Conferimos o que as plataformas estão fazendo (ou não) para cumprir a regra dos anúncios eleitorais digitais

Publicado originalmente em *Desinformante por Liz Nóbrega. Para acessar, clique aqui.

As plataformas digitais já estão obrigadas a disponibilizarem dados detalhados sobre  anúncios eleitorais para se enquadrarem na resolução sobre propaganda do Tribunal Superior Eleitoral. Esta regra para a publicidade digital começou a valer no dia 1 de maio. Google e X preferiram proibir esse tipo de impulsionamento político do que se adaptarem à resolução. Meta seguiu com sua biblioteca – mas sem confirmar as mudanças – e o Kwai lançou um repositório de anúncios. Nós conferimos e testamos as ferramentas da Meta e do Kwai. 

Google e Meta (Facebook) foram as empresas que mais lucraram com as eleições de 2022. Dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) apontam que o Facebook lucrou R$128 milhões, enquanto o Google arrecadou R$126 milhões com anúncios políticos. De acordo com Fabiano Garrido, diretor executivo do Instituto Democracia em Xeque, esse número é ainda maior. Juntos, os ganhos das big techs com os impulsionamentos no último pleito somaram R$375 milhões, R$ 250 milhões desse valor, segundo Garrido, foram de recursos oriundos do fundo eleitoral e a diferença proveniente de recursos individuais, como as doações de campanha.

Despesas das eleições de 2022. Fonte: TSE

Apesar dos ganhos vultosos, o Google optou por proibir os anúncios políticos nas eleições de 2024. De acordo com a reportagem do Poder360, o Google avaliou que ‘não seria possível’ se adequar às regras impostas pelo TSE, não pela tecnologia, mas pelo investimento necessário para a aplicação. As eleições municipais possuem candidaturas mais baratas, mas possuem um número muito maior de candidatos. Em 2022, 26 mil pessoas se candidataram, já nas eleições municipais de 2020, por exemplo, foram 526 mil candidaturas aptas. 

Uma possível consequência é que a proibição do Google abra um caminho, de acordo com especialistas ouvidos pelo Estadão, para uma concentração ainda maior de anúncios nas plataformas do grupo Meta, que não se manifestou publicamente sobre a resolução do TSE e a adequação de sua biblioteca de anúncios. A empresa já possui uma biblioteca de anúncios, mas não retornou ao pedido de esclarecimento do *desinformante sobre a adaptação às novas regras impostas pelo Tribunal. 

Humberto Ribeiro avalia a biblioteca da Meta como a mais desenvolvida, mas que ainda é insuficiente. “Ela vem se aprimorando ao longo dos últimos anos, porém ela ainda tem alguns problemas. Alguns elementos que estão disponíveis na biblioteca de transparência da Meta, especialmente no continente europeu, não estão disponíveis para o Brasil”, analisa o diretor jurídico do Sleeping Giants Brasil,.

O que as bibliotecas de anúncios precisam publicar?

De acordo com a resolução que entrou em vigor 1º de maio, as plataformas que disponibilizam o serviço de impulsionamento de conteúdos político-eleitorais devem manter um repositório com esses anúncios em tempo real e ter as seguintes informações:

  • Conteúdo anunciado;
  • Valores investidos;
  • Responsáveis pelo pagamento;
  • Período de impulsionamento
  • Características dos grupos populacionais que compõem a audiência (perfilamento) da publicidade contratada;
  • Quantidade de pessoas atingidas pelos anúncios.

Além disso, devem ser disponibilizadas ferramentas de consulta, acessíveis e de fácil manejo, que permitam realizar busca avançada nos dados do repositório. Assim, obriga as plataformas a terem mecanismos de buscas dentro do repositório a partir de palavras-chave, termos de interesse e nomes de anunciantes.

Testamos a biblioteca da Meta e do Kwai, confira

O *desinformante testou o repositório de anúncios da Meta e constatou que algumas das especificações não foram adotadas, como o “acesso a informações precisas sobre os valores despendidos, o período do impulsionamento, a quantidade de pessoas atingidas e os critérios de segmentação definidos pela(o) anunciante no momento da veiculação do anúncio”. Em um anúncio de uma pré-candidata a vereadora, iniciado em 7 de maio, as informações – que deveriam ser “precisas” – são colocadas entre intervalos. 

Print com informações fornecidas pelo Facebook sobre anúncio

No tamanho estimado do público em detalhe, que é de 100 mil a 500 mil, a biblioteca inclui a informação de que essa métrica, que deve trazer quantas contas atendem aos critérios de direcionamento do público contratado, está em desenvolvimento. Não há, no entanto, detalhes sobre qual foi o público contratado, ou seja, quais os critérios usados para perfilar a audiência.

Print com informações fornecidas pelo Facebook sobre anúncio

Além da Meta, o Kwai é a outra plataforma que permite anúncios políticos nas eleições. Para cumprir a resolução do TSE, a empresa lançou, no último fim de semana de abril, o seu repositório de anúncios. “ A empresa reforça que segue firme com seu propósito de atuar para que a publicidade política seja mais transparente na plataforma, bem como no de estar alinhada com as leis e regulamentações brasileiras para as eleições deste ano”, disse o Kwai em nota.

O *desinformante também testou o repositório de anúncios da plataforma chinesa de vídeos curtos. Ao contrário do que oferece a Meta e também prevê o TSE, não é possível pesquisar na plataforma a partir de temas de interesse ou palavras-chave. A nossa equipe apesar conseguiu pesquisar via nome de anunciantes, que eram poucos e continham anúncios apenas referentes às eleições de 2022:

Print da biblioteca de anúncios do Kwai, apenas 8 nomes aparecem nas pesquisas

Em um dos anúncios realizados pelo então candidato Luiz Inácio Lula da Silva, as informações como impressões e valor gasto também são colocadas em grandes intervalos e não há informações relativas à audiência contratada. Na nota enviada ao *desinformante, a empresa esclarece que “suas Políticas de Anúncios e Conteúdo estão em revisão para estar em linha com as novas diretrizes e que novos serviços e implementações estão sob análise”.

Print com informações fornecidas pelo Kwai sobre anúncio

E as outras plataformas?

O X, assim como o Google, também proibiu a publicação de anúncios políticos na última semana. A plataforma, quando ainda era Twitter, já havia banido esse tipo de anúncio em outubro de 2019. O CEO na época, Jack Dorsey, disse que uma mensagem política não deveria ganhar alcance por impulsionamento, mas organicamente. 

“Pagar pela distribuição do conteúdo tira essa decisão, forçando a otimização e o direcionamento das mensagens políticas às pessoas. Achamos que uma decisão assim não pode estar relacionada a dinheiro. Por mais que a publicidade digital seja incrivelmente poderosa e muito efetiva para os anunciantes comerciais, esse poder traz riscos significativos à política, que pode ser usado para influenciar votos e, com isso, afetar as vidas de milhões de pessoas”, disse Dorsey na sua rede. No entanto, quando Elon Musk assumiu o comando da plataforma, ele revogou essa decisão. Agora, com a resolução do TSE em vigor, o X novamente proibiu esse tipo de impulsionamento.

Conheça outras plataformas que proíbem anúncios políticos:

TikTok

“Todos os anúncios pagos que chegam à comunidade precisam se adequar aos padrões de nossa plataforma, e a natureza dos anúncios políticos pagos não é algo que acreditamos se encaixar na experiência da plataforma TikTok”.

LinkedIn

“Anúncios políticos são proibidos, incluindo anúncios que promovam ou difamem um candidato, partido ou referendo específico ou que pretendem influenciar um resultado eleitoral; anúncios de captação de recursos ou enviados por candidatos, partidos, comitês de ação política ou organizações similares ou referendo; e anúncios que exploram uma questão política delicada, mesmo que o anunciante não tenha uma agenda política explícita”.

WhatsApp

“O envio de mensagens, automatizadas ou não, por candidatos ou partidos políticos sem o consentimento dos usuários pode resultar no banimento de suas contas. No momento, o uso da Plataforma do WhatsApp Business por candidatos e campanhas políticas não é permitido”.

Telegram

“Os anúncios não devem promover campanhas políticas, eleições, partidos políticos, candidatos, movimentos políticos ou religiosos. Anúncios relacionados a eventos ou tópicos delicados em andamento podem ser suspensos por enquanto”.

Spotify

Em 2020, o Spotify proibiu a venda de anúncios políticos. Na época, a empresa disse que não tinha “o nível de robustez necessário em nossos processos, sistemas e ferramentas para validar com responsabilidade e avaliar esse conteúdo”.

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