São Paulo é classificado como o único estado brasileiro a manter proibição de cultos e missas presenciais

Publicado originalmente em Coletivo Bereia por Jemima Bispo e Marcos André Lessa. Para acessar, clique aqui.

O site Gospel Prime noticiou, em 15 de abril, que o estado de São Paulo era o único do país a manter as proibições a celebrações religiosas presenciais após a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) permitindo aos estados tal medida, em resposta ao questionamento do Partido Social Democrático (PSD) sobre o decreto paulista.

Segundo a publicação, o governador João Doria (PSDB) teria mantido a proibição dos cultos presenciais, acatando recomendação do Ministério Público local, o que, na prática, representaria um “cerceamento à liberdade religiosa”. 

Na sequência, o conteúdo de Gospel Prime traz o suposto contexto em outros estados. “A situação em outros estados tem suas particularidades, mas em nenhum deles há a proibição aos fiéis de se reunirem nos templos para cultuarem a Deus. Até o último domingo, o Ceará era o único que mantinha proibição parecida, mas o governador Camilo Santana (PT) anunciou em 10 de abril que as igrejas poderão ser reabertas gradualmente, inicialmente com 10% da capacidade de lotação”, diz a matéria.

Por que os cultos foram liberados no Ceará?

Em 04 de abril, missas e cultos foram liberados para funcionar de forma presencial no Ceará, conforme o decreto de isolamento social rígido, prorrogado até 11 de abril, por decisão do governador Camilo Santana (PT). Tal decisão foi justificada mediante determinação do STF, em caráter provisório, de que estados, municípios e o Distrito Federal não poderiam editar normas de combate à pandemia que  proibissem integralmente celebrações religiosas presenciais. Contudo, mesmo com o decreto, a recomendação às instituições religiosas era para que continuassem procedendo com as liturgias de forma on-line. 

Sobre a decisão do STF e o contexto paulistano

Em 04 de abril, o ministro do STF Kassio Nunes Marques, liberou missas e cultos religiosos em todo o Brasil, derrubando decretos de governadores e prefeitos que haviam vetado a reunião de fiéis como forma de minimizar a contaminação por covid-19. A iniciativa foi mobilizada a partir de uma ação da Associação Nacional de Juristas Evangélicos (Anajure).

Em nota, a associação defendeu que “no que diz respeito ao funcionamento das igrejas durante a pandemia, ressaltamos o entendimento sustentado pela ANAJURE em outras ocasiões, no sentido da importância da adoção de uma postura colaborativa por parte das instituições eclesiásticas, modo como muitas têm procedido. Ao longo de todo o período, diversas igrejas têm contribuído através do fornecimento de cestas básicas, itens de higiene, roupas e, em alguns casos, até mesmo na aquisição e envio de cilindros de oxigênio a regiões que sofreram com o esgotamento de seus estoques. Além disso, frisamos que, naqueles locais onde se observa um quadro de saúde pública mais delicado, a postura colaborativa a ser adotada pelas igrejas seja a suspensão temporária de suas atividades coletivas presenciais, até que haja uma melhora no quadro de ocupação das UTIs e seja possível, então, uma retomada gradual”.

Já no dia 05, foi a vez do STF, de forma liminar, voltar a proibir as missas e cultos, contudo, apenas no estado de São Paulo. A decisão foi tomada pelo ministro Gilmar Mendes, a partir de ações do Conselho Nacional de Pastores do Brasil e do PSD (Partido Social Democrático) movidas contra o decreto do governador João Doria (PSDB).

Mediante as divergências, um julgamento foi marcado para 08 de abril com o objetivo de acabar com o conflito, por meio do posicionamento dos 11 ministros do tribunal sobre o tema. Na ocasião, por nove votos a dois, o STF decidiu que estados e municípios podem impor restrições a celebrações religiosas presenciais, como cultos e missas, em templos e igrejas durante a pandemia de covid-19.

Bereia entrou em contato com o pesquisador em Religião e Política João Luiz Moura, que é coordenador de projetos no Instituto Vladimir Herzog e pesquisador visitante no Instituto de Estudos da Religião (ISER), para indagar se o que está ocorrendo por meio das decisões do STF poderia ser caracterizado como perseguição religiosa.

