CONFIANÇA NO JORNALISMO E CONSUMO DE NOTÍCIAS

Artigo de Ana Regina Rêgo.

Também disponível em Jornal O Dia e Portal Acesse Piauí

Publicada semana passada, o Digital News Report 2022, elaborado pelo Instituto Reuters em parceria com a Universidade de Oxford apresenta resultados preocupantes quanto ao consumo de notícias, assim como, no que concerne à confiança no jornalismo e nova dieta de mídia dos usuários das redes sociais. Foram ouvidos 93.000 consumidores de notícias online em 46 mercados que cobrem metade da população mundial.

Entre os relatórios de 2021 e 2022 há uma diferença em termos de consumo de notícias. Enquanto em 2021 havia um consumo e uma crescente confiança nas notícias em meio à pandemia da Covid-19, beneficando corporações de notícias tradicionais, inclusive financeiramente, com mais pessoas fazendo assinaturas on-line e anunciantes procurando se associar a um conteúdo confiável. Em 2022,  o cenário se desenha mais pessimista. Por um lado, novas empresas de jornalismo, em todo o mundo relatam números recordes de assinaturas digitais e receitas crescentes, por outro, o relatório destaca que  o interesse em notícias e o consumo geral de informações jornalísticas diminuiu consideravelmente em muitos países, enquanto a confiança caiu em quase todos os lugares – embora permaneça maior do que antes do início da crise do Coronavírus. Há ainda uma sinalização para o cansaço das pessoas com as  notícias relacionadas à COVID-19, como também em torno dos temas políticos e outros temas – com crescente número de pessoas que passaram a evitar as notícias. 

De acordo com o Digital News Report a  confiança nas notícias caiu em quase metade dos países e aumentou em apenas sete, revertendo parcialmente os ganhos obtidos no auge da pandemia de Coronavírus. Em média, cerca de quatro em cada dez da nossa amostra total (42%) dizem que confiam na maioria das notícias na maior parte do tempo. A Finlândia continua sendo o país com os níveis mais altos de confiança geral (69%), enquanto a confiança nas notícias nos EUA caiu mais três pontos percentuais e continua sendo a mais baixa (26%).Vale destacar que de acordo com os resultados da pesquisa em pauta, o consumo de mídia tradicional, como TV e mídia impressa, caiu ainda mais no ano passado em quase todos os mercados (pré-invasão da Ucrânia), com o consumo online e social não preenchendo a lacuna. Enquanto um número considerável de pessoas permanece acessando notícias, outros estão se afastando da mídia de notícias e, em alguns casos, desconectando-se completamente das notícias. O interesse em notícias caiu drasticamente em todos os mercados, de 63% em 2017 para 51% em 2022.

A proporção de consumidores de notícias que dizem evitar notícias, com frequência ou às vezes, aumentou acentuadamente entre os países. Esse tipo de evasão seletiva dobrou no Brasil (54%) e no Reino Unido (46%) nos últimos cinco anos, com muitos entrevistados dizendo que as notícias têm um efeito negativo em seu humor. Uma proporção significativa de pessoas mais jovens e menos instruídas diz evitar notícias porque pode ser difícil de acompanhar ou entender – sugerindo que a mídia de notícias poderia fazer muito mais para simplificar a linguagem e explicar melhor ou contextualizar histórias complexas. 

No caso brasileiro é necessário enfatizar que o índice dos que evitavam as notícias em 2017 era de 27%, em 2019, 34% dos entrevistados pelos pesquisadores envolvidos com o DNR afirmavam evitar as notícias e em 2022, 54% afirmam não acessar e/ou evitar as informações jornalísticas. 

Vale destacar também que embora os Estados Unidos pareçam ter o maior grupo de usuários de notícias desconectados, há números igualmente altos e preocupantes no Japão (15%), Reino Unido (9%), França (8%) e Austrália (8%). Mesmo a Alemanha, um país com hábitos de mídia tradicionais, não está imune. Desde 2013, o consumo semanal de impressos caiu de 63% para 26% e o consumo de notícias de TV de 82% para 65%. Embora as mídias online e sociais tenham crescido um pouco, ultrapassando a televisão pela primeira vez, foram localizados números crescentes que parecem estar se desconectando completamente das notícias – essa proporção chegando a 5% em 2022.

Os pesquisadores apontam ainda, que muito embora tenham sido identificados  altos níveis de desconexão em muitos países, tal fenômeno não é evidente em todos os lugares. A proporção que não consome semanalmente nenhuma das fontes de notícias listadas  na pesquisa é limitada em Portugal (2%) e Finlândia (2%) e extremamente rara na África do Sul (1%), Nigéria (<1%) e Quênia (<1%).

Para os pesquisadores envolvidos com o DNR, a desconexão pode ser um sinal das dificuldades em engajar alguns públicos em um ambiente mais digital. Todavia, há que se considerar outras variáveis intermitentes nesse cenário, como a suspeição levantada ao jornalismo, pelo mercado da desinformação que no Brasil é ativo, pujante e lucrativo.

O hábito cada vez mais comum de evitar o consumo de noticias tem se aprofundado a cada ano. De acordo com o relatório, os que evitam notícias seletivamente dão uma variedade de razões para seu comportamento. Em todos os mercados, muitos entrevistados dizem que se sentem desencorajados pela repetitividade da agenda de notícias – especialmente em torno de política e COVID-19 (43%), ou que muitas vezes se sentem desgastados pelas notícias (29%). Uma proporção significativa diz que evita notícias porque acha que não é confiável (29%). Cerca de um terço (36%), principalmente aqueles com menos de 35 anos, dizem que as notícias desanimam. Outros dizem que a notícia leva a discussões que eles preferem evitar (17%), ou leva a sentimentos de impotência (16%). Uma pequena proporção diz que não tem tempo suficiente para notícias (14%) ou que é muito difícil de entender (8%). 

O Relatório identificou também que a proporção de pessoas que diz estar muito ou extremamente interessada em notícias caiu drasticamente ao longo do tempo nos mercados – uma tendência que se acelerou apesar da contínua pandemia do COVID-19. Em 2022, foi localizado um menor interesse por notícias na grande maioria dos países. Em alguns países, como Argentina, Brasil, Espanha e Reino Unido, essas quedas vêm ocorrendo há algum tempo, enquanto nos Estados Unidos observamos um padrão ligeiramente diferente. O interesse permaneceu alto durante os anos de Trump, mas parece ter diminuído significativamente desde que Joe Biden se tornou presidente. Hoje, menos da metade da amostra (47%) diz estar muito ou extremamente interessada em notícias em comparação com 67% em 2015.

No que concerne à desinformação, o relatório de 2022 aponta uma interseção entre os medos da desinformação digital e o uso generalizado das mídias sociais. Em todos os mercados, pouco mais da metade (54%) diz se preocupar em identificar a diferença entre o que é real e falso na internet quando se trata de notícias, mas as pessoas que dizem usar principalmente as mídias sociais como fonte de notícias estão mais preocupadas ( 61%) do que as pessoas que não as usam (48%). Além disso, as regiões com os mais altos níveis de preocupação – África e América Latina – correspondem de perto com altos níveis de uso de notícias de mídia social. 

Para ler o relatório na íntegra acesse: https://reutersinstitute.politics.ox.ac.uk/digital-news-report/2022

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