Publicado originalmente em *Desinformante por Rodolfo Vianna. Para acessar, clique aqui.
Aplicativos de mensageria, como o WhatsApp e o Telegram, são grandes difusores de desinformação e fakenews. Por serem ferramentas de comunicação interpessoal, entretanto, são protegidos com criptografia e respeitam o sigilo de correspondência, o que os tornam diferentes das redes sociais abertas, como Facebook, Instagram, Twitter etc. Na última versão apresentada do PL 2630, foram propostas medidas para limitar o disparo em massa de mensagens e, o que gerou polêmica, a preservação de dados por parte dos aplicativos de mensageria que permitissem a identificação da primeira conta responsável pelo envio de algum conteúdo irregular.
No artigo 42 da proposta apresentada (e retirada de pauta), lê-se que “ordem judicial poderá determinar aos provedores de mensageria instantânea que preservem e disponibilizem informações suficientes para identificar a primeira conta denunciada por outros usuários quando em causa o envio de conteúdos ilícitos”.
Diversos monitoramentos já apontaram os aplicativos de mensagens como parte fundamental do ecossistema da desinformação. Durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, por exemplo, pesquisa realizada pela Universidade do Texas apontou que o WhatsApp serviu de canal de desinformação bolsonarista, primeiro, nas eleições de 2018, virando, em seguida, ferramenta de propaganda computacional coordenada por representantes governamentais. Durante a campanha eleitoral de 2022, os aplicativos de mensagem seguiram como propagadores de desinformação.
Após o período eleitoral, o WhatsApp apresentou a possibilidade de se criar comunidades com até cinco mil integrantes. O Telegram também possui ferramenta semelhante. Tal mecanismo levantou discussões sobre o caráter “interpessoal” de trocas de mensagens como da possibilidade de se agravar o uso desses aplicativos na disseminação de desinformação e fakenews.
Segundo o Digital News Report 2022, 64% dos brasileiros se informam por meio das redes sociais e aplicativos de mensagens. Para 41%, o WhatsApp é uma importante forma de compartilhar e discutir notícias. É nesse contexto que ganha complexidade o debate sobre os aplicativos de mensageria.
É ou não é comunicação em massa?
“A criptografia é condição para integridade, autenticidade e segurança das mensagens, não só sigilo. E existem várias possibilidades de grupos com milhares de pessoas terem expectativa de privacidade”, defende Paulo Rená, co-diretor executivo do Aqualtune Lab, para quem “não há justificativa técnica para uma distinção arbitrária entre tipos de comunicações em função da quantidade de pessoas participantes”. Como exemplo, cita comunidades com familiares de vítimas de grandes acidentes, que devem ter seu sigilo preservado. Para ele, o número de integrantes de um grupo ou “comunidade” não interfere no caráter “interpessoal” dos aplicativos de mensageria.
Renata Mielli, atual coordenadora do Comitê Gestor da Internet (CGI), pondera que é um debate polêmico, mas que precisa ser enfrentado. “Precisamos atualizar nosso debate sobre privacidade num ecossistema no qual serviços como o WhatsApp e o Telegram não possuem apenas a dimensão das comunicações interpessoais – estas sim precisam contar com máxima proteção. O mundo atual convive com novos desafios e dimensões de trocas de informação”, coloca.
Já Heloísa Massaro, diretora do InternetLab, pontua uma questão que vai precisar ser resolvida: onde será traçada a linha da mensageria privada. Além disso, há uma grande questão de como garantir transparência para pesquisas acadêmicas, por exemplo, e a privacidade dos usuários. “Acho que algumas coisas são inegociáveis. A criptografia tem que ser inegociável e a minimização da coleta de dados também quando a gente pensa em regulação de plataformas”, defende Massaro.
“No aplicativo de mensagem tem uma questão de privacidade que tem que ser inegociável em alguma medida, eu não acho que o combate à desinformação justifica todo e qualquer tipo de medida e não justifica coletas massivas de dados de todos os usuários, ainda que sejam metadados”, conclui.