Estudo promove curso gratuito para pais e responsáveis sobre autolesão em adolescentes

Publicado originalmente em Jornal da UFRGS. Para acessar, clique aqui.

Saúde mental | Usando de intervenção como metodologia, tese de doutorado do PPG Psicologia objetiva reduzir a frequência e a intensidade de autolesão em adolescentes. Inscrições para a atividade estão abertas

*Imagem: Bruna Mattos Machado

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A autolesão não suicida é o ato de se machucar intencionalmente de maneira superficial ou moderada, sem o objetivo de causar morte. A motivação para a autolesão em adolescentes está relacionada a diversos fatores que vão desde as relações sociais no ambiente escolar à relação familiar dentro de casa. No Brasil, pesquisas têm sido realizadas com o objetivo de compreender os sentidos, os significados e as intenções subjacentes aos comportamentos autolesivos nesse grupo social. Vários projetos de intervenção, escuta e acolhimento de jovens que manifestam esse transtorno foram derivados desses estudos.

No Programa de Pós-graduação em Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, uma intervenção psicoeducativa para prevenir a autolesão entre adolescentes está em desenvolvimento como metodologia de uma tese de doutorado. A intervenção elaborada por Bruna Mattos Machado, do Núcleo de Estudos Sobre Famílias e Instituições Educacionais e Sociais (NEFIES), coordenado pela professora Angela Helena Marin, se volta para aqueles que, na maioria das vezes, são os últimos a tomar conhecimento desse transtorno: pais e responsáveis. Por meio do curso online Enfrentando a autolesão, ministrado em quatro módulos, Bruna explica o que significa o termo, quais as funções associadas, a importância do suporte familiar e indicativos para tratamentos. O objetivo é diminuir a frequência e a intensidade da autolesão em adolescentes por meio da compreensão e de tomada de ações.

Através de uma parceria com a Secretaria de Educação do RS, o NEFIES, por meio do Programa Comissões Internas de Prevenção de Acidentes e Violência Escolar (CIPAVE), desenvolve ações nas escolas de ensino fundamental e médio com o intuito de intervir em melhorias. É dessa forma que o grupo colhe informações acerca do quadro de saúde mental de crianças e adolescentes no estado para fundamentar projetos de pesquisa como o de Bruna.

Imagens da apostila “Enfrentando a autolesão: orientações para mães e pais de adolescentes”, organizada pelo Núcleo de Estudos Sobre Famílias e Instituições Educacionais e Sociais (NEFIES/UFRGS) e de autoria de Bruna Mattos Machado
Participação familiar é essencial

“As intervenções em autolesão para adolescentes acabam tendo mais evidências de efetividade com a participação da família”, relata Bruna. Também graduada em Jornalismo, a psicóloga utilizou de sua formação para desenvolver os métodos de comunicação utilizados no curso. Já na graduação em psicologia, participou de grupos de extensão e de intervenção em escolas desde o início. Sua dissertação de mestrado abordou, a partir da competência socioemocional, empatia, problemas emocionais, de comportamento e de rendimento escolar em crianças nos três primeiros anos do ensino fundamental. Agora ela amplia a questão da saúde mental por meio da perspectiva sistêmica característica do seu grupo de pesquisa, incluindo, também, os pais.

“A criança e o adolescente não estão sozinhos no mundo, eles têm os pais, a escola, tudo isso se inter-relaciona”

Bruna Mattos Machado

Compreendendo que o número de intervenções voltadas a adolescentes é significativo, o grupo decidiu focar na família. “A gente começou a identificar, especialmente em estudos qualitativos, que o comportamento autolesivo estava respondendo à uma dinâmica familiar específica, de não ter abertura, de não conseguir falar em casa”, diz Angela. Desde que se inseriu como pesquisadora em programa de pós-graduação, Angela buscou contemplar os principais contextos do desenvolvimento de crianças e adolescentes, tanto físico quanto cognitivo e emocional. Ela explica que esse comportamento é imobilizador; quando os filhos cometem autolesão, na maioria dos casos os pais não sabem como reagir diante disso.

Por ser terapeuta de família e de casal, a professora tem um olhar mais amplo sobre como essas questões interagem e afetam a criança e o adolescente em seu desenvolvimento, o que vai ao encontro com a perspectiva sistêmica do NEFIES, que observa não só a criança e o adolescente, mas também as principais instituições responsáveis pelo seu desenvolvimento: a família e a escola.

“Quando professores identificavam ou os próprios alunos falavam que estavam se cortando, se machucando, as professoras, as gestoras dessas escolas diziam, ‘tá, e eu faço o quê?’”, diz Angela. Por se tratar de um comportamento tido às escondidas, as professoras não sabiam se contavam ou não para os pais. O trabalho com competências socioemocionais realizado pelo grupo é importante para o desenvolvimento de regulação emocional, que se trata da alfabetização psicológica, algo que está implicado com a prevenção de saúde mental.

“Quando o adolescente e a criança não sabem o que fazer com aquilo que estão sentindo, com aquela tristeza profunda, com aquela raiva, uma das formas de tentar regular essa emoção intensa é transferir essa dor emocional para uma dor física, o que imediatamente tem um alívio, mas a gente sabe que não é algo funcional, que não vai resolver”

Angela Helena Marin
Como funciona o curso

Criado como metodologia da tese de Bruna, o curso se divide em quatro módulos com diferentes abordagens didáticas. No primeiro, a psicóloga explica o que é a autolesão e como se dão suas incidências. Já o segundo trabalha validação emocional para pais e adolescentes e diferencia as emoções de pensamentos e comportamentos. O terceiro módulo aborda suporte familiar, comunicação e regras. Estratégias para lidar com a autolesão e psicoterapia especializada são os temas do último módulo. Ao final, são disponibilizados um livreto com informações debatidas ao longo do curso e alguns questionários para os pais que participaram. É a partir desses questionários que serão avaliados os resultados da intervenção, que, de acordo com Bruna, dependerão do nível de impacto na frequência da autolesão. Além disso, também serão avaliadas a regulação emocional dos pais e questões de funcionamento familiar. As informações dos participantes estarão sob sigilo.

A atividade é gratuita e está com inscrições abertas. Interessados devem fazer um cadastro no Moodle da UFRGS e, após, enviar um e-mail (do mesmo endereço cadastrado no Moodle) para enfrentandoalns@gmail.com indicando interesse. Mais informações estão disponíveis no site do curso.

Caso a intervenção se apresente como possível solução

Para que a intervenção seja considerada efetiva, ela precisa manter os seus resultados ao longo do tempo. Uma vez considerada eficaz na prevenção contra a autolesão, a metodologia poderá ser divulgada amplamente como método para lidar com esse transtorno.

A expectativa de Bruna é a de ajudar por meio da ciência. “Tem muitos estudos que relatam que os pais ficam muito inseguros e sentindo culpa quando descobrem que o filho está se autolesionando. A minha intenção é poder ajudar os pais e responsáveis a lidarem com isso e que precisam pensar em como irão se ajudar e ajudar também o filho, compreendendo que a autolesão é um indicativo de sofrimento intenso”, conclui.


Acolhimento

Se você está em sofrimento ou conhece alguém que esteja, pode procurar o Centro de Valorização da Vida (CVV), que oferece acolhimento e apoio emocional gratuito. O atendimento é feito por chat ou pelo telefone 188.

Para jovens de 13 a 24 anos, o serviço Pode Falar Unicef oferece escuta e acolhimento gratuito por meio de um chat. Também é possível acompanhar o perfil no instagram @canal.podefalar.

Para informações sobre como acessar o atendimento de saúde mental na rede pública e em centros de formação em Porto Alegre, região metropolitana e litoral norte, acesse o site Saúde Mental UFRGS.

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