Racismo estrutural apagou tecnologias africanas da História, mostra estudo de Engenharia Mecânica

Publicado originalmente em Agência Escola UFPR. Para acessar, clique aqui.

Núcleo de pesquisa da UFPR publicou artigo científico que mostra evidências de apropriação do conhecimento tecnológico de negros africanos por colonizadores #AgenciaEscolaUFPR

Por Isabela Stanga
Sob supervisão de Chirlei Kohls

De tecidos a técnicas usadas no plantio da cana-de-açúcar, os povos africanos são autores de tecnologias usadas em todo o mundo, inclusive no Brasil. Entretanto, os negros escravizados, na época das descobertas, não eram vistos como capazes de realizar engenharia — e até hoje sua história é pouco conhecida, já que os trabalhos foram apropriados pelos colonizadores.

Buscando reverter esse cenário, foi criado em 2018 o Núcleo de Pesquisa de Relações Raciais, Ciência e Tecnologia (Nupra), no Setor de Tecnologia da Universidade Federal do Paraná (UFPR), na época coordenado pelo professor Ramón Sigifredo Paredes. A demanda surgiu dos próprios alunos que, ao ingressarem nas engenharias, demonstraram interesse em estudar sobre as questões raciais na área. Uma das pesquisas recentes publicadas pelo grupo é “A população negra africana e da diáspora no desenvolvimento tecnológico”, de autoria do estudante de Engenharia Mecânica Felipe dos Santos Almeida e do professor Harrison Lourenço Corrêa.

Através de um estudo bibliográfico, o estudante demonstra que o racismo estrutural promoveu o apagamento de engenheiros e tecnólogos negros da História. Como exemplo, existem as pirâmides egípcias: há até teorias de que caíram ali já construídas, ou que são originárias de tecnologias extraterrestres, mas, na verdade, são fruto da inteligência do povo africano do Egito.

Conhecimentos e descobertas feitas pelos povos africanos foram apropriadas pelos colonizadores. Foto: Mariza Soares/Museu Nacional

No Brasil, país marcado pelo racismo estrutural e construído através da escravização da população negra, existiram peculiaridades no processo. O artigo mostra que as tecnologias para o plantio da cana-de-açúcar e também para a mineração, atividades determinantes no período colonial brasileiro, já eram desenvolvidas pelos povos africanos em seu continente. Aqui, eles aprimoraram a técnica, que foi creditada aos europeus colonizadores.

Além disso, de acordo com Felipe, antes da fundição de metais ser utilizada pelo Ocidente, os escravos conseguiam escapar das senzalas usando a técnica, além de forjarem armas para caça e para defesa.

Para o aluno, a pesquisa lhe trouxe uma mistura de sentimentos. “Foi legal pesquisar, porém também é triste descobrir algo que te traz dor. Por mais que seja uma pessoa específica que inventou aquela ferramenta, não vou ter um nome para citar, mesmo que eu queira dar credibilidade a ela”, expõe.

O estudante ainda lembra que, ao ingressar no curso de Engenharia Mecânica, percebeu como o racismo é estrutural no Brasil, por causa das poucas pessoas negras no curso. Assim, quando foi convidado em 2018 para fazer parte do Nupra, aceitou prontamente.

Como explica Harrison Corrêa, professor do Núcleo, a intenção é mais do que pesquisar sobre a presença da população negra nas tecnologias. “O grupo foi criado para dar um sentido de pertencimento a uma parcela de estudantes que ingressaram na UFPR e nos cursos de engenharias e que, de algum modo, sentiam-se um pouco deslocados por razões distintas”, explica.

Atualmente, o Núcleo reúne estudantes de Engenharia e também de Arquitetura e Urbanismo, que realizam conversas semanais sobre suas pesquisas, compartilhando leituras e reflexões sobre a questão racial.

“Enquanto realizava minha pesquisa, parei para pensar: ‘como eu serei lembrado? Quando eu fizer alguma descoberta grande, vai ser a mesma coisa, alguém vai se apropriar dela?”, questiona Felipe.

Foto destaque: Norbert Höldin por Pixabay/DivulgaçãoFacebookTwitterWhatsAppLinkedInMessengerCompartilhar

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