Capes definiu três novos procedimentos de avaliação que poderão ser combinados de acordo com o que cada área do conhecimento definir
Sarah Schmidt, da Revista Pesquisa FAPESP
O Qualis-periódicos, sistema de classificação de revistas científicas criado nos anos 2000 pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), não será mais usado para avaliar a produção de estudantes e de docentes dos programas de pós-graduação do Brasil no quadriênio de 2025 a 2028, a ser concluída em 2029. “É uma mudança conceitual. A avaliação passa a se concentrar na qualidade e na classificação do artigo e não somente no desempenho bibliométrico da revista científica em que ele foi publicado”, explica o diretor de Avaliação da Capes, Antonio Gomes de Souza Filho.
A notícia tem circulado em grupos de pesquisadores na internet e gerado dúvidas sobre seu funcionamento. A proposta, aprovada no início de outubro pelo Conselho Técnico-Científico da Educação Superior da instituição, prevê três novos procedimentos de classificação de artigos, que poderão ser combinados, a depender do que definirem os representantes de cada área do conhecimento da Capes.
No primeiro, ainda serão levados em conta os indicadores bibliométricos da revista em que o artigo é publicado, como suas citações. Segundo ele, a principal mudança nesse procedimento é que a classificação recairá sobre os artigos e não mais sobre as revistas, mas eles ainda receberão uma avaliação com base no desempenho do periódico em que foram publicados. “Alguns preceitos do Qualis continuam, mas não teremos mais aquela lista de periódicos”, diz Souza Filho.
No segundo e no terceiro procedimentos de classificação é que de fato se abrem possibilidades para a observação de parâmetros individuais dos artigos científicos. No segundo deles, será possível combinar elementos quantitativos do artigo, como índices de citação e indicadores alternativos, ou “altimétricos”, como menções em sites e redes sociais e número de downloads, com critérios qualitativos do periódico em que ele foi publicado, valorizando, por exemplo, revistas de acesso aberto de boa qualidade ou de relevância nacional, como as indexadas na coleção SciELO.
Já o terceiro procedimento tem foco não em métricas, mas na avaliação qualitativa de cada artigo, observando, por exemplo, sua contribuição científica e impacto teórico. “Com a ampliação de procedimentos, essa nova metodologia permite avaliar de forma mais precisa diferentes artigos publicados em uma mesma revista”, pondera Souza Filho. “Em vez de atribuir a eles uma mesma classificação baseada no impacto do periódico, é possível identificar contribuições específicas que cada um deles promoveu. Vemos isso como um avanço importante”, complementa. De acordo com o diretor, nos procedimentos 1 e 2, os artigos serão classificados em oito níveis. No procedimento 3, eles receberão conceitos em uma escala de muito bom, bom, regular, fraco e insuficiente.
Alguns questionamentos têm surgido por parte da comunidade acadêmica, como o receio de que as metodologias de classificação que têm o artigo como foco prejudiquem o desempenho de papers recentes, que ainda não tiveram tempo de receber muitas citações. “Essa é uma preocupação que vale de forma mais forte para os artigos do último ano do período de avaliação, e é por isso que há os outros procedimentos”, diz Souza Filho.
Na análise do editor de periódicos na área de odontologia Sigmar de Mello Rode, presidente da Associação Brasileira de Editores Científicos (Abec-Brasil), incluir novas possibilidades de classificação dos artigos pode favorecer as publicações nacionais. Isso porque, no sistema atual, muitos pesquisadores procuram publicar seus papers mais relevantes em revistas internacionais de grande prestígio, muitas vezes de editoras comerciais, que têm uma média de citações maior e, portanto, estão mais bem avaliadas pelo Qualis.
“Se o artigo for bom, ele será citado, com menor importância sobre em qual revista ele foi publicado”, avalia Rode, pesquisador da Universidade Estadual Paulista (Unesp). Ele sugere que as publicações de referência do Brasil poderão passar a ser mais atraentes para os pesquisadores do país, por não cobrar ou oferecer taxas de publicação menores do que boas revistas do exterior E ganharão mais prestígio à medida que receberem trabalhos de impacto de pesquisadores brasileiros, criando um círculo virtuoso. “Com artigos de impacto sendo publicados, essas revistas passariam a ser mais bem avaliadas e visualizadas. Com isso, podemos valorizar nossos periódicos, muito importantes para a divulgação da ciência brasileira”, vislumbra.
Outras implicações, em sua visão, também podem ocorrer: os editores científicos podem vir a ter mais trabalho para selecionar manuscritos, caso a demanda por publicação nessas revistas nacionais aumente. Provavelmente, os responsáveis pelas revistas precisarão fazer um trabalho maior de divulgação dos artigos publicados, seja na imprensa ou em redes sociais, para que seus indicadores altimétricos melhorem. “Sempre fui crítico do Qualis, porque esse sistema prejudicava as revistas científicas do Brasil. Agora, nossos periódicos de qualidade poderão ter a visibilidade que merecem por receberem pesquisas relevantes que temos publicado em periódicos de fora do Brasil”, diz Rode.
Os documentos orientadores, com o detalhamento de cada procedimento, devem ser publicados pela Capes em março de 2025.
Este texto foi originalmente publicado por Pesquisa FAPESP de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original aqui.