Publicado originalmente em ObjETHOS. Para acessar, clique aqui.
Jéferson Silveira Dantas
Doutor em Educação pela UFSC e pesquisador associado do objETHOS
Os editoriais dos grupos empresariais jornalísticos ou da mídia hegemônica burguesa continuam trazendo à baila pautas que favorecem angulagens associadas a grupos de extrema-direita. Ou, em outras palavras, tem-se a impressão de que continuamos vivendo os dolorosos e trágicos quatro anos de um governo neofascista marcado pela necropolítica, desmandos, corrupção e desinformação em larga escala! O tema doimpeachment de Dilma Rousseff em 2016, por exemplo, foi um caso exemplar. Os editoriais dos jornais O Estado de S. Paulo e a Folha de S.Paulo cobriram o tema muito antes de qualquer mobilização popular ou institucional. A defesa do impeachment parecia ser a única solução para aquela conjuntura, respaldada pelas ‘jornadas de junho de 2013’, manifestações estas que foram ganhando um teor extremamente conservador/autoritário e o apoio irrestrito da mídia hegemônica. É como se Dilma Rousseff tivesse iniciado o seu segundo mandato com a espada do impeachment em seu pescoço.
Atualmente, os editoriais dos mesmos jornais acima citados têm promovido um falso debate no sentido de criminalizar movimentos sociais, como é o caso do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra), colocando em xeque, via de regra, os direitos da classe trabalhadora e matizando, sempre que possível, qualquer fala ou discurso de deputados/as e senadores/as vinculados/as a determinadas agremiações partidárias apoiadoras do neofascismo que, em nosso país, foi e é representado pelo bolsonarismo ou, de maneira mais precisa, representado pela extrema-direita. Aliás, temos no Brasil um congresso nacional mascavado, fisiológico, achacador, com frações de classe comprometidas até os ossos com a destruição ambiental, mercantilização de armas para a população e alienação em larga escala via bancada evangélica vinculada à teologia da prosperidade. A alta classe média, setores da classe média e o lumpesinato, continuam sustentando os pressupostos da extrema-direita, algo extremamente grave, pois isso mantém na crista da onda midiática as pautas dos/as que foram agraciados/as ou privilegiados/as pelo bolsonarismo. O que de fato deveria estar em pauta neste momento, de forma incansável, sem tréguas, são os inúmeros crimes cometidos pelo governo Bolsonaro.
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Tal inércia deliberada da mídia hegemônica fragiliza, sobremaneira, a interpretação histórica, ou seja, o passado obscuro, autoritário e violento do país sequer é questionado, implicando pautas jornalísticas anistóricas e anódinas, não problematizando a contento as grandes questões nacionais, tais como a pobreza e a desigualdade social, fome, concentração de renda, perda dos direitos trabalhistas, pauperização da formação humana na Educação Básica, especialmente no Ensino Médio, e a desqualificação do ofício do/a jornalista investigativo/a.
A miséria jornalística praticada pela mídia hegemônica é notória. Falta apuro e um maior entendimento sobre a formação histórica do país, marcada pelo patriarcalismo colonial, destruição (genocídio) dos povos originários, racismo estrutural/institucional, sexismo, desconsideração da luta de classes, etc. Opinólogos de plantão invadem os impressos de jornal, telas de tevê e redes sociais, sem qualquer constrangimento sobre suas ‘práticas discursivas’, sintomas de um tempo marcado pela ‘pós-verdade’ e o verniz teórico da pós-modernidade. A ausência de fundamentação teórica nos editoriais da mídia hegemônica e, por extensão, de seus articulistas, rebaixa o jornalismo tupiniquim a um nível de grande inópia, afastando leitores/as que ainda buscam certa ‘honestidade liberal’ destes grupos empresariais jornalísticos.
A permanência da pauta da extrema-direita sob o prisma/escopo da mídia hegemônica burguesa nos primeiros seis meses do terceiro mandato de Lula da Silva não deveria nos surpreender. Qualquer possibilidade de se colocar em risco os interesses do grande capital e, por conseguinte, da autocracia burguesa nacional já é motivo suficiente para abalar as convicções ultraneoliberais dos faria limers. O neofascismo nacional está bastante vívido e não seria exagero considerarmos que novos ‘golpes brancos’ podem ocorrer no país sempre que o grande capital perder a sua capacidade de lucro ou de extração da mais-valia. A organização da classe trabalhadora, onde se enfeixa a classe dos/as jornalistas, tem um sentido de urgência no Brasil. Assim como as pautas jornalísticas deveriam se desvencilhar do ranço neofascista, o direito à informação de qualidade deveria estar à disposição de qualquer cidadão/cidadã brasileiro/a. Mas, não é o que acontece. O flerte ou o gozo da mídia hegemônica com a extrema-direita podem desembocar numa nefasta sucessão de relatos descontextualizados, imprecisões e uma audiência cativa para o neofascismo. Essa questão se mostra na atualidade como objeto de estudo, exigindo um enfrentamento rigoroso de quem pratica o jornalismo investigativo, sabedor da importância de se combater a inércia proposital da mídia hegemônica!