“Quanto ao questionamento via Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 811, ingressada pelo PSD, como a própria corte julgou, trata-se de matéria constitucional. O decreto do governo de SP, objeto da ADPF em referência, não restringia apenas igrejas, caso contrário poderia caracterizar “perseguição religiosa”. O decreto restringia reuniões diversas, entre elas, cultos e missas. Além disso, não se trata de suspensão de liberdades, o decreto tinha início e término, cuja finalidade era somar esforços na contenção do contágio. Portanto, constitucional”, explicou Moura.

A cronologia das informações

Um detalhe importante: a matéria do portal R7, de 12 de abril, na qual o texto do Gospel Prime se baseia, apresenta um quadro mais completo, comparando com outros estados da federação (embora não dê voz a lados religiosos favoráveis à proibição, como o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil, entre outros) . 

Já a entrevista coletiva do governo de São Paulo anunciando a abertura gradual dos templos a partir de 18 de abril foi realizada em 16 de abril . No entanto,a matéria do Gospel Prime, publicada no dia anterior, 15 de abril, não foi atualizada com essas informações, continuando a circular com o mesmo texto, reproduzida em mídias digitais religiosas, mesmo depois da coletiva.

Com base na verificação, Bereia classifica a matéria de Gospel Prime como enganosa. De fato, São Paulo, até 17 de abril, chegou a ser o único estado da federação a manter proibição de celebrações religiosas presenciais. Porém, além de não dar voz a outros lados sobre a questão, a matéria do site não foi atualizada com as informações mais recentes sobre a mudança nas medidas municipais Com isso, o site de notícias religiosas induz seus leitores à desinformação por meio de texto enganoso, fazendo-os pensar que as medidas são “extremistas” (palavra usada na matéria) e de perseguição às igrejas.

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Foto de Capa: Pixabay/Reprodução

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Referências

Gospel Prime, https://noticias.gospelmais.com.br/sao-paulo-unico-estado-proibir-cultos-145762.html?utm_source=feedburner&utm_medium=email&utm_campaign=Feed%3A+gospelmais+%28Gospel%2B+%7C+Not%C3%ADcias%29 Acesso em: [19 abr 2021]

Agência Brasil, https://agenciabrasil.ebc.com.br/justica/noticia/2021-04/stf-decide-que-estados-e-municipios-podem-proibir-cultos-na-pandemia Acesso em: [19 abr 2021]

Agora, https://agora.folha.uol.com.br/sao-paulo/2021/04/comercio-volta-a-abrir-as-portas-em-sp-veja-regras-e-datas-para-todos-os-setores.shtml Acesso em: [19 abr 2021]

Coletiva de imprensa do Governo do Estado de São Paulo, https://youtu.be/FKBaQ-XY3Xc?t=495 Acesso em: [19 abr 2021]

Diário Oficial do Estado de São Paulo, http://dobuscadireta.imprensaoficial.com.br/default.aspx?DataPublicacao=20210312&Caderno=DOE-I&NumeroPagina=1 Acesso em: [19 abr 2021]

Supremo Tribunal Federal, http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=462908&ori=1 Acesso em: [19 abr 2021]

Associação Nacional de Juristas Evangélicos, https://anajure.org.br/nota-sobre-o-julgamento-da-adpf-811-relativa-a-suspensao-das-atividades-religiosas-presenciais/ Acesso em: [22 abr 2021]

BBC, https://www.bbc.com/portuguese/brasil-56644637 Acesso em: [22 abr 2021]

G1, https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2021/04/02/feriado-de-pascoa-celebracoes-religiosas-presenciais-seguem-proibidas-em-sp-ate-11-de-abril.ghtml Acesso em: [22 abr 2021]

R7, https://noticias.r7.com/brasil/apenas-sao-paulo-proibe-presenca-de-publico-em-cultos-religiosos-12042021 Acesso em: [23 abr 2021]

CONIC, https://www.conic.org.br/portal/noticias/3808-sobre-celebracoes-presenciais-uma-orientacao-do-conic Acesso em: [26 abr 2021]

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