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Artigo | Lucas Wendt, Jussara Borges e Eloisa Loose apontam ações para desenvolver competências infocomunicacionais e promover uma sociedade mais resiliente
*Por: Lucas Wendt, Jussara Borges e Eloisa Loose
*Ilustração: Kezia Mausolf/ Programa de Extensão Histórias e Práticas Artísticas, DAV-IA/UFRGS
O avanço tecnológico e a facilidade de acesso à informação trouxeram benefícios às pessoas em suas diferentes realidades, mas também desafios, como a disseminação da desinformação e o negacionismo em relação às mudanças climáticas. Embora nossa imprensa não tenha um histórico negacionista, informações que circulam em redes sociais e outros espaços virtuais tendem a descredibilizar a urgência e a gravidade da crise climática.
Há quem diga que isso sempre ocorreu e que não devemos nos preocupar com o clima. Há quem aponte que a ciência não tem certeza acerca das questões climáticas, por serem demasiadamente imprevisíveis. Também existem os fatalistas, que argumentam que, se é tão grave assim, não há mesmo o que possamos fazer. E os que não fazem nada por ter fé que, em um futuro próximo, alguma tecnologia reverterá a situação. Esses e outros argumentos se somam para gerar inação e conformismo, permitindo que tudo siga da mesma forma. Vale lembrar, porém: é esse modelo de desenvolvimento que está por trás das transformações do clima.
No Rio Grande do Sul, estado que recentemente tem enfrentado as consequências de um desastre climático, a necessidade de desenvolvimento de competências infocomunicacionais torna-se ainda mais evidente para auxiliar as pessoas a navegar por um contexto climático repleto de incertezas que, também, é cooptado pelo discurso político. Justamente por ser um tema transversal e que tem suas causas associadas à exploração desmedida da natureza, há muitos interesses econômicos em jogo.
As competências infocomunicacionais, que envolvem a convergência entre conhecimentos, habilidades e atitudes do sujeito perante a informação e a comunicação, são potentes ferramentas para enfrentar a desinformação. Por meio delas é possível promover uma compreensão mais ampla e precisa das questões climáticas, uma vez que envolvem o desenvolvimento de uma postura crítica dos sujeitos em relação a seus impactos no ambiente, seu lugar no mundo e sua maneira de se relacionar com o futuro – não apenas o seu, mas das gerações que virão.
O estado gaúcho, ao longo dos últimos anos, tem sido palco de diversos eventos climáticos extremos, como secas severas, inundações e tempestades intensas, manifestações tangíveis das mudanças climáticas globais. A ciência aponta que o estado é particularmente suscetível ao impacto da intensificação da crise climática. A população local, portanto, necessita de informações adequadas, seguras e atualizadas para compreender, se preparar e, na medida que lhe cabe, minimizar perdas e danos oriundos das ocorrências. No entanto, no lugar da segurança informacional, temos o contrário: o caos. A desinformação e o negacionismo climático, que pode ser visto como parte do primeiro fenômeno, dificultam a formação de uma opinião pública bem informada e pronta para agir e se proteger.
A partir disso, surgem alternativas – que devem se tornar uma pauta social para garantir às pessoas condições de acesso a informações de qualidade. As competências infocomunicacionais se mostram recursos importantes para enfrentar a desinformação climática, já que envolvem a habilidade de acessar, compreender, analisar e utilizar informações de maneira eficaz, além de comunicar essas informações a outros de forma clara e responsável. Logo, recomendam-se ações que mereçam a atenção de todas as pessoas: dos cidadãos às autoridades.
Das pessoas, em sua vida diária, espera-se uma ação proativa em relação a esse problema, postura que ganha muito quando é baseada nas competências infocomunicacionais. São elas que permitem um conjunto de atitudes críticas em relação aos problemas que perpassam a vida, o existir e a humanidade. Por exemplo, conscientizar-se de que as questões climáticas são decorrentes do nosso estilo de vida, baseado em queima de combustíveis fósseis. Entender que a destruição da vegetação nativa produz fragilidades no ambiente, deixando-nos mais vulneráveis aos eventos climáticos. Eleger representantes políticos que estejam comprometidos com medidas de mitigação e adaptação.
Das autoridades, espera-se que projetem ações que envolvam a promoção da educação por meio da implementação de programas de desenvolvimento de competências infocomunicacionais voltados para a prevenção e o cuidado ambiental, que incluam o desenvolvimento de capacidade para fazer frente aos discursos enviesados e à desinformação. Não há como enfrentarmos a emergência climática sem percebê-la como uma prioridade do nosso tempo.
Professores também devem ser sensibilizados para abordar questões climáticas de maneira eficaz, e cada vez mais cedo, utilizando metodologias que envolvam os alunos na pesquisa e promovendo a discussão de temas relevantes, o que pode fomentar as competências em informação e em comunicação desde jovens. Além disso, é a formação de um pensamento crítico que permite o desenvolvimento de estratégias para lidar com a desinformação de maneira mais consciente.
As parcerias com diferentes órgãos e instituições devem ser impulsionadas. A realização de cooperações ou convênios com veículos de mídia das comunidades e instituições públicas pode amplificar a propagação de tais competências. Esse é um ponto particularmente sensível para as Defesas Civis, cuja atuação local é orientada para a resposta aos riscos e aos desastres, que tendem a ser mais frequentes em razão das mudanças climáticas.
Trabalhar com veículos de comunicação locais, para garantir a disseminação de informações corretas e combater a desinformação, permite um maior alcance desses recursos infocomunicacionais. Jornalistas especializados em ciência, meio ambiente e clima – infelizmente cada vez mais escassos nas redações – podem ser aliados importantes, atuando como mediadores entre a comunidade científica e públicos diversos. Ademais, explicar às pessoas como funciona o processo de apuração jornalística e quais são as distinções entre uma notícia e aquilo que apenas parece ser uma pode contribuir para escolhas mais acertadas em um ambiente abundante de informações.
Para avançarmos no caminho de uma cultura preventiva, que considere os riscos da emergência climática, é necessário um esforço coletivo. Nesse sentido, recomenda-se o desenvolvimento de competências para a informação e a comunicação como um passo primeiro na direção de um entendimento de mundo que reconecte a sociedade com o ambiente. Quando uma comunidade entende a importância de acessar, compreender e comunicar informações climáticas de maneira eficaz, o que ocorre é o estabelecimento de condições para que se desenvolva uma sociedade mais resiliente e informada, capaz de enfrentar os desafios ambientais do presente e do futuro.
Lucas George Wendt é mestrando no Programa de Pós-graduação em Ciência da Informação – PPGCIN da UFRGS. Também é especialista em Comunicação Institucional/Fadergs e bacharel em Biblioteconomia/UCS e em Jornalismo/Univates.
Jussara Borges é doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (2011) pela Universidade Federal da Bahia. Atualmente é docente na Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação (Fabico) da UFRGS e líder do Grupo de Pesquisa em Competências Infocomunicacionais (InfoCom).
Eloisa Beling Loose é doutora em Meio Ambiente e Desenvolvimento pela Universidade Federal do Paraná – UFPR e doutora em Comunicação pela UFRGS. Pesquisadora e professora da UFRGS na área de comunicação e meio ambiente, com ênfase em mudanças climáticas.