A educação midiática precisa ser socioemocional 

Publicado originalmente em Instituto Palavra Aberta. Para acessar, clique aqui.

*Mariana Mandelli é coordenadora de comunicação do Instituto Palavra Aberta
*Bruno Ferreira é assessor pedagógico do Instituto Palavra Aberta 

Mais da metade dos professores e professoras do Brasil já tiveram de dar algum tipo de suporte a estudantes que vivenciaram situações sensíveis relacionadas ao uso de tecnologias e redes sociais. De acordo com a nova pesquisa TIC Educação 2022, divulgada nesta semana pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), a taxa atual chegou a 61%, um aumento de 12 pontos percentuais em relação ao ano anterior. 

O dado se refere a docentes que atuam no ensino fundamental e médio. Entre as situações descritas pela pesquisa, estão: uso excessivo de jogos online (46%); cyberbullying (34%); discriminação (30%); vazamento de imagens sem consentimento (26%) e assédio (20%). Todas apresentaram tendência de crescimento entre 2021 e 2022.

Com outros indicadores mostrando que o acesso a celulares e computadores está cada vez maior entre os mais jovens, é possível que esses índices aumentem ainda mais nos próximos anos, configurando um quadro que assusta muitas equipes pedagógicas, que não se sentem preparadas para lidar com os riscos que adolescentes enfrentam nas mídias sociais.

Ao passo que medidas protetivas avançam muitas vezes na direção do proibicionismo, como a decisão de algumas redes de ensino de abolir o celular do ambiente escolar, é preciso reconhecer que a realidade concreta é diferente do que as regras preconizam. Dessa forma, admitir a necessidade de abordar o uso nocivo das redes sociais sem tabu, na sala de aula, é algo fundamental.

Se antes o bullying e outras violências aconteciam dentro das escolas, com algum controle dos educadores, ainda que qualquer situação de violência represente um desafio para a gestão de docentes, diretores e coordenadores, hoje as agressões ultrapassam o período e o ambiente escolares, revitimizando crianças e jovens o tempo todo, sem descanso, por meio de mensagens, memes e outros tipos de publicação.

Muitos não têm ideia do alcance que a foto de um colega em uma situação vexatória pode ter. Também não sabem o que implica criar uma figurinha no WhatsApp com a imagem de um amigo ou docente. E desconhecem o potencial tóxico e violento de se envolver em desafios disseminados nas redes, como ocorreu nesta semana no Colégio Pedro II, no Rio de Janeiro, onde alunos deram um tapa em uma professora de inglês.

Por isso, situações como essas, de assédio e de outras formas de violência simbólica ou física que acontecem nas mídias sociais, podem ser pontos de partida importantes para balizar a necessária reflexão, junto a crianças e adolescentes, sobre a relação entre emoções e uso impulsivo dos recursos digitais para ofender, debochar e destilar ódio.

Mas debater situações de violência, ainda que estas ocorram em âmbito digital, não é o mesmo que propor a discussão sobre qualquer outro tipo de tópico curricular. Estamos diante de questões subjetivas e dolorosas que exigem cuidado para que estudantes não se sintam agredidos, uma segunda vez, quando se veem diante de uma proposta pedagógica que, ainda que bem intencionada, leve o jovem a reviver a dor da exposição e do vexame.

Nesses casos, é importante saber acolher e encaminhar dores e subjetividades para além da proposta racional de refletir sobre uma questão que afeta uma categoria etária inteira, sem deixar de lado o envolvimento das famílias nesse processo, pois essa é uma tarefa coletiva.

É fundamental, portanto, conciliar o propósito de educar para o uso ético das redes sociais e o cuidado com a emoção de crianças e jovens envolvidos com práticas de cyberbullying para que a proposta pedagógica resulte em não apenas estudantes mais críticos e éticos, mas sobretudo empáticos e acolhedores, dentro e fora da internet.

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