G20: Brasil dá passo importante para inclusão digital e combate à desinformação 

Publicado originalmente em ObjETHOS. Para acessar, clique aqui.

Tânia Giusti
Mestra em Jornalismo pelo PPGJOR/UFSC e pesquisadora do objETHOS

O protagonismo do Brasil na construção de uma economia digital inclusiva e saudável foi evidenciado na última semana, com a divulgação final da Declaração Ministerial sobre Economia Digital pelo G20. A educação midiática foi listada como um dos principais eixos para combater a desinformação. O documento, disponível em inglês, foi divulgado no dia 13 de setembro, pelo Grupo de Trabalho de Economia Digital (DEWG, na sigla em inglês). O fórum de cooperação econômica internacional vem sendo liderado pelo Brasil desde novembro de 2023, reunindo as 19 principais economias do mundo, a União Europeia e a União Africana. 

G20 atua na definição e no reforço da arquitetura e da governança global sobre as principais questões econômicas do planeta. O documento traz cinco eixos de possíveis abordagens para que os governos fortaleçam a integridade informacional, mencionando a atualização da governança digital, inclusive com medidas regulatórias, conforme divulgado pela Rede Nacional de Combate à Desinformação. As diretrizes que compõem o documento têm como objetivo orientar a formulação de políticas públicas e investimentos em todos países que fazem parte do Grupo, e estabelece um marco ao conectar os debates sobre alfabetização digital, IA e integridade da informação.

A menção à Educação Midiática vai ao encontro de outros esforços realizados no país por instituições da sociedade civil, e também pelo Governo Federal. 

“Queremos a promoção de um ecossistema informacional diverso: com sustentabilidade do jornalismo, com fortalecimento das mídias públicas, um conjunto de ações. Temos que pensar em Educação Midiática, na capacidade das escolas ensinarem e trazerem aos estudantes a prática de comunicação, assim como aprendemos português, matemática, física e química. O objetivo é promover uma Educação Midiática que capacite os cidadãos a acessar, analisar e disseminar informações de forma crítica. A declaração incentiva o investimento nesta área como ferramenta para enfrentar os impactos negativos da desinformação, além de propor uma governança digital mais robusta, com regulamentações específicas”, afirmou João Brant, Secretário de Políticas Digitais da Secretaria de Comunicação SECOM, da Presidência da República. Esta é a primeira declaração multilateral de grande amplitude sobre desinformação. A declaração dos ministros pode servir de base para o comunicado final da cúpula dos chefes de Estado do G20, prevista para acontecer em novembro, no Rio de Janeiro. 

Inclusão Digital

A integração de milhares de brasileiros à economia global só será possível se olharmos também para as esferas sociais e meios de acessar internet e dispositivos. Na reunião da cúpula, o Brasil destacou que esse é um dos caminhos para melhorar a inclusão no país, diminuindo as desigualdades sociais e promovendo o crescimento econômico na América Latina.

Segundo dados da pesquisa “Conectividade Significativa: propostas para medição e o retrato da população no Brasil“,  feita pelo Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), embora o país caminhe para a universalização do acesso à Internet, com 84% de seus habitantes, de 10 anos ou mais, usuários da rede, somente 22% dos brasileiros a partir dessa idade têm condições satisfatórias de conectividade.

“A realidade de um jovem que mora na periferia e não tem qualidade de conexão é muito distinta da de um jovem da mesma idade que tem melhores condições. Essas diferenças potencializam desigualdades já existentes”, alertou Graziela Castello, coordenadora de estudos setoriais no Cetic.br e responsável pelo levantamento.

Estão em curso políticas em execução no país para mitigar esse problema, como a Estratégia Nacional das Escolas Conectadas, que  tem como uma de suas principais metas conectar todas as 138 mil escolas públicas até 2026. 

