e o restante da massa, seguirá cega aos ditames da exploração. Do ponto da conquista da hegemonia é vital que os explorados, apoiem seus exploradores, e é isto que temos visto mais e mais. 

Em recente conversa com alguns representantes de esquerda, tive a não tão grata surpresa, de perceber nestas pessoas, um sentimento de que não é necessário investir em comunicação que possa contrapor e combater a desinformação nas plataformas digitais, visto que o cenário político se apresenta favorável a uma vitória no pleito do segundo semestre deste ano. No entanto, o episódio do assassinato do último final de semana em Foz do Iguaçu, somente nos alerta mais ainda para a potência maligna do discurso de ódio que corre nas grandes plataformas de digitais e aplicativos de mensagem, que agora também podem ser encarados como redes sociais. 

A excessiva produção de desinformação sobre a Presidenta Dilma Rousseff, com  peças comunicativas em forma de memes e trollagem, foi essencial para a desqualificação de sua pessoa como gestora política e agravamento da sua crise de imagem e posterior, deposição do poder, por uma articulação política que desejava acesso ao poder. O problema é que o tiro saiu pela culatra e os golpistas de 2016 terminaram abrindo espaço para um pensamento machista, fascista, misógino e violento que tem propagado ódio e mais ódio por todo o país. 

Milhares de pessoas cujas características culturais machistas e racistas, por exemplo, e que estavam sofrendo de uma espiral do silêncio, deixaram aflorar tais sentimentos que vieram à superfície e passaram a afrontar os valores de uma sociedade plural que nos últimos anos vinha tentando lutar por mais direitos, respeito e reconhecimento social.

Esse confronto tem se dado, não no plano das ideias, tendo em vista que pensadores conservadores de extrema direita são raros e quando existem, como o Olavo de Carvalho, trabalham suas posições a partir da distorção do pensamento filosófico ou sociológico, mas com um traço em comum, o despertar para o ódio ao outro, seja ele, uma pessoa ou um pensamento, ou uma outra forma de ver o mundo. 

O ódio é o elemento ativado pelas pensadas e bem-produzidas narrativas com desinformação, como a que recebi hoje pela manhã em um grupo de WhatsApp, que em tom de denúncia prega o ódio aos professores, tendo em vista que alarda que esses não seriam mestres, mas agentes comunistas. 

O elemento ignorância, também estratégico, é primordial para que a narrativa com desinformação construída seja bem recebida pela audiência,  tendo em vista que esta é interpretada a partir do repertório de conhecimento de cada pessoa e de sua relação com o passado seja numa relação antropológica, mnemónica ou histórica. Se não sei o que é comunismo e suas diversas formas, desenho em minha cabeça o monstro do comunismo e o associo a coisas ruins. Um vídeo como o que recebi nesta quarta, 13 de julho, em que escrevo esta coluna, é ativador não só de um preconceito contra o comunismo, como de ódio contra professores. 

Por último, vale destacar que a composição morfológica da desinformação considera tanto o uso de uma estética jornalística, como também técnicas e práticas do jornalismo que tenta descredibilizar para poder se vender como tal. Cena em estúdio, música de fundo, depoimento de pessoas distantes e de difícil verificação, estão na composição da desinformação. 

Fique sempre atento! Desinformação pode levar ao ódio e o ódio pode levar à morte!

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