Publicado originalmente em Jornal da UFRGS. Para acessar, clique aqui.
Ciências da Saúde | Sophia Wermann e Bibiana Verlindo de Araujo apresentam tecnologia que calcula a dose de medicamentos com base em suas características individuais de pacientes e ajuda a prevenir intoxicações
Nesta edição, o JU apresenta uma série de artigos com relatos de pesquisas premiadas no último Salão de Iniciação Científica (SIC). Dessa forma, destacamos a pluralidade do conhecimento produzido na Universidade e a importância da formação de jovens pesquisadores para o desenvolvimento e a qualificação da ciência brasileira. As imagens dos artigos compõem um ensaio produzido pelo bolsista de Fotografia do JU, Marcelo Pires.
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O Laboratório de Farmacocinética e Modelagem PK/PD da Universidade tem oferecido oportunidade para a união de duas paixões: saúde e tecnologia. Esse encontro resultou no desenvolvimento do aplicativo SoPhI (“Service of Pharmacometrics Dose Individualization”), uma solução inovadora voltada para o ajuste da dose de medicamentos destinados ao tratamento de doenças malignas em crianças.
O projeto, iniciado em 2021 sob a coordenação da professora Bibiana Verlindo de Araujo, vinculada aos Programas de Pós-graduação em Ciências Médicas (PPGCM) e em Ciências Farmacêuticas (PPGCF), foi financiado pelo Programa de Pesquisa para o SUS (PPSUS): Gestão Compartilhada em Saúde. Essa iniciativa direciona recursos para pesquisas que visem solucionar problemas prioritários de saúde e fortalecer a gestão do Sistema Único de Saúde no Rio Grande Sul, sendo gerenciado pela Fapergs (Fundação de Apoio à Pesquisa do Rio Grande do Sul).
A equipe multidisciplinar, composta por farmacêuticos e médicos do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) e por docentes das Faculdades de Medicina e de Farmácia da UFRGS, enfrentou o desafio de tornar o tratamento com medicamentos citotóxicos mais seguro e eficaz em pacientes pediátricos. A abordagem dos pesquisadores concentrou-se na aplicação de modelagem e de simulação como ferramentas para otimizar tratamentos com medicamentos de alta variabilidade, dos quais a mesma dose não pode ser administrada para todos os pacientes.
O ponto de partida do projeto envolveu a criação de modelos farmacocinéticos populacionais para os fármacos de interesse, permitindo a adaptação personalizada das doses com base em dados como peso, idade e informações laboratoriais rotineiramente monitoradas durante o tratamento no HCPA, conforme os protocolos clínicos estabelecidos. Uma vez construídos e validados, esses modelos podem ser utilizados para o cálculo de doses individualizadas para os pacientes, auxiliando no alcance de uma terapia mais segura e eficaz.
Os primeiros modelos desenvolvidos foram para o metotrexato em altas doses, um medicamento utilizado para o tratamento de leucemia linfoblástica aguda e osteossarcoma. Durante a sua utilização, para evitar os riscos de toxicidade provocada pelo metotrexato, as concentrações do fármaco são mensuradas e utilizadas para avaliar o risco e a necessidade de intervir por meio da administração da leucovorina, um antídoto para os efeitos do metotrexato. Assim, com os modelos populacionais desenvolvidos, é possível definir a necessidade de dose a ser administrada desse antídoto, tendo como base as informações prévias incluídas no modelo, o que permite antecipar os cenários mais críticos de intoxicações.
Assim como o modelo populacional para o metotrexato, o Laboratório de Farmacocinética e Modelagem PK/PD elaborou um modelo para o bussulfano, medicamento utilizado na fase de condicionamento que ocorre antes do transplante de medula óssea. Nesse processo, há a destruição das células doentes como resultado da quimioterapia, a redução da resposta do sistema imune frente às novas células a serem infundidas e a criação de espaço para elas, o que auxilia no sucesso do transplante. Durante o uso do bussulfano, que ocorre apenas por 4 dias, um nível adequado de fármaco precisa ser atingido para garantir o alcance desses três objetivos. Os dados para o bussulfano foram originados de um projeto desenvolvido anteriormente em uma dissertação de mestrado do PPGCM, defendida em 2020, e também financiado com recursos do PPSUS.
O desafio final consistiu em levar até os pacientes os resultados complexos dos modelos. Para superar essa barreira, foi desenvolvido o aplicativo SoPhI, uma calculadora de dose que permite às equipes personalizar a dosagem para cada paciente com base em suas características individuais.
Sophia participou de todas as etapas do projeto, incluindo a organização dos dados provenientes do HCPA e a elaboração dos modelos farmacocinéticos. Como seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), a aluna de iniciação científica voluntária se propôs a desenvolver o aplicativo e, segundo seu relato, sente orgulho do resultado alcançado: “Eu me interesso muito pela área de desenvolvimento de software e venho estudando sobre isso há muito tempo… Já havia construído algumas páginas web, mas esse foi realmente o meu primeiro aplicativo, e eu tenho muito orgulho de poder contribuir em um trabalho tão relevante. Acredito que a união da saúde com a tecnologia seja o futuro!”.
SoPhI é uma ferramenta acessível e prática para os profissionais de saúde e estará em breve disponível para uso, representando um passo crucial para a integração da inovação tecnológica na prática clínica e um grande avanço em prol da saúde dos pacientes.
Sophia Wermann é graduanda em Farmácia.
Bibiana Verlindo de Araujo é professora do Departamento de Produção e Controle de Medicamentos da Faculdade de Farmácia.