ONU não pediu que governos ‘forcem’ religiões a aceitar ‘agenda LGBT+’

Publicado originalmente em Agência Lupa por Evelyn Fagundes. Para acessar, clique aqui.

Circulam nas redes sociais publicações afirmando que, por meio de um relatório, a Organização das Nações Unidas (ONU) pediu para que governos ‘forcem’ todas as religiões a aceitarem a agenda LGBT+. As afirmações são falsas.

Por meio do ?projeto de verificação de notícias?, usuários do Instagram solicitaram que esse material fosse analisado. Confira a seguir o trabalho de verificação da Lupa?:

RELATÓRIO DA ONU PEDE A GOVERNOS QUE FORCEM RELIGIÕES A ACEITAR AGENDA LGBT

– Legenda da publicação que circula nas redes sociais

Falso

As publicações desinformativas fazem referência ao relatório publicado em junho deste ano pelo site da ONU cuja autoria é do pesquisador independente Victor Madrigal-Borloz. Nesse documento, o autor traz, a partir de um levantamento feito em diversos países, dados sobre discriminação contra pessoas LGBTQIA+. No entanto, não existe qualquer pedido ou argumentação para que governos “forcem religiões a aceitarem a agenda LGBT+”, como sugere o post desinformativo. 

Madrigal é especialista em estudos sobre violências motivadas pela orientação sexual e identidade de gênero. Em seu artigo “Liberdade de religião ou crença e liberdade de violência e discriminação com base na orientação sexual e identidade de gênero” (em tradução livre), ele analisa as relações entre liberdade religiosa e manifestações contra a comunidade LGBTQIA+ com base em casos de discriminação que ocorreram em diversos países que visitou. 

No texto o pesquisador levanta dados e informações para embasar o histórico de violências e discriminações. De acordo com Madrigal, “no total, 67 Estados Membros das Nações Unidas criminalizam atos sexuais consensuais entre adultos do mesmo sexo” (página 9). 

Ele traz o exemplo que ocorreu em 2021, quando o Quênia proibiu o filme “I Am Samuel”, que retratava o amor romântico entre homens. “O governo rotulou isso de ‘uma afronta à nossa cultura e identidade’ e ‘diminuindo o cristianismo’” (página 10). “Durante sua visita à Ucrânia, o especialista independente soube que os líderes religiosos exigiram a proibição da ‘propaganda homossexual’ sob a bandeira de ‘proteger a família tradicional’”, diz outro trecho do relatório (página 7). 

Com base nesses e em diversos outros pontos expostos no relatório, no final do texto o especialista faz uma série de sugestões para os países. Dentre elas estão: “Criar um ambiente seguro no qual todas as pessoas que manifestam sua religião ou crença, incluindo LGBT+ e outras pessoas de gêneros diversos, estejam livres do medo de violência e discriminação e estejam cientes da distinção entre discurso protegido e discurso de ódio” e “incentivar as instituições religiosas a considerar abordagens inclusivas que facilitem a participação e o reconhecimento de LGBT+ e outras pessoas com diversidade de gênero” (página 20). 

O especialista explica que recebeu muitas contribuições levantando preocupações sobre líderes religiosos ou de crenças que alimentam desinformação, discurso de ódio e intolerância contra pessoas LGBT+. Madrigal-Borloz afirmou que “abraçar a espiritualidade e a fé” é um caminho que deve estar disponível para todos, incluindo todas as pessoas com orientações sexuais e identidades de gênero diversas. “Ser humano muitas vezes busca um sentido de propósito em suas vidas. Para uma proporção muito grande da humanidade, a espiritualidade é uma parte fundamental dessa busca”, disse o especialista da ONU. “O direito à liberdade de religião ou crença é um escudo para proteger a manifestação legítima de convicções pessoais, bem como para proteger o direito de não fazer parte de uma determinada crença ou ser sujeito a violações de direitos humanos alegadamente justificadas por ela.”

Desde o início do relatório, o texto expõe que “o perito independente está comprometido com o respeito pela liberdade de religião e crença. Notavelmente, a resolução que criou o mandato reconhece a importância de respeitar os sistemas de valores religiosos” (página 2). Não há qualquer determinação ou pedido obrigatório para que os governos forcem as religiões a aceitarem a agenda LGBTQIA+. Na realidade, o pesquisador apenas oferece a sugestão para que os países passem a incentivar as instituições religiosas a considerar abordagens inclusivas para promover a participação da comunidade LGBTQIA+ nas práticas referentes às suas crenças.

Checagem similar foi produzida pelo coletivo Bereia.

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