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Imagem: José Cruz/Agência Brasil
Em mais de 15 anos de atuação em órgãos públicos municipais, primeiro como comissionado em uma Prefeitura e depois como servidor efetivo em uma Câmara de Vereadores de Santa Catarina, percebo que a atuação no período eleitoral é uma das maiores preocupações de quem trabalha com órgãos públicos municipais. Conforme se aproxima o início das vedações, os colegas se agitam em busca de informações sobre como as instituições próximas irão agir e se foi formulada alguma diretriz ou documento de orientação.
Mas neste ano de 2024 o debate parece ter voltado com mais força, devido a quantidade de Prefeituras e Câmaras de Vereadores que anunciaram na véspera do dia 6 de junho – quando iniciou a vedação de autorização de publicidade institucional – que iriam tirar do ar as redes sociais, ou deixar de atualizá-las, devido ao período eleitoral. Só entre as capitais, contabilizei em uma rápida pesquisa no Instagram a quantidade de 12 prefeituras com o informe: Aracaju (SE), Belém (PA), Belo Horizonte (MG), Boa Vista (RR), Campo Grande (MS), Curitiba (PR), Florianópolis (SC), Goiânia (GO), João Pessoa (PB), Natal (RN), Porto Alegre (RS) e São Luís (MA).
Minha percepção é que a esfera municipal é a mais atingida com medidas extremas, como arquivamento de notícias antigas, interrupção na atualização das informações e até fechamento de sites oficiais, por exemplo. Faz alguns anos que acompanho os sites de órgãos federais e estaduais durante as eleições, e geralmente a divulgação de notícias nos sites e redes sociais são realizadas normalmente. A única exceção foi na eleição de 2020, quando o Governo Federal determinou a todos os órgãos que integram o Sistema de Comunicação de Governo do Poder Executivo Federal (Sicom) a criação de contas paralelas para divulgação das informações institucionais. Uma medida esdrúxula, que faz com que os perfis oficiais percam o engajamento e que pode confundir o cidadão.
Acredito que parte dessas dúvidas são originárias das vagas menções à comunicação na Legislação, geralmente entendida ou confundida com o princípio da Publicidade ou Publicidade Institucional. Sem a intenção de cravar aqui uma definição, entendo o princípio da Publicidade como algo mais amplo, que engloba, mas não se resume à Comunicação. Já a Publicidade Institucional, como um serviço da Comunicação Pública. Entretanto, para o Judiciário a Publicidade Institucional e a Comunicação parecem ser apenas sinônimos.
Geralmente, o documento orientador para as ações de comunicação nos órgãos públicos durante o período eleitoral é a resolução editada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que trata dos ilícitos eleitorais, mais especificadamente sobre as condutas vedadas aos agentes públicos. Neste ano, o TSE realizou consultas públicas para debater suas resoluções. A Associação Brasileira de Comunicação Pública (ABCPública) foi uma das organizações participantes e buscou definir melhor o que deve ou não ser vedado.
A proposta, que ajudei a produzir, colocou na pauta principalmente as preocupações dos servidores municipais de garantir a igualdade de oportunidades para os candidatos, sem com isso prejudicar o direito à informação dos cidadãos. O entendimento básico é de que o trabalho das instituições públicas não é interrompido no período eleitoral e, justamente por isso, a comunicação pública também não deve ser.
A primeira sugestão consistiu na definição da publicidade institucional como a veiculação de peças publicitárias em meios de comunicação privados, paga com recursos públicos, incluindo o impulsionamento de mídias sociais digitais. A segunda sugestão buscou determinar os serviços que não infringem a vedação, como manutenção de site e perfis em redes sociais dos órgãos públicos, a publicação ou veiculação de notícias nos canais de comunicação dos órgãos públicos, transmissão de sessões e reuniões das casas legislativas e manutenção de conteúdo publicado antes do período eleitoral.
Apresentada na Consulta Pública pelo vice-presidente de Relações Legislativas e Governamentais, Lincoln Macário, a proposta reuniu as principais questões que preocupam os assessores de comunicação de órgãos municipais e, acredito, seria um grande avanço para a área.
Seria, pois as sugestões não foram incorporadas na Resolução n º 23.735/2024. Em vez das sugestões, a norma traz no § 2º do artigo 15 que a publicidade institucional vedada é comprovada pela indicação de nomes, slogans, símbolos, expressões, imagens ou outros elementos que permitam identificar autoridades, governos ou administrações cujos cargos estejam em disputa na campanha eleitoral.
Por um lado, a resolução pode ser vista como um avanço, pois ampliou um pouco mais o entendimento da publicidade institucional vedada. Já sabemos que não é sobre qualquer coisa que não se pode comunicar. Apesar disso, muitos órgãos públicos, inclusive alguns que não estão disputando cargo eletivo, suspenderam a divulgação de todo e qualquer tipo de notícia.
Por outro, o problema da definição de publicidade institucional utilizada pelo Judiciário continua. É um serviço, ou engloba todos os serviços de comunicação? Se interpretarmos de maneira mais conservadora, ou ao menos precavida, a publicidade institucional é compreendida como toda a comunicação institucional dos órgãos públicos: assessoria de imprensa, publicação de notícias nos sites e nas redes sociais, reportagens e entrevistas nos canais de rádio e televisão públicas. Entretanto, sou da opinião que a publicidade institucional se refere à publicidade paga a veículos de comunicação, incluindo também o impulsionamento em redes sociais.
Em primeiro lugar, precisamos considerar que cargos são ocupados por pessoas. São pessoas que ocupam os cargos de prefeito, vice-prefeito, vereador, secretário municipal. Estas pessoas são responsáveis pelos órgãos em que atuam e devem responder pelos trabalhos que fazem e prestar contas aos seus munícipes. Os departamentos de comunicação nos órgãos públicos existem para facilitar essa prestação de contas e utilizar os recursos disponíveis para tentar alcançar o maior número de cidadãos.
A mera citação do nome ou uma foto de um agente público em uma notícia de um site institucional não pode ser vista como promoção pessoal. Quem mais capacitado do que um secretário para explicar sobre as ações de sua pasta? O Prefeito para falar de decisões de governo? Um vereador para falar de um projeto de lei de sua autoria?
O “apagão” dos perfis de redes sociais de órgãos públicos é um indicativo de que precisamos de documentos legais que definam as atividades e orientem o trabalho dos comunicadores públicos. Que proíbam expressamente a realização de promoção pessoal por meio da comunicação institucional, em qualquer tempo, e a criação de marcas e slogans de governo.
A resolução do TSE determina que os dispositivos de transparência estabelecidos em lei devem ser mantidos nos sites oficiais. Acredito que, caso existisse uma legislação específica sobre a comunicação pública, esta também estaria indicada. O que ajudaria nas decisões dos comunicadores públicos e garantiria o direito à informação do cidadão. Esta é uma discussão urgente que poderia e deveria entrar na pauta do Conselho de Comunicação Social, vinculado ao Senado Federal.
Felipe da Costa
Doutorando em Comunicação (UFPR), Mestre em Jornalismo (UFSC), com graduação em Jornalismo e Relações Públicas. Analista de Comunicação da Câmara de Vereadores de Itajaí, em Santa Catarina. Associado da ABCPública.
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