A valorização da ciência frente à nova ordem climática

Publicado originalmente em Jornal da UFRGS. Para acessar, clique aqui.

Cidades | Ana Karin Nunes, professora da UFRGS, fala sobre a necessidade de políticas de investimento robustas na área da prevenção de desastres

*Foto: Flávio Dutra/JU

Historicamente, no Brasil, a opinião dos cientistas tem sido negligenciada por boa parte dos governantes e da sociedade em geral quando o tema é a nova ordem climática e as necessidades de adequação das comunidades aos riscos dela decorrentes. No Rio Grande do Sul, em especial, o desastre provocado pelas inundações no mês de maio de 2024 revelou que várias previsões feitas há anos por pesquisadores se concretizaram e pouco (ou nada) foi feito de forma antecipada e preventiva para que seus efeitos fossem amenizados.

O que se vê agora, no início de uma longa fase de reconstrução iniciada dois meses após o maior desastre climático da história do Estado, é uma corrida de figuras e órgãos públicos para ouvir especialistas e incluí-los em espaços de tomada de decisão. Um movimento que se estende também à população, a qual passou a fazer uso das informações publicadas pelos canais oficiais de universidades, institutos de pesquisa e órgãos do poder público.

A ciência baseia-se em métodos objetivos e bem definidos para produzir conhecimento, para formular teorias, previsões e leis baseadas na observação de fatos. Um processo que requer tempo, pessoas e altos investimentos públicos. Atualmente, estima-se que mais de 95% da produção científica no Brasil venha das universidades públicas, entre as quais a UFRGS se destaca.

Dito isso, é urgente que o reconhecimento à ciência como um espaço sério e competente na construção de sociedades mais resilientes à nova ordem climática não seja apenas uma moda passageira ou oportunismo. Não basta chamar especialistas em momentos de emergência, é preciso dar a eles sustentação por meio de políticas de investimento robustas para um trabalho de longo prazo.

Na UFRGS, um dos espaços que busca se reestruturar para o desenvolvimento de um trabalho em rede, de forma consistente e articulada, reunindo saberes multidisciplinares em torno de propostas concretas para a construção de uma cultura de prevenção, é o Centro Universitário de Estudos e Pesquisas sobre Desastres do Rio Grande do Sul (Ceped RS).

Criado no ano de 2011, a partir de um termo de cooperação técnica entre UFRGS, Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil e Coordenação Estadual de Proteção e Defesa Civil, o Centro Universitário de Estudos e Pesquisas sobre Desastres do Rio Grande do Sul (Ceped RS) tem atuado e colaborado, ao longo de sua história, em projetos para a redução dos riscos de desastres em território gaúcho.

O Ceped RS tem como missão desenvolver programas de ensino, pesquisa, desenvolvimento tecnológico, extensão e serviços, visando prevenção, mitigação, preparação, resposta e reconstrução de cenários. Articula redes de convivência e colaboração internas e externas à Universidade, cercando-se do que há de mais inovador e realístico em termos de conhecimento acadêmico-profissional, conectando agentes de diferentes setores no que diz respeito ao financiamento e estabelecimento de acordos de cooperação e intercâmbio.

Atualmente, o Ceped RS conta com 226 pesquisadores cadastrados de diferentes áreas do conhecimento. Em um evento realizado em junho de 2024, parte desses pesquisadores discutiu princípios norteadores do Centro e eixos prioritários de atuação. Foi latente a premissa de que estudos e pesquisas sobre desastres precisam se construir de forma interdisciplinar, agregando múltiplos olhares e perspectivas, servindo de base para a construção de políticas públicas.

A produção de ciência que vise comunidades mais resilientes aos riscos da nova ordem climática requer das universidades também um novo olhar sobre as suas estruturas e os seus processos. Tornar o diálogo e a interação com diferentes representantes de órgãos públicos, privados e da sociedade civil organizada mais ágil é também um desafio que precisa ser enfrentado.

De forma geral, espera-se que centros como o Ceped RS e especialistas sejam efetivamente valorizados em longo prazo, tanto na ocupação de espaços quanto no investimento para a produção de conhecimento. A sociedade precisa valorizar mais a ciência e a universidade; esta, por sua vez, necessita se articular para oferecer as respostas qualificadas que dela são esperadas.


Ana Karin Nunes é professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e pesquisadora do Ceped RS.
Semanalmente, integrantes do Centro de Estudos e Pesquisas em Desastres (Ceped RS), órgão vinculado à UFRGS, escrevem sobre a cultura de prevenção a desastres para a seção Cidades.

Compartilhe:

Share on whatsapp
Share on twitter
Share on facebook
Share on email
Share on linkedin
Share on telegram
Share on google
Language »
Fonte
Contraste