Curadoria e higiene da informação

Publicado originalmente em Instituto Palavra Aberta. Para acessar, clique aqui.

Diz o senso comum que hoje em dia é mais fácil ser bem informado, ou ainda aprender sobre qualquer coisa. Faz sentido, afinal a internet faz com que seja cada vez mais fácil obter informações sobre todo e qualquer assunto. Há conteúdo sobre tudo, vindo das mais variadas fontes. Tomamos conhecimento dos fatos assim que eles acontecem, praticamente em tempo real. Em seguida vêm os desdobramentos: as análises, os debates, diversas narrativas e opiniões. E não para por aí. O ciclo repetitivo de notícias na TV alimenta as redes, que respondem com análises das análises, memes, artigos indicados por conhecidos… e, assim, acabamos nos afogando em informações, exaustos, sem necessariamente estarmos mais informados.

Será que, paradoxalmente, está mais difícil ser bem-informado na sociedade da informação? O fato é que a internet nos apresenta uma combinação desafiadora de oferta abundante de conteúdo por um lado, e, por outro, uma arquitetura que privilegia o consumo rápido e compulsivo de informação. Interagir com o que lemos nas redes – clicar, curtir, mandar um emoji – tem um custo de engajamento baixo, ou seja, não nos demanda muito. Logo passamos para outro conteúdo e assim, de clique em clique, vamos consumindo as coisas de modo veloz e superficial. É um consumo inconsciente, e não reflexivo. Isso não é por acaso, mas faz parte do design das redes e ambientes digitais; quanto mais tempo permanecemos engajados nas plataformas, mais fornecemos pistas que permitem a personalização do conteúdo e ainda mais engajamento. É um ciclo sem fim.

Essa imensa oferta acaba levando a uma compulsão de acumular informação, mas não necessariamente nos ajuda a construir conhecimento de forma sólida, ou mesmo segura – porque é um tipo de engajamento muito raso e acrítico com todo esse conteúdo. Para aprender, de fato, precisamos nos acostumar a interrogar a informação ao invés de simplesmente consumi-la, que é um tipo bem diferente de leitura.

Isso significa acostumar-se a perguntar: qual é a intenção desta mensagem? Quem está por trás dessa informação? Será que essa fonte é confiável, ou qualificada? Como é que eu sei disso? E será que esse conteúdo é o mais adequado para o que me interessa descobrir ou aprender? Internalizar esse tipo de postura diante das mensagens, é, de fato, a melhor forma de prevenção contra a desinformação.

Cabe também fazer uma curadoria mais criteriosa, indo além dos feeds das redes sociais: buscando seguir não só os veículos de massa e telejornais mas também publicações especializadas, ONGs, colunistas ou especialistas nas redes, pessoas que possam trazer uma perspectiva mais ampla, que possam avançar para além do acontecimento em si. Ou seja, focar na qualidade, e não na quantidade de informações.

Também precisamos aprender a observar quando estamos nos informando de fato, ou quando estamos consumindo as mesmas informações repetidas em looping. Tanto a TV como as redes sociais funcionam em uma lógica comercial, ou seja, precisam da nossa audiência. E o que traz a audiência e o engajamento, no curto prazo, são as histórias mais dramáticas, as que mexem com os nossos medos e emoções. Infelizmente, há uma tendência ao sensacionalismo, à tabloidização, e à repetição dos conteúdos. Se o jornalismo e as mídias são um filtro entre a realidade e a nossa percepção da realidade, nosso conhecimento não cresce, mas a nossa ansiedade dispara.

É preciso perceber que as notícias têm um ciclo. Depois que nos inteiramos de um fato, será que precisamos ficar grudados na TV ou no Twitter acompanhando minuto a minuto? Ou podemos esperar um pouco até que os profissionais treinados para isso possam preparar as informações mais completas, refletindo sobre contexto e desdobramentos?

Nesse quadro complexo, frente a tanta oferta, cabe a nós mesmos aprender a fazer a “higiene da informação”. Isso significa consumir conteúdo de forma deliberada: tomando cuidado com as fontes, observando o tempo e a qualidade de nosso engajamento com a informação, navegando na internet de forma intencional e não reativa, com objetivos precisos. Significa também compartilhar conhecimento preferencialmente dentro das áreas que dominamos, em publicações bem fundamentadas e não inflamatórias, contribuindo com algo de valor para todos e não apenas adicionando mais ruído. No fim, temos sempre que perguntar: O que merece a minha atenção? E com que profundidade?

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