Texto por Ana Regina Rêgo. Também disponível em Jornal O Dia e Portal Acesse Piauí.
Uma pesquisa recente do CCDH ( https://counterhate.com/) aponta que o Google tem lucrado muito com desinformação a partir de seu motor de busca, pois exibe anúncios que aparecem em pesquisas Google sobre temas como teorias da conspiração em diversas áreas e sobre racismo, divulgando desinformações que podem prejudicar o leitor desavisado e acrítico.
Os pesquisadores usaram o Semrush, uma ferramenta de análise corporativa muito usada para a Pesquisa Google e identificaram anúncios veiculados pelo Daily Wire, em 155 consultas de pesquisa exclusivas relacionadas a raça, teorias da conspiração e desinformação.
Os resultados, recentemente divulgados, apontam que o Google está lucrando com a exibição de anúncios nos resultados de pesquisas, tais anúncios terminam por promover teorias de conspiração, racismo, desinformação climática, dentre outros temas.
Por exemplo, anúncios veiculados tendo como mote as palavras-chave “crimes negros” promoveram um artigo que afirma que há uma “epidemia de crimes negros contra negros”, apesar das estatísticas oficiais mostrarem que não é o caso.
Por outro lado, anúncios veiculados com as palavras-chave “causa da morte de George Floyd” promoveram um artigo afirmando que ele “provavelmente morreu de overdose de fentanil”, apesar dos médicos legistas considerarem a morte em pauta, como um “homicídio” e existir uma autópsia concluindo que a morte foi resultado de “asfixia devido à compressão posterior do pescoço”.
Sobre a crise climática existem anúncios no Google que surgem nas pesquisas sobre o tema que destacam que as mudanças climáticas são falsas. Anúncios com este conteúdo direcionavam os usuários a um artigo que promovia a ideia de que a mudança climática é uma “farsa”. A permissividade da Alphabet com tais peças de publicidade vão contra a própria política do Google que desde 2021 vem afirmando não permitir e não lucrar com anúncios que promovem a negação climática.
Já questões sensíveis e concernentes à proteção da infância e da criança, tema muito explorado pelo movimento Q’Anon que vem atuando com teorias da conspiração que envolvem personalidades da política e da cultura nos Estados Unidos, em supostos casos de pedofilia, também possuem grande espaço para divulgação no Google. Anúncios veiculados com as palavras-chave “projeto de lei sobre infanticídio” promoviam alegações de que a legislação proposta pelos democratas da Califórnia poderia ter “legalizado o infanticídio”, algo impensável e comprovado como falso pelos verificadores de fatos, mas que atinge diretamente crenças e valores de uma parte da sociedade tanto daquele país, como do nosso Brasil, onde o Kit Gay ganhou crédito pela boca do ex-Presidente Jair Bolsonaro nas eleições de 2018.
Em outra vertente da pesquisa, os investigadores constataram que anúncios veiculados com as palavras-chave “controle populacional de Bill Gates” promoviam um artigo alegando que o investimento de US$ 18 milhões de Gates nos programas de planejamento familiar da ONU era uma ferramenta para exercer o controle populacional na África. No Brasil, durante os anos mais duros da pandemia da Covid-19, Bill Gates foi um personagem presente em várias fake News como responsável por colocar um suposto chip 5 G nas vacinas, a partir do qual exerceria o controle sobre a sociedade.
O Center for Countering digital hate-CCDH chama atenção para o fato de que as pesquisas do Google são “ a lente através da qual bilhões de pessoas encontram informações todos os dias. O Google está lucrando com os anúncios do Daily Wire, que estão distorcendo essa lente e os fatos e informações que as pessoas confiam no Google para fornecer. O Daily Wire está semeando ativamente o ódio e a desinformação para gerar indignação e cliques em seu site para aumentar seus lucros.
Vale destacar que o Daily Wire (https://www.dailywire.com/) é um jornal que se estrutura enquanto conglomerado de mídia conservador que atua nos Estados Unidos e tem sede em Nashville. O Daily Wire foi criado em 2015 por Jeremy Boreing e tem se declarado abertamente como um porta-voz do conservadorismo extremo na América do Norte, sendo partidário do antiglobalismo, nacionalismo e tradicionalismo, além disso é negacionista do clima e abrange outras questões mais complicadas que são transversais quando se debate à desinformação e atravessam gênero, raça, dentre outras questões e terminam por promover o ódio e a violência, seja simbólica ou física.
A aceitação dos anúncios com desinformação do Daily Wire termina por se conformar como uma via lucrativa de mão dupla, tendo em vista que o modelo de negócios da gigante da Alphabet, ao tempo em que visa a própria lucratividade, se coloca como promissora para quem veicula temáticas que ganham visibilidade com maior rapidez, a exemplo da desinformação.
O Google, no entanto, nega que seja conivente com questões racistas e teorias da conspiração e se diz comprometido com a igualdade racial. Contudo, o CCDH chama atenção para o fato de que os produtos do Google estão ajudando a minar os direitos civis de muitos grupos por meio de desinformação e do ódio.
A sociedade civil tem o direito de conhecer como as informações pessoais e coletivas são tratadas, negociadas e vendidas dentro das plataformas digitais e, para tanto, necessita pressionar os governos para que as plataformas sejam reguladas de modo a não prejudicar os cidadãos, denominados de usuários no ambiente virtual. A desinformação como um produto nocivo à sociedade e amplamente divulgado através das redes sociais digitais, faz, portanto, parte da pauta da regulação das plataformas digitais.
No Brasil a pauta volta à tona nesse início de Governo Lula. O próprio Presidente Luís Inácio Lula da Silva, em carta à UNESCO, na semana passada, declarou que a “ comunidade internacional precisa promover uma regulação conjunta das redes sociais, tendo em vista os perigos que desinformação representa para a democracia”, ao que acrescentamos os riscos que a desinformação traz para a vida, considerando que o ódio, o medo e a dúvida, são ingredientes que atravessam sua composição morfológica híbrida.
Para conhecer o CCDH acesse: https://counterhate.com/
Para ler sobre a pesquisa entre no link: https://counterhate.com/blog/google-ads-daily-wire-racist-disinformation-conspiracies/?utm_source=newsletter&utm_medium=email&utm_medium=email&utm_source=engagingnetworks&utm_campaign=newsletter&utm_content=CCDH+in+Action++4+-+Core