Publicado originalmente em *Desinformante por Matheus Soares. Para acessar, clique aqui.
No último final de semana, o estado de São Paulo foi tomado pela fumaça vinda de queimadas. Em meio ao cenário, que já é considerado o maior registro histórico de focos de calor da região desde 1998, publicações nas redes sociais polarizaram e buscaram politizar a responsabilidade dos episódios, com presença também de desinformação circulando sobre o assunto.
Letícia Capone, diretora de pesquisa do Instituto Democracia em Xeque (DX), organização que vem acompanhando a agenda ambiental nas redes desde o início deste ano, explica que as queimadas em SP ganharam grande repercussão e engajamento no debate nas plataformas, sobrepondo-se a tópicos políticos que estavam em alta na semana passada, como as notícias sobre Alexandre de Moraes e as eleições municipais de São Paulo.
A pesquisadora também destaca que a discussão se deu de forma mais polarizada em relação a episódios recentes de queimadas na região Amazônica e no Centro Oeste. “Tivemos não só o campo da direita trabalhando, com ataques ao governo, à ministra Marina Silva e a Lula; mas também tivemos o campo progressista se articulando e mobilizando alguns termos como ‘o Agro é fogo’”, disse Capone.
Além disso, quando se trata da extrema direita, os discursos não traziam informações sobre a atual situação de mudanças climáticas. “Temos que levar em consideração que o Brasil passa por um período de seca histórico, isso certamente tem efeito direto das mudanças climáticas e essa questão não é trabalhada nos discursos dos atores da extrema-direita”, exemplifica.
Nesta quarta-feira (28), o foco de atenção volta a ser a região amazônica, que ainda sofre com incêndios. Às 11h, imagens de satélite mostraram uma grande mancha com concentração de monóxido de carbono feito em áreas da Bolívia e nos estados de Rondônia, Amazonas e Mato Grosso. Hashtags como #AmazoniaEmChamas já ganhou as redes desde ontem, impulsionada por figuras públicas, como a ex-bbb Isabelle Nogueira. “Nós temos também uma articulação de perfis de grupos de fãs que vem mobilizando esse termo [Amazônia em chamas]”, acrescentou Letícia.
Desinformação sobre queimadas em SP
No domingo (25), parlamentares da bancada ruralista postaram publicações falsas acusando o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) de estar por trás dos incêndios, como mostrou a matéria da Agência Pública. Os deputados federais Zé do Trovão (PL-SC) e Lucio Mosquini (MDB-RO) foram alguns dos políticos que compartilharam as publicações com desinformação culpando o movimento.
O MST publicou uma nota de repúdio às acusações, argumentando que as alegações são “sem fundamento” e têm como objetivo tanto desviar a atenção das verdadeiras causas dos incêndios como também criminalizar o movimento pela luta à reforma agrária.
“As queimadas que ocorreram em áreas de produção canavieira são, na verdade, sintomas de um modelo de agronegócio insustentável que domina o campo brasileiro. Este modelo se sustenta pela concentração fundiária, o uso indiscriminado de agrotóxicos, a degradação das condições de trabalho e exploração dos recursos naturais”, afirmou o movimento.
O Aos Fatos identificou um vídeo viral no TikTok que mostrava um trator incendiando um canavial, relacionando as imagens aos incêndios no interior de SP. O conteúdo original, apesar de ser real, foi publicado em dezembro de 2021 na rede social por um perfil de Cuiabá (Mato Grosso). Vídeos considerados de baixa qualidade informativa sobre as queimadas também estão ganhando projeção no YouTube, segundo o Radar, o monitoramento do projeto jornalístico.
Governo federal e estadual suspeitam de ação criminosa
Uma análise do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), publicada pela Agência Pública, mostrou que a maioria dos focos dos incêndios em SP no último final de semana se passaram em áreas de plantação e pastagem. Além disso, mais da metade dos focos nos três dias aconteceu em fazendas privadas registradas no Sistema de Gestão Fundiária.
O governo federal e estadual suspeitam que os incêndios podem ter sido provocados por criminosos. A hipótese é que os episódios aconteceram de forma simultânea em lugares distintos, o que poderia configurar uma ação organizada. A Polícia Civil de São Paulo e a Polícia Federal abriram dois inquéritos para investigar o caso. Até agora, quatro pessoas já foram presas suspeitas de terem ateado fogo na área de vegetação.