Por que o monopólio das big techs prejudica o debate público?

Publicado originalmente em *Desinformante por Liz Nóbrega. Para acessar, clique aqui.

Enquanto o Google estreia o banco dos réus nos Estados Unidos, o debate sobre monopólios digitais e os impactos deles se fortalece. O tema já foi pautado em processos anteriores e por alguns marcos regulatórios, como o robusto Digital Markets Act (Lei de Mercados Digitais) da União Europeia, que faz parte das chamadas medidas anticoncentração, mecanismos vistos como uma das saídas contra a desinformação.

Isso porque, explica Gabrielle Graça, assessora em Direitos Digitais da organização Artigo 19, a concentração econômica de empresas como Google e Meta restringe a poucos atores como gatekeepers, ou seja, controladores de acesso que possuem um impacto e controle direto na dinâmica da distribuição de conteúdos.

O documento “Taming Big Tech: Protecting expression for all” destaca algumas barreiras que são colocadas para entrada de novos atores no mercado, entre elas o “efeito de rede”, que ressalta a maior capacidade dos monopólios de atraírem novos usuários do que empresas menores, justamente pelo grande número de pessoas que essas plataformas já possuem.

O professor do Núcleo de Tecnologia de Estudos de Mídia na PUC-Rio, Marcelo Alves, explica que um exemplo desse efeito de rede é o aplicativo Threads. Lançado pela Meta para concorrer com o Twitter, o app, na primeira semana, conquistou milhões de usuários em comparação a outros similares, como Bluesky ou Mastodon. Outro ponto desse efeito, explica Alves, é a própria dificuldade de as pessoas abandonarem o Twitter – agora X – após o que ele chamou de colapso da plataforma, justamente pelo efeito de rede.

A Artigo 19 também aponta outra vantagem que as grandes plataformas têm com a manutenção do monopólio que é a economia de escala de seus negócios. Ou seja, o custo para que uma gigante incremente uma nova ferramenta (ou até lance um app novo) é muito menor que o custo para outra empresa construir uma nova plataforma. Além disso, como no caso do Threads, as vantagens competitivas que se têm a partir do acúmulo massivo de dados dos usuários é significativa em relação aos concorrentes. 

“A elevada concentração e as barreiras à entrada protegem as grandes plataformas da concorrência no mercado, e estas grandes plataformas são capazes de atuar como gatekeepers. Como tal, podem excluir rivais ou impedir a entrada, controlar o acesso dos anunciantes online aos seus utilizadores e controlar o acesso dos usuários ao conteúdo online através dos seus algoritmos de curadoria”, elenca o relatório da Artigo 19.

Essa exclusividade do mercado traz alguns impactos significativos. A especialista do Programa de Telecomunicações e Direitos Digitais do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Camila Contri, pontua que, em um cenário tão monopolístico, elementos tradicionais como preço e qualidade não são aplicados para conquistar os consumidores, isso porque a plataforma se torna “a única opção” e não precisa competir efetivamente se esforçando para promover um serviço de qualidade ao usuário. 

“Se você não tem quem concorra com você por oferecer maior proteção de dados ou privacidade, por exemplo, por que você faria isso sendo que a monetização de dados é um elemento muito importante nesse modelo de negócios?”, questiona Contri. Para ela, isso pode levar a práticas abusivas que afetam não só a concorrência em si, mas também os consumidores, a proteção de dados e o próprio ambiente democrático. 

Para Gabrielle Graça, com a ausência de uma concorrência efetiva, o usuário não tem escolha e precisa se submeter ao modo operante das plataformas, porque a opção seria ou não usar o serviço ou usar o serviço da forma que é imposto pela arquitetura das redes.

“Considerando isso, essas empresas ditam as regras sobre como nós vamos nos expressar, como nós vamos nos informar, qual conteúdo que a gente vai consumir, e isso é perigosíssimo”, afirma Gabrielle Graça, da Artigo 19.

O perigo, de acordo com a assessora, é que essas dinâmicas são pautadas basicamente pelo lucro e não para priorizar o debate sobre direitos humanos, pluralidade e liberdade de expressão, e permitir que o usuário faça escolhas informativas conscientes.

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