É racismo religioso sim!

Publicado originalmente em Brasil de Fato por Dani Portela. Para acessar, clique aqui.

A face religiosa do racismo dialoga com a violência histórica que o povo negro sofre. Segundo dados do Disque 100, entre 2015 e 2019 os casos de intolerância religiosa que aconteceram nos primeiros semestres desses anos aumentaram 197% e cerca de 60% desses casos são contra as religiões de matriz africana.

O crescimento da violência contra o povo negro está diretamente ligado ao avanço da violência contra os territórios que esse povo ocupa e constrói. Não é coincidência esse aumento na mesma época em que existe o aumento da fome, de assassinatos protagonizados pela polícia ou do aumento da população carcerária, que nesse país tem como maior vítima a população negra. 

O racismo é esse grande plano de banalização da vida negra e da demonização de nossa cultura, religiosidade e tradição. O apagamento epistemológico e a perseguição estatal é uma realidade cotidiana contra os terreiros, mas devemos nos perguntar: Qual a responsabilidade do poder público? Qual o compromisso do estado com o povo de terreiro? O povo de religiões de Matriz Africana deve confiar nas instituições? 

A liberdade religiosa no nosso atual momento político está sendo uma ferramenta utilizada por uma parte dos evangélicos, para justificar um discurso de violência, dominação e demonização da espiritualidade afro-brasileira. Porém, não podemos falar de liberdade quando esse valor é instrumentalizado para violar direitos básicos de outro grupo religioso.

Tivemos casos emblemáticos em Pernambuco de extrema violência, como nos casos do Terreiro das Salinas, totalmente destruído por um incêndio criminoso; e também de um pastor de Igarassu, acusado pelo Ministério Público de Pernambuco por atacar artistas negros que pintaram o túnel da abolição na cidade do Recife com referências das religiões afro-brasileiras. Esses casos demonstram o quanto o racismo religioso é presente no nosso estado, e que a política pública que deveria prevenir e garantir a liberdade de culto não está sendo eficiente.

O bolsonarismo tem grande contribuição, pois o avanço do fundamentalismo religioso no Brasil está diretamente ligado ao avanço da necropolítica do Estado nas periferias brasileiras, a partir de uma ideia de verdade universal. O movimento fundamentalista é fruto de uma herança colonial que olha para as culturas e religiosidades diferentes como algo primitivo, que precisa ser purificado, redimido e civilizado. O fator da raça na construção da violência que existe dentro das favelas e territórios periféricos no país não é por acaso. 

Por isso não podemos ignorar que os casos de intolerância religiosa no Brasil, sobretudo os mais violentos, estão sendo protagonizados dentro dos terreiros do país. É urgente afirmarmos que é racismo religioso!

 Imagina vivermos em um país onde padres e pastores têm armas apontadas para as suas cabeças, enquanto exigem que destruam o seu templo. Imagina viver em um país no qual igrejas são queimadas e a legalização de templos cristãos seja relativizada. Será que iríamos afirmar que vivemos em um país democrático? 

Não é possível falar de democracia sem denunciar e enfrentar o racismo religioso. É um compromisso de todos nós, independente de confissão de fé. A garantia da diversidade religiosa deveria ser um valor democrático inegociável. 

Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato Pernambuco.

Edição: Vanessa Gonzaga

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