“A economia digital hoje cresce a um ritmo mais acelerado que a economia como um todo[…] Nós acordamos que, com base em indicadores e métricas, nosso país formule novas políticas públicas para onde existem deficiências, assegurando a conectividade digital e universal”, enfatizou o coordenador-geral de Políticas Públicas para Serviços de Telecomunicações do Ministério das Comunicações, Daniel Cavalcanti. “Além de uma internet de qualidade, queremos que as pessoas tenham dispositivos para acessar, com custo acessível, e por fim, que tenham habilidades digitais para explorar o potencial para educação, trabalho, lazer, todas as dimensões”, completou.

Em que etapa da caminhada estamos?

Os avanços realizados pelo G20 devem, sim, ser comemorados, mas há muito a ser percorrido. O avanço do Governo nos últimos dois anos com a temática da educação midiática, se somam aos esforços já existentes e realizados por entidades da sociedade civil, academia e organizações. 

O Instituto Palavra Aberta, por exemplo, realiza diversos treinamentos e capacitação desde 2019, oferecendo gratuitamente formação em Educação Midiática para professores e profissionais de todo o Brasil. O público-alvo prioritário são professores e educadores do Ensino Fundamental, para que propaguem a educação midiática como o conjunto de habilidades para acessar, analisar, criar e participar de maneira crítica do ambiente informacional e midiático em todos os seus formatos – dos impressos aos digitais (https://educamidia.org.br/). A Certificação de Multiplicadores EducaMidia é gratuita e, como aluna, posso garantir que é de excelência. 

O Instituto também foi uma das entidades parceiras, junto à Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, na organização da Primeira Semana de Educação Midiática, em 2023, quando ocorreu o lançamento da Estratégia Brasileira de Educação Midiática, documento elaborado pela Secretaria de Políticas Digitais/Secretaria de Comunicação Social em parceria com a UNESCO. Membros do Departamento de Educação Midiática do Governo Federal realizaram, este ano, missões em países nórdicos que já adotam desde o pré-escolar estratégias de letramento midiático, para formalizar parcerias e conhecer práticas de excelência. 

O Departamento de Educação Midiática tem como objetivo, ainda, formar 300 mil profissionais da educação e 400 mil profissionais da saúde em educação midiática, conforme previsto no Plano Plurianual 2024-2027. Além das parcerias com as agentes comunitárias de saúde, para combater, sobretudo a desinformação sobre vacinas, os estudantes das escolas públicas participarão também da primeira edição da Olimpíada Brasileira de Educação Midiática, que acontecerá em parceria com instituições de ensino superior e com o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. O evento deve mobilizar 400 mil estudantes de todo o país. As datas ainda não foram divulgadas. 

Além disso, o objETHOS também tem um projeto de Extensão nas Escolas, e já desenvolveu atividades de educação midiática em escolas públicas da Grande Florianópolis por meio do Grupo de Educação para a Mídia, que tem como atividade fim levar o conhecimento sobre o papel da mídia na sociedade, gerado a partir das reflexões dos pesquisadores do objETHOS.

Construção coletiva

O Brasil tem se destacado por suas políticas inclusivas e inovadoras no combate à desinformação, reforçando seu compromisso com uma governança digital mais transparente e acessível. Ver nosso país assumir um lugar de destaque nessas temáticas representa uma onda de esperança e de, sim, muito trabalho pela frente, sobretudo depois de uma infodemia e de quatro anos de obscurantismo com o Governo Bolsonaro – que diversas vezes praticou a desinformação.

A nossa vigilância deve continuar, pois ainda há outros desafios, como a aprovação de um projeto que regule as plataformas digitais, depois do arquivamento do PL 2630/20 (PL das fake news), que segue parado na Câmara dos Deputados, e que foi alvo de forte pressão das gigantes de tecnologia desde a sua concepção. 

O combate à desinformação faz parte do nosso papel acadêmico e jornalístico, mas acima de tudo como cidadãos. Cumprir essa jornada nos espaços que ocupamos é fundamental para a construção de uma sociedade mais informada e crítica.

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