Como pessoas que não confiam em notícias navegam pelas informações nas plataformas digitais?

Artigo de Ana Regina Rêgo.

Também disponível em Portal Acesse Piauí e Jornal O Dia.

Os pesquisadores da Universidade de Oxford e do Instituto Reuters, Amy Ross Arguedas, Sumitra Badrinathan, Camila Mont’Alverne, Benjamin Toff, Richard Fletcher e Ramus Kleis Nielsen, divulgaram recentemente os resultados de uma investigação científica qualitativa realizada em quatro países, a saber: Brasil, Índia, Reino Unido e Estados Unidos, cujo objetivo foi  ouvir pessoas que não acreditam no meios jornalísticos e no jornalismo em geral e cuja dieta de mídia é pautada em canais e perfis de redes sociais e grupos de aplicativos como WhatsApp e Telegram.

O interesse dos pesquisadores foi coletar informações sobre como essas pessoas interpretam e atribuem sentido às notícias que encontram ao navegar pelas redes sociais digitais, aplicativos de mensagens e mecanismos de busca. A amostra analítica qualitativa envolveu 100 pessoas nos países já mencionados, através de entrevistas realizadas entre dezembro de 2021 e janeiro de 2022. 

A pesquisa realizada por meio de videoconferência, teve como foco indivíduos que utilizam com frequências a plataforma de rede social, Facebook, a plataforma cujo carro chefe visível é o mecanismo de busca, o Google e um aplicativo de mensagens, o WhatsApp. A escolha das plataformas foi guiada pelo resultado do Digital News Report de 2021 também realizado pelo Instituto Reuters e Universidade de Oxford que constatou que no Brasil, o Facebook foi utilizado por 72% dos entrevistados para o Digital News Report do ano passado e que destes, 47% o utilizaram especificamente para notícias, enquanto na Índia 66% usavam o Facebook, sendo que 43% para se informar, 65% no Reino Unido, onde 23% procuravam também por notícias  e 58% nos EUA , onde 28% usavam o Facebook para se informar. De acordo com os pesquisadores o  “WhatsApp é  predominante no Brasil e na Índia. O aplicativo de mensagens é utilizado por 80% da população em cada um dos dois países (43% no Brasil e 53% na Índia usam-no especificamente para notícias). Enquanto isso, 47% das pessoas que estão no Brasil, 59% na Índia, 24% no Reino Unido e 36% nos EUA usam “ferramentas de busca” para especificamente consumir notícias, o que, na prática, frequentemente significa o Google”.

Como dito acima, a pesquisa procurou trabalhar com pessoas que não acreditam no jornalismo e nas fontes de notícias tradicionais, com um histórico de pouco consumo de notícias e de falta de interesse pelo universo da política. Durante a pesquisa com esses grupos focais, foi pedido aos indivíduos que descrevessem e respondessem sobre o que estavam vendo em suas telas enquanto estivessem navegando pela plataformas digitais, ao mesmo tempo em que falavam com a equipe de investigadores.

Os resultados principais dão conta de que quando os participantes encontravam notícias nas plataformas digitais e procuravam avaliar a credibilidade das informações, simplesmente se utilizavam de algumas pistas sobre a informação para fazer julgamentos rápidos e raramente entravam nas fontes originais das notícias, cujos links estavam disponíveis nos posts  noticiosos a que tinham acesso.

No Relatório, os pesquisadores apontam que  “os atalhos mentais que as pessoas mencionaram, envolviam (1) ideias pré-existentes que tinham sobre notícias em geral ou tipos de notícias específicas (de onde vinham as informações), mas também vários outros fatores: (2) indicações sociais de familiares e amigos (que compartilharam ou interagiram com as notícias), (3) o tom e a redação das manchetes (se era ou não percebida como clickbait), (4) o uso de elementos visuais (que, muitas vezes, eles viam como evidência importante para o que poderiam ou não confiar), e (5) a presença de publicidade (se a informação parecia ou não ser patrocinada). Outras (6) indicações específicas da plataforma também desempenharam um papel na formação de julgamentos sobre o que poderiam confiar. Elas envolveram decisões de design em torno de como a informação aparece nas plataformas (por exemplo, quais rótulos aparecem e/ou para o que é dado mais destaque).

Em suma, as conclusões da pesquisa qualitativa indicam que as audiências que não confiam em notícias, também não as consumem e raramente encontram notícias em suas redes sociais. Poucos viram notícias enquanto estavam realizando a pesquisa e quando localizavam alguma, eram, em geral, leves e focadas em entretenimento e celebridades, já temas políticos e sociais, não apareciam em suas telas.

Para os pesquisadores “Como poucos tendiam a clicar nos links que viam, muitos faziam julgamentos rápidos, instantâneos, sobre a credibilidade das informações que eram relatadas. A maioria se concentrava nas informações mínimas transmitidas através das próprias plataformas, em manchetes ou elementos visuais, ou recaía no que já conhecia da reputação das marcas. Em muitos casos, essa reputação poderia ser bastante limitada e frequentemente negativa”.

A pesquisa aponta que a atenção dos usuários entrevistados era focada em indicações distintas em cada plataforma analisada. Tanto no Facebook como no WhatsApp a atenção voltou-se mais para a força da indicação social, ou seja, focada em quem estava compartilhando tais informações, conferindo credibilidade ao agente compartilhador. No Facebook o engajamento em torno de uma informação também contou como fator de consumo e aceitação da informação como credível. Já no Google, “a ordem de classificação dos resultados da busca foi especialmente destacada. Mas em todas as três plataformas, muitos tiveram dificuldades para identificar de onde vinha a informação”.

Sobre a ação das plataformas em torno da hierarquia das informações em termos de visibilidade e circulação, a maioria não sabia como se portar, tendo em vista não possuir conhecimento sobre o tema. Muitos manifestaram preocupação com a desinformação, entrando em acordo com os resultados do Digital News Report de 2021, já mencionado e que concluiu por exemplo, que ano passado, 82% dos brasileiros estavam preocupados com a desinformação. Também expressaram preocupação com agendas comerciais invasivas e com a  invasão de privacidade, embora confiem nas plataformas, como espaço de verificação de informações e hierarquização de notícias.O relatório da Pesquisa aqui trabalhada pode ser acessado no link: https://reutersinstitute.politics.ox.ac.uk/our-research

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