Perfis que convocaram atos golpistas culpam Flávio Dino pela violência

Publicado originalmente em Agência Lupa por Iara Diniz e Chico Maré. Para acessar, clique aqui.

No mês que se seguiu aos ataques de 8 de janeiro, perfis denunciados ao banco de dados Lupa nos Golpistas por divulgarem os atos golpistas acusaram o ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, de ser responsável pela violência. As publicações seguem a narrativa desinformativa levantada pelo senador Marcos do Val (Podemos-ES) — o mesmo que, na semana passada, acusou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) de conspirar contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), mas depois voltou atrás.

Na semana após os ataques, influenciadores de extrema-direita, incluindo deputados e senadores, passaram a culpar Dino pelos ataques no dia 8 de janeiro — embora parte deles tenha divulgado os mesmos movimentos que, após a má repercussão das cenas de destruição em Brasília, passaram a condenar. A principal linha de ataque era uma suposta “investigação” de Do Val que “provaria” que Dino teria prevaricado — deixado de exercer sua função pública propositalmente. 

Em sua “investigação”, Do Val mostrou apenas que Dino comunicou o governo do Distrito Federal, e solicitou medidas extras de segurança, que um grande número de manifestantes se dirigia à capital. O deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) chegou a pedir ao STF o afastamento do ministro. O pedido foi negado por “ausência de indícios mínimos de ocorrência de ilícito penal”. 

No Instagram, o perfil “Patriotas Brasileiros” compartilhou ao menos dois conteúdos no último mês associando Flávio Dino aos ataques em Brasília. Em uma das postagens, o perfil replicou uma informação, divulgada por um site de direita, sobre Do Val supostamente ter provas para pedir a prisão do ministro por prevaricação.

A “prova” citada no conteúdo é apenas um ofício enviado pelo ministro ao então governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), solicitando o bloqueio da Esplanada dos Ministérios para ônibus de turismo, enviado no dia anterior ao ataque — o qual o perfil ajudou a divulgar.

Juliano Martins, que participou do vídeo de convocação oficial dos atos de 8 de janeiro junto a influencers e personalidades bolsonaristas, também tem o mesmo comportamento nas redes sociais. Suas publicações no Instagram — rede em que reúne mais de 43 mil seguidores — apontam prevaricação de Flávio Dino e sugerem o afastamento dele do cargo. 

“Então agora ele sabia? Isso não é prevaricação? Não teria que ser afastado como o governador do DF e preso como o secretário de segurança Anderson Torres?”, escreveu Martins em publicação do dia 14 de janeiro.

Essa linha narrativa é a mesma seguida pela advogada Erika Weiss. No dia 10 de janeiro, ela publicou em seu Instagram um conteúdo originalmente compartilhado pelo deputado federal Carlos Jordy (PL-RJ). O parlamentar sugeria, sem provas, que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o ministro Flávio Dino sabiam dos ataques de 8 de janeiro, mas não teriam feito nada para contê-los.

Weiss foi denunciada ao banco de dados da Lupa por compartilhar conteúdos de apoio aos atos golpistas. No dia 7 de janeiro, ela postou em seu Instagram uma live feita pelo caminhoneiro Ramiro, em que ele dizia já ter mais de 20 mil ônibus indo para Brasília. Ramiro está preso. Até a manhã desta terça-feira (7), o conteúdo ainda estava disponível.

A tentativa de culpar o ministro pelos atos encontra eco na bancada de oposição. Questionado sobre a eventual abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar os atos antidemocráticos, no dia 2, o senador Carlos Portinho (PL-RJ) disse que só assinaria se o documento incluísse as acusações de Do Val. “A falha foi generalizada. O senador Marcos Do Val já tem elementos que indicam isso”, disse.

Na semana após a tentativa de golpe, Dino foi um dos principais assuntos nas redes sociais. Segundo o CrowdTangle, ferramenta de monitoramento da Meta, posts no Instagram com o nome do ministro receberam 5,4 milhões de engajamentos na semana imediatamente após a tentativa de golpe. Em dezembro, os engajamentos semanais com essa expressão atingiam cerca de 2 milhões, e antes disso, em novembro, não atingiam 400 mil.

Embora esse aumento no interesse seja normal e esperado — visto que, afinal, seu nome estava no noticiário justamente por causa dos ataques —, uma parcela significativa desses posts vinham de contas de extrema-direita, incluindo deputados, acusando o ministro de “saber de tudo”. Dos 10 posts com maior popularidade, cinco eram ataques ao ministro e acusações de que ele, supostamente, teria “prevaricado”.

O segundo post com mais engajamento no período, por exemplo, foi publicado pela deputada federal Bia Kicis (PL-DF), e dizia que o ministro poderia ser alvo de CPI por sua suposta omissão. A mesma deputada publicou ao menos 11 posts questionando o resultado das eleições de 2022, segundo levantamento do jornal O Globo. No Facebook, posts acusando Dino também foram bastante compartilhados no mesmo período.

Alvo de desinformação

Ao longo do mês, Dino também foi alvo de desinformação não relacionada diretamente aos ataques. Uma das notícias falsas atribuídas ao ministro, ex-governador do Maranhão, foi a de que ele teria mandado queimar ônibus escolares que o governo estadual teria recebido da União, quando Bolsonaro ainda era presidente — as imagens que circulavam foram gravadas na região metropolitana de São Paulo, e os ônibus em questão não tinham qualquer relação com o governo federal.

Notícias falsas antigas sobre o ministro também voltaram a circular. Uma delas dizia que o governo do Maranhão construiu “motéis para presidiários” durante a pandemia — na verdade, o próprio governo federal, ainda sob Bolsonaro, determinou que o governo do estado construísse módulos íntimos em presídios.

Nota: esta reportagem faz parte do projeto Lupa nos Golpistas, produzido pela Lupa com apoio da Fundação Heinrich Böll Brasil.

Editado por

Leandro Becker e Maurício Moraes

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