Panorama global de iniciativas governamentais de combate à desinformação

Por Ana Regina Rêgo.

Artigo também disponível em Jornal O Dia e Portal Acesse Piauí.

Pesquisa realizada e publicada pelo Global Desinformation Index-GDI no segundo semestre de 2021 envolvendo 12 países, apresenta um panorama das principais iniciativas de cada um dos governos pesquisados, para combater o fenômeno da desinformação. Os 12 países incluídos na pesquisa são: Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, França, Alemanha, Índia, Itália, África do Sul, Espanha, Reino Unido e Estados Unidos.

Dentre as conclusões observadas, vale destacar que a desinformação está ganhando mais atenção política. Todavia, ainda existem importantes lacunas nas abordagens desses governos que precisam ser enfrentadas. Alguns países adotaram diferentes medidas para lidar com o problema da desinformação, mas poucos adotaram uma abordagem que inclua cortar as fontes de financiamento dos mercadores de desinformação.

O estudo realizado pelo GDI em torno das políticas e legislações de cada país que tem como foco combater a desinformação, observou que: – Todos os países da amostra, exceto a África do Sul, criaram uma política oficial que se concentra no combate à desinformação relacionada às eleições, embora geralmente limitadas ao ciclo eleitoral. Dez dos doze países têm restrições contra o discurso de ódio, incluindo algumas novas iniciativas propostas no Canadá e no Reino Unido. Mais da metade dos países estabeleceram uma força-tarefa para combater a desinformação, embora as atribuições e o foco das respectivas forças-tarefa sejam distintas em temporalidade e intencionalidades. Três quartos dos países da amostra possuem algum tipo de penalidade – monetária ou não – por infrações relacionadas à disseminação de desinformação. Nenhum país adotou regulamentos para desmonetizar a desinformação, embora um país (Austrália) tenha um código de prática voluntário que inclui regulamentação neste sentido.

Ao longo de seis meses, o GDI avaliou 12 países situados nos cinco continentes com o objetivo de determinar a natureza e a extensão das iniciativas atuais que estão sendo realizadas por esses governos para conter a desinformação. Estes países foram selecionados com base em seus desafios com a desinformação, além das avaliações de risco de desinformação realizadas pelo GDI em seus mercados de mídia, anteriormente.   Esses países também representam uma boa amostra inter-regional de grandes e crescentes ambientes de mídia digital. É uma amostra que congrega quase 1,7 bilhão de usuários de internet, incluindo três dos cinco maiores mercados de usuários do mundo.

A avaliação do GDI se concentrou em observar as legislações, políticas e iniciativas governamentais que considerassem: 1. Desinformação eleitoral; 2. Desinformação sobre e/ou contendo discurso de ódio; 3. Desinformação financiada por anúncios; 4. Força-tarefa interagências e 5. Sanções por não cumprimento.

No que concerne à desinformação eleitoral, a pesquisa revelou que em quase todos os países observados existem políticas para lidar com a desinformação em um ciclo eleitoral, inclusive antes, durante e após as eleições. Descobrimos que em todos os países, exceto na África do Sul, existe alguma forma de regulamentação voluntária ou obrigatória, particularmente como conjunto de medidas destinadas a uma eleição específica ou apenas em operação durante os ciclos eleitorais.

Em geral, tais medidas são criadas para proteger a integridade dos processos eleitorais e  as instituições democráticas. Na Itália, em 2017, foi proposto um projeto de lei que visava estabelecer regras para plataformas digitais para combater “fake News” que objetivassem interferência no processo eleitoral, todavia o projeto não foi aprovado. Na Espanha, antes das eleições gerais de 2019, um decreto-lei real altamente controverso foi publicado para ampliar o controle governamental da internet e em comunicações electrônicas, incluindo durante o período eleitoral.

Em suma, somente três dos países analisados, França, Índia e Espanha, possuem legislação específica contra a desinformação, que também abrange as eleições. Essas iniciativas são frequentemente chamadas de “leis de notícias falsas”, que se destinam a proteger processos eleitorais combatendo informações “falsas” sobre o processo, candidatos e/ou partes. No entanto, em países em que as instituições democráticas não são fortes, surge o risco de que essas leis possam ser mal utilizadas para realmente minar os processos democráticos, limitar a liberdade de expressão e suprimir os partidos da oposição e vozes que surgem desafiando o governo vigente, durante uma eleição.

Sobre discurso de ódio, o GDI avaliou que diferentes países adotaram abordagens distintas para o combate e que em alguns casos não inclui desinformação. Na Alemanha, por exemplo, o discurso de ódio é ilegal e seu combate regulamentado. Todavia, a desinformação não é contemplada diretamente. No Reino Unido, a Online Safety Bill destina-se a combater desinformação e outros discursos que causem danos sociais  e trabalhar pela segurança do cidadão em suas vidas digitais,  e surge como uma legislação pioneira em todo o mundo. O Canadá acaba de apresentar medidas para modificar a legislação existente para combater o discurso de ódio online, mas não como parte do combate à desinformação. Nos EUA, há esforços atuais no Congresso para reformar a Seção 230 da Lei de Decência nas Comunicações (1996), que ainda isenta as plataformas digitais da responsabilidade civil por conteúdo de terceiros publicados em seu serviço, como discurso de ódio ou desinformação. Na França, tentativas de regular o discurso de ódio online foram amplamente debatidas, já na Itália, a crítica e a cobertura midiática sobre possibilidades de regulamentação da desinformação e discurso de ódio tem atrasado a aprovação de uma legislação adequada.

No Brasil algumas iniciativas estão acontecendo no âmbito dos poderes. No Judiciário o TSE reuniu uma força tarefa em 2020 para combater as fake News no período eleitoral. Neste ano de 2022, tanto o TSE quanto o STF criaram programas nacionais de combate à desinformação e estão atuando em rede com ações direcionadas ao pleito. No Congresso Nacional, a CPMI das fake News criada no final de 2019, terminou ficando congelada desde o início da pandemia. Em 2020 se começou o debate para o Projeto de Lei 2630 que mais uma vez, já neste mês (abril de 2022)  não foi adiante para votação, sobretudo, por conta da grande pressão das plataformas digitais contra a aprovação do projeto. Um dado interessante é que as próprias plataformas criaram narrativas falsas sobre o Projeto de Lei para colocar seus usuários contra a legislação, cuja votação terminou sendo adiada.  Em 2021 tivemos a CPI da Covid no Senado que girou em torno da desinformação produzida por agentes governamentais e parlamentares vinculados ao atual governo, sobre vacina e tratamento precoce, dentre outras temáticas, dentre outros temas, como corrupção na compra de vacinas, etc.

As conclusões do relatório do GDI  dão conta de que as medidas para combater a desinformação muitas vezes precisam focar no processo de remuneração que plataformas  promovem permitindo a monetização da desinformação. O GDI argumenta que é essencial remover esses incentivos financeiros para que o ecossistema de desinformação possa ser vencido.

Com informações do Global Desinformation Index. O relatório da pesquisa em pauta nesta matéria poder ser acessado em : file:///C:/Users/ACER/Downloads/2021-09-29-gdi-global-policy-snapshot-online.pdf